Curtas do Festival CineFantasy

Especial: Curtas do Festival CineFantasy

Entre os dias 06 e 20 de setembro, aconteceu a 10ª edição do CineFantasy – Festival Internacional de Cinema Fantástico. Exibindo longas e curtas-metragens de fantasia, o evento exibiu 140 filmes ao todo, contando com películas nacionais e internacionais. As categorias mesclavam temas, tipos de produção e localizações, sendo elas: Amador, Animação, Brasil fantástico, Espanha fantástica, Estudante, Fantasia, Fantasteen, Fantástica diversidade, FANLATAM, Ficção científica, Horror, Mulheres Fantásticas e Pequenos Fantásticos. 

A partir das obras assistidas no CineFantasy, o Coisa de Cinéfilo traz agora um especial com os principais curtas que acompanhamos durante os 14 dias de festival.

Sempre Quando Chove (2020, SP)

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Aqui a metáfora sobre os sentimentos, ações e sensações humanas são postas através das cores. A iluminação e as tonalidades múltiplas que surgem na tela revelam as emoções do protagonista que vai, junto com o espectador, descobrindo como funciona um objeto, aparentemente simples, mas que contém uma espécie de poder nele. Este é uma camisa, que o jovem compra pela internet em uma promoção e que muda de coloração o tempo inteiro. Há no filme um balanço equilibrado da progressão e da jornada deste rapaz, pois cada passo de sua rotina é transformado, a partir desta aquisição, até que ele não tem mais para onde ir e tudo vira desgaste.

No entanto, apesar de uma premissa criativa e de ter uma personagem principal carismática, a produção peca por subestimar o espectador e tentar reforçar os signos que foram criados e expostos na projeção. Parece haver um receio do roteiro e da direção em investir e se jogar neste universo do fantástico. Nota: 3 estrelas

Uma Mulher Feliz (2018, Espanha)

Logo nos primeiros minutos de projeção, o espectador já sente o que o filme deseja passar. Com uma narração que contradiz as imagens que estão sendo mostradas, há um clima de ironia revelada. Juntamente com isso, o público vai descobrindo as negações da protagonista, que se anula de maneira tão forte que começa a desaparecer, se tornando quase invisível. Nesta metáfora um tanto literal, o maior ganho são as tiradas nonsense, principalmente nas sequências que mostram o cotidiano sofrido da personagem, preenchido de descaso e imagens fortes, como em um jantar que Ana corta a sua mão, mas ela não sente a dor e continua sangrando na frente da família, que apenas a observa, sem fazer nada.

Neste quesito de transmitir as sensações de Ana, a direção de arte é o elemento que mais contribui para contar a sua história e emoções. Há um cuidado com os detalhes, seja no início da exibição, na casa de Ana e tudo que está nela ou, depois, no hospital, este ambiente um tanto frio, que vai ganhando personalidade enquanto Ana se recupera. Talvez, o que incomode no curta seja a ingenuidade extrema, que surge na reviravolta, na qual o marido e os filhos começam a desvanecer, quando ela finalmente descobre o que ama, deixando tudo muito literal. Ou seja a própria tentativa de ser sutil, mas com um peso na mão quando Ana se recupera e seu corpo volta a ganhar forma. Nota: 2,5 estrelas

Lili (2020, Holanda)

Simples, direto e intenso. Estes três adjetivos cabem como uma luva quando o assunto é o filme Lili. Com a câmera parada e o quadro centralizado na protagonista que dá o título ao curta, o público é apresentando a uma atriz em uma audição. O fundo é preto e ela está vestida de branco em uma cadeira. Em off, escuta-se a voz do aparente diretor, que dá comandos para a intérprete. Progressivamente, a tensão entre os dois vai crescendo e o espaço fechado lembra uma clausura, onde, talvez, não houvesse escapatória. O cineasta passa a fazer pedidos constrangedores, como solicitar que Lili abra mais o botão de sua camisa e que se insinue para tela, de forma provocativa.

Quando as vozes dos dois e os olhares de Lili já alcançaram toda a suspensão possível, a diretora e roteirista Yfke Van Berckelaer (All the single ladies) ultrapassa a expectativa de que o ápice da angústia foi alcançado e põe a figura masculina para se aproximar fisicamente da protagonista. O plano mostra apenas as suas mãos em Lili, a dupla repete o diálogo que já vem sendo dito algumas vezes. A maneira como o plot twist se instala é, de fato, uma surpresa e amplia o horizonte do que a obra quer contar. Aqui, a metáfora funciona e o seu desfecho é o arremate final de uma narrativa bem construída em tão poucos minutos. Nota: 4 estrelas.

Terroir (2020, Estados Unidos)

Quase com em um videoclipe, as imagens vão sendo evocadas juntamente com uma música que ecoa na tela. A base do filme é a dinâmica entre uma mãe e uma filha e os desgastes constantes que este de tipo de relação pode trazer. As tensões entre as duas são intensas e profundas. No entanto, há um forte clima de pretensão na obra que atrapalha a criação de uma progressão. Antes mesmo da instalação das situações e do estabelecimento de empatia com as personagens e o que está aparecendo durante a projeção, o tom já está um tanto acima.

Não conseguindo sustentar as próprias ações que procura propor, o ritmo se perde e o equilíbrio se esvai. Além disso, a vontade de instalar uma atmosfera parece um pouco desesperada e o curta acaba indo para o literal da pior maneira possível, como em uma briga entre elas que acontece no banheiro. Os corpos das atrizes não estão orgânicos, o que artificializa a construção da cena. No geral, a vontade de imprimir elementos plásticos no ecrã funciona, mas é apenas algo que chama apenas atenção por alguns minutos. Depois, não há uma boa maneira de lidar com aquilo que quer provocar. Nota: 2 estrelas

Pílulas Pretas (2019, Estados Unidos)

É preciso respirar fundo para falar sobre Pílulas Pretas. É bem verdade que o filme tenta criar toda uma metáfora para tratar sobre a questão dos corpos de pessoas transgênero e procura, até o seu desfecho, realizar isto da melhor maneira possível. Infelizmente, a obra peca do início ao fim em todos os seus elementos. O roteiro é expositivo, a direção de atores parece inexistente, os objetos da direção de arte são artificiais, despertam o espectador para a realidade, não estabelecendo o pacto com a plateia, existente na ficção. Não tem como comprar este tecno-futuro desesperado, no qual nem a figura  “misteriosa” que está no vídeo sabe o que ela é de fato. Nota: 0,5 estrelas.

Cinzas (2020, Argentina)

Há um certo equilíbrio em Cinzas. Com um início um tanto bobo, ele pode afastar o público inicialmente. Em seguida, ele consegue estabelecer um clima de terror, trazendo de volta a atenção. A ingenuidade do começo do enredo está na entrada da protagonista na floresta. Ainda que se entenda que ela está hipnotizada, a maneira como a personagem se movimenta e caminha em direção de um edifício abandonado é um tanto artificial, principalmente pelo diálogo entre ela e a outra garota que está ao seu lado. Contudo, quando a menina chega até o local inóspito e passa a investigar aquele espaço, a obra ganha outro tom.

A câmera está o tempo inteiro a serviço desta relação, entre o que ela observa em contraponto com o fato de estar sendo vista por alguma coisa que ainda não se sabe o que é. Lentamente, as peças são montadas e a construção da atmosfera de medo faz com que a chegada da figura sobrenatural ganhe mais impacto. As tonalidades imprimem uma dupla sensação, que fica entre o nostálgico e o assombrado. Ainda que consiga chegar até seu clímax com uma boa construção, o desenlace chega frouxo, pois a narrativa parece se perder após a conclusão do arco da personagem principal. Nota: 3,5 estrelas.

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