Crítica: Ma

Quando nos acostumamos a ver um artista em determinado tipo de papel, é animador descobrir que ele está em um projeto completamente diferente do seu padrão. É o caso de Octavia Spencer (A Forma da Água) em Ma. Sempre fazendo papéis carinhosos e acolhedores, o típico perfil da boazinha em cena, Spencer lida agora com esse projeto de suspense que a faz sair da zona de conforto e mostrar todo seu potencial.

Calma e solitária, um dia Sue Ann conhece um grupo de adolescentes que pede sua ajuda para comprar bebida e, de repente, ela vê a chance de fazer novos amigos. Conforme se aproxima dos jovens, Sue oferece à eles uma oportunidade irrecusável: fazer festas e curtir com os amigos na casa dela, um lugar seguro onde nada os impediria de fazerem o que eles quisessem, contanto que seguissem algumas regras. As coisas vão ficando tensas quando Ma (seu apelido agora) começa a ter uns comportamentos estranhos.

A premissa mais animadora do longa é o fato de ele se vender como uma tensão psicológica, que vai explorar as nuances da possível loucura da personagem principal. No entanto, o que vemos é um roteiro que se revela rápido demais, por ser tão óbvio. Não é preciso ser tão atento para sacar o destino da trama, com menos de 30 minutos de exibição.

Ainda assim, esperamos por uma reviravolta no roteiro que efetivamente não acontece. Sucessões de decisões esperadas vão acontecendo para criar tensão no espectador. E sim, verdade, essa tensão acontece de uma maneira muito correta. Assistimos ao desdobrar dos personagens, especialmente a personagem Ma, que vai mostrando nuances de sua personalidade e eventos que a levaram a ser desta forma.

No entanto, os eventos acabam se tornando pequenos para a dimensão das crueldades que a mulher está disposta a fazer. Compilado a isso, temos elementos soltos e mal trabalhados, como a filha doente e a chefe abusiva. A chefe, interpretada por Alisson Janney (Eu, Tonya) – que, coitada, não tem nem dois minutos de cena – poderia funcionar como um gatilho para os traumas da protagonista, justificando a sua súbita necessidade de vingança. Mas acaba sendo ignorada e tornando-se uma morte fácil e sem propósito.

Outros elementos da trama – que não irei expor por conta de spoiler – levam o mesmo destino. O diretor Tate Taylor (Histórias Cruzadas) se mostra com pouca irreverência ao tratar de uma temática pesada como traumas por conta de bullying. Ao invés de ir afundo no projeto e esmiuçar toda a trama psicológica que o roteiro oferece, ele escolhe ficar na superficialidade de um novelão. Temos cenas caricatas demais para o que o longa se propõe.

O grande suspiro de prazer em Ma é a atriz Octavia Spencer, que finalmente teve a sua chance de participar de um projeto diferente. A sua figura maternal, cuidadosa e amorosa dá o tom na protagonista, que consegue envolver todos com seus abraços gostosos. É bom ver essa dualidade na trama, do mal travestido de bem. É, definitivamente, o grande destaque da produção.

Ma não é um filme ruim, mas é um grande potencial perdido que fica na primeira camada e é tão óbvio quantos qualquer roteiro comum. Fico imaginando um projeto desses na mão do diretor Jordan Peele (Corra!) que certamente iria nos presentear com um verdadeiro thriller intenso e psicológico. Ficaremos só na vontade mesmo.

Direção: Tate Taylor
Elenco: Octavia Spencer, Juliette Lewis, McKaley Miller, Luke Evans, Corey Fogelmanis, Dominic Burgess, Tate Taylor, Missi Pyle, Allison Janney

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