Crítica: Amor e Amizade

Baseado em um dos trabalhos menos conhecidos da escritora inglesa Jane Austen (também foi o que mais enfrentou dificuldades para a sua publicação), Amor e Amizade é uma adaptação de Lady Susan e conta a história de uma viúva (Kate Beckinsale) criando estratagemas para manipular sua família e um amante casado enquanto encontra um novo pretendente para si e para a sua filha. O longa é dirigido e roteirizado por Whit Stillman, de Descobrindo o Amor e Os últimos embalos da Disco, que, por sinal, trazia as mesmas Beckinsale e Chloë Sevigny como protagonistas, sendo que aqui a importância da primeira é bem maior (Sevigny vive a melhor amiga de Lady Susan). O saldo é um longa delicioso, que consegue se apropriar muito bem da ironia e da crítica social conduzida de maneira particular por esta história de Austen, e ainda é palco para um interessante desempenho de Kate Beckinsale, que sempre apresentou uma carreira marcada por muitas interpretações de êxito questionável.

Em Amor e Amizade, Stillman consegue dosar direção e roteiro com decisões inteligentes que não se sobrepõem a sua própria história e personagens, ponto alto e enfoque do filme. O realizador encontra soluções interessantes em aspectos como a apresentação dos seus personagens e uma seleção certeira da sua trilha sonora, elementos que conferem uma jovialidade insuspeita a adaptação, mas, ao mesmo tempo, não a deixam afetada ao ponto de torna-la um apelo desesperado para as novas gerações. Stillman foi certeiro ao entender que para fazer de Amor e Amizade uma história acessível ao público de hoje, bastava confiar no caráter atemporal do próprio trabalho de Austen e, seguindo a tradição das suas melhores adaptações, entrega-se por completo ao espírito do material de origem do seu filme.

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O centro das atenções no longa de Stillman é mesmo Kate Beckinsale que, ao menos aqui, passa uma borracha na sua relativamente injusta fama de atriz canastrona e torna sua Lady Susan uma personagem manipuladora, inteligente e irônica, mas tudo por “debaixo dos panos”. Beckinsale faz isso sem cair no equívoco de transformá-la em uma vilã cartunesca, ou melhor, evitando fazer de Lady Susan uma vilã, o que poderia ser trágico para os anseios do próprio filme. No final das contas, é esse olhar para a sua protagonista e suas ações que Stillman e seu filme reivindicam o tempo todo do espectador. Amor e Amizade acaba sendo um estudo interessante desta personagem, mas também do contexto social no qual ela está inserida e que acaba moldando suas ações e personalidade. Não deixa de ter o seu desfecho romântico, mas como tudo o que Austen fez, guarda em suas sutis sugestões uma crítica afiada aos preconceitos cultivados pelo coletivo que podem levar à distorção moral de pessoas como Lady Susan que, por sua vez, usam isso como um artifício de sobrevivência social.

Assista ao trailer do filme:

Créditos: Quadro por Quadro

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