Licorice Pizza

Crítica: Licorice Pizza

Por onde começar quando se deve tratar sobre um filme vindo de um cineasta com uma obra constantemente cultuada e que trouxe tanto para o cinema mundial? Boogie Nights (1997), Magnólia (1999), Sangue Negro (2007) etc, Paul Thomas Anderson é conhecido por sua qualidade ao criar imagem e texto, entregando produções inventivas em termos de roteiro e direção. No entanto, seus dois últimos títulos são materiais que incomodam esta que vos escreve, por motivos bastante específicos.

Um deles é Trama Fantasma, admirado longa-metragem de Paul, indicado a 6 Oscar, e vencedor do prêmio na categoria de Melhor Direção de Arte, para Mark Bridges. Bem escrito e realizado, a questão que arruinava qualquer chance deste material ser bem visto por esta crítica aqui é o seu teor de misoginia injustificável. Esta é uma questão extremamente complexa e que merece um texto por si só. Todavia, o foco neste momento é outro, é justamente o novo longa do Paul: Licorice Pizza.

Aqui, uma repetição qualitativa. Na escrita, Thomas Anderson não subestima o espectador e entrega um desenvolvimento narrativo corajoso, com timing cômico preciso e que deixa que o público vá completando os rumos da trama em sua mente. Os cortes descontínuos são favoráveis para que se olhe para o ponto central da narrativa: a relação de Gary (Cooper Hoffman) e Alana (Alana Haim).

Para fortalecer essa conexão da dupla, Anderson aposta em sequências nas quais a energia e mentalidade de uma juventude transbordam da tela. Gary e Alana passam inúmeros momentos correndo, seja um para o outro, para chegar em lugares, porque eles querem simplesmente correr. Isto pode parecer um detalhe, mas a vibração juvenil, este corre corre inteiro, essa pressa de viver, dita bastante o tom do longa.

Esta estratégia também está na direção de arte e figurino, que são efetivas em impor uma atmosfera juvenil e ao marcar quem são os adultos, através da seleção de usar menos quantidade de cor neles, em suas casas e cenários. Por outro lado, as crianças e adolescentes trajam vestes e estão inseridos em ambientes coloridos. Já Alana flerta com os dois mundos e, mesmo sendo uma mulher, está constantemente posta como infantil e pertencente ao Universo teen. É nesta lógica que habita o desconforto com Licorice Pizza.

Licorice Pizza

Todos estes aspectos formais positivos são feitos para contar que tipo de história? Todo este esmero para acompanhar o quê senão uma romantização de um relacionamento amoroso de uma mulher de 25 anos com um garoto de 15. Ainda que haja um teor de inspiração em fatos reais de pessoas próximas a Anderson e que dentro da história exista o questionamento sobre a diferença de idade, os encaminhamentos do enredo e seu desfecho acabam por compactuar com o estabelecimento deste namoro.

O cerne da questão não é que ela é dez anos mais velha que ele e sim que Gary é menor de idade e está no ensino médio. Talvez, os leitores pensem que seja absurdo tentar argumentar sobre esta temática, já que o casal é apresentado no filme de forma tão jovial, romântica e ingênua. Contudo, o problema é justamente este. Há uma espécie de pensamento generalizado na sociedade de que meninos estão se beneficiando ao se relacionarem com adultas.

Desta maneira, a sessão, ainda que floreada por toda a qualidade técnica proporcionada pela equipe, pode ser um desafio para algumas pessoas. Apesar de todo o talento de Paul Thomas Anderson, os seus últimos longas confirmam que a habilidade de realização não apaga o fato de que é preciso se olhar para o que está sendo contado, além de analisar o como está sendo contado.

De todo modo, falar sobre uma produção como essa é sempre um grande desafio. Escolher sob que ótica vai se abordar um conteúdo artístico é uma escolha e é preciso ser justo ao se avaliar qualquer obra. Desta maneira, Licorice Pizza possui os seus méritos individuais, seja em termos de trabalho do elenco ou do restante da equipe. Contudo, é impossível escapar do fato de que é uma sessão que pode gerar desconforto por ter uma argumentação de mais de 2 horas de duração sobre um tipo de casal injustificável. Não tem como achar graça ou celebrar o fato de que uma mulher decidiu ficar com um garoto menor de idade.

Direção: Paul Thomas Anderson

Elenco: Cooper Hoffman , Alana Haim, James Kelley, Bradley Cooper, Sean Penn, John C. Reilly, Maya Rudolph, Tom Waits

Assista ao trailer!