Poderia Me Perdoar?

Crítica: Poderia Me Perdoar?

2018 foi o ano das cinebiografias. Ao longo dos maiores festivais de cinema e das cerimônias de premiação, os filmes biográficos dominaram as atenções da crítica e público. Astros do rock, escritoras célebres, políticos, comediantes, pintores, astronautas, policiais, criminosos etc. A diversidade de representações tomou conta do gênero nesse último ano. Nos circuitos de premiações, 8 títulos foram mencionados na maioria das listas de indicados. Dentre essas produções está a interessante história de contravenções da escritora Lee Israel.

Poderia Me Perdoar? é o novo longa-metragem da Fox Searchlight Pictures que se baseia num livro de mesmo nome escrito pela própria Lee Israel. Depois de ser descoberta e julgada, Lee escreveu uma autobiografia confessional, declarando não só o acontecido como a mudança que isso fez em sua vida. Dez anos após o lançamento da obra literária, a Fox lança sua adaptação para o cinema e emplaca como um produto de qualidade.

O filme é um relato dos dias de falsificadora da renomada autora de biografias. O longa, com toda a sua simplicidade, se atenta aos detalhes mais íntimos da personagem principal e constrói uma narrativa na qual o público se vê ao lado da contravenção. Israel passa a ser uma espécie de anti-heroína da história que conquista o coração e a atenção do espectador desde os primeiros minutos.

Após fazer sucesso durante décadas com suas biografias, a jornalista e escritora Lee Israel caiu no esquecimento. Tentando lidar com a falta de espaço no mercado, contas atrasadas e a sua dificuldade de se relacionar com outras pessoas, Israel se vê completamente desacreditada de seu trabalho. Para arranjar dinheiro, a escritora vende uma das cartas antigas de Fanny Brice – comediante na qual Lee pretendia fazer uma biografia. Nesse momento, ela tem uma ideia para se salvar: Lee passaria a forjar cartas de personalidades já falecidas para vendê-las. Assim, a jornalista começou um lucrativo negócio criminoso. Tudo ia bem com as vendas e as falsificações até que suspeitas começaram a ser levantadas e o FBI resolveu ir atrás da escritora.

A partir dessa narrativa de confissão, a diretora Marielle Heller (O Diário de uma Adolescente, de 2015) criou uma história sensível e real. A direção dela é muito precisa e sem firulas, o que tornam as cenas simples. Ou seja, o trabalho de Heller nessa produção é a composição do ambiente e das imagens, para que as atuações e o roteiro ganhem profundidade pelos seus próprios meios. E tudo isso se amplifica por não existir nenhuma barreira da direção que tire a atenção do foco principal do acontecimento. Heller coordena essa biografia com um olhar verdadeiro e inteligente.

O roteiro é admirável. Uma adaptação que soube escolher e desenhar muito bem os momentos característicos da vida de Israel. Os roteiristas Nicole Holofcener e Jeffrey Daniel Whitty criaram uma narrativa que prende a atenção do espectador de imediato. A figura da jornalista já fala por si só, mas as escolhas de Holofcener e Whitty deram ainda mais espaço para a atriz principal e sua personagem brilharem. Dessa forma, o filme é extremamente verossímil e delicado. Uma cinebiografia que soube usar os relatos da personagem-título.

A força de Can You Ever Forgive Me? (título original) está no elenco. A história tem as suas personagens secundárias que colaboram positivamente para a composição da emoção e dos nuances da narrativa, mas quem encorpa as cenas é a dupla Melissa McCarthy e Richard E. Grant. A performance de McCarthy é poderosa. Lee Israel foi o papel perfeito para Melissa. A atriz pôde mostrar as suas múltiplas facetas como a figura da escritora com momentos fortes e divertidos. Já o seu parceiro de cena está ali para desenvolver ainda mais a dose de humor ácido do longa. A personagem de Grant completa a diversidade de sentimentos de Israel com as sua lábia e vivências. Quando ambos estão em cena, o público se deleita com uma cumplicidade e qualidade artística impressionante.

Como o ponto alto da película são Melissa e Richard, a maior parte das nomeações está veiculada a suas interpretações. Devido a isso, ambos foram indicados, respectivamente, nas categorias “Melhor Atriz” e “Melhor Ator Coadjuvante” dos principais prêmios do cinema (Globo de Ouro, Critics’ Choice Awards, SAG Awards, BAFTA Awards e Oscar). Independentemente dos resultados, é inegável a qualidade das performances de Melissa e Richard, as quais fizeram da cinebiografia de Lee Israel um filme marcante.

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