Confinamento

Crítica: Confinamento (HBO Max)

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Partindo da identificação do espectador com a vivência das personagens durante o isolamento social, causado pela necessidade de se proteger do Coronavírus, Confinamento é mais do que um filme sobre pandemia. Com uma mescla de subgêneros, a produção conduz o espectador sabiamente por um caminho, inicialmente, esperado até a sua surpreendente reviravolta, mas sem perder a base de sua narrativa. Neste jogo entre explorar a relação do casal principal, Linda (Anne Hathaway, Convenção das Bruxas) e Paxton (Chiwetel Ejiofor, The Old Guard), as angústias em relação ao vírus e os conflitos de um casamento finalizado, são construídas camadas mais profundas, a partir de cada uma dessas premissas.

Entre os embates de Linda e Paxton é possível conhecer mais sobre eles. Através de seus desabafos, em diálogos, majoritariamente, sucintos, quem assiste consegue mergulhar e compreender as aflições, necessidades e razões das personagens. A direção de arte, o figurino e a mise-en-scène fomentam esta perspectiva sobre a dupla. Alguns exemplos ilustram esta sensação que a obra passa: a decoração da casa, seja no quarto e no escritório de Linda que possuem cores mais neutras e suaves, enquanto no de Paxton os tons são mais fechados ou nas vestes e penteados de Linda que vão, lentamente, ficando mais despojados, revelando uma certa transformação dela. Ao mesmo tempo, Paxton vai ganhando confiança e restabelecendo a sua personalidade e detalhes aparecem em suas roupas também, como sua jaqueta de motoqueiro.

Confinamento

Nestas mudanças, provocadas pelas reflexões vindas da obrigatoriedade de ficar na residência, os dois parecem se reencontrar, tanto como indivíduos quanto como casal. A partir desta jornada progressiva, na qual se vê nitidamente os processos de questionamentos e modificações de perspectivas de Linda e Paxton, a produção é corajosa ao inserir dinâmicas de múltiplos gêneros dentro do enredo. Há um peso da jornada das personagens, mas, mesclado a isso, existe um humor ácido que preenche a trama. Punchlines e a seleção das músicas incidentais transmitem também as oscilações de humor de Linda e Paxton, seus distanciamentos e aproximações. Além disso, em um plot twist, é instalada uma atmosfera de longa-metragem de crime.

Quando surge a oportunidade de realizar um roubo, a dinâmica da velocidade das ações é modificada. A montagem oferece mais cortes e a direção traz mais movimentações de câmera. Assim, a inércia e as problemáticas internas que ocorrem dentro de casa, em um confinamento, são substituídas por sequências com uma adrenalina, que é instaurada repentinamente, porém que funciona, pois a quebra da lógica moral vai sendo derrubada no próprios embates entre Linda e Paxton. É a partir daí que eles parecem a encontrar um objetivo em comum e afinar os próprios sentimentos desorganizados internamente. Quando o par passa a expor a ultrapassagem dos supostos limites éticos impostos pela sociedade é que eles conseguem recordar quem são e o amor que têm um pelo o outro.

Desta maneira, Confinamento apresenta um resultado equilibrado e ousado, por saber convocar os momentos internos e íntimos, mas jogar também com o cômico e o absurdo. No contexto atual em que o mundo vive, cheio de conflitos políticos e uma crise sanitária grave, a extrapolação da realidade, através de um cenário, aparentemente, tão comum e relacionável, faz com que a projeção valha cada minuto.

Direção: Doug Liman

Elenco: Chiwetel Ejiofor, Anne Hathaway, Bem Kingsley, Ben Stiller, Jazmyn Simon, Dule Hill, Mark Gatiss, Lucy Boynton

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