O Problema de Nascer

Mostra de São Paulo: O Problema de Nascer

0.5

O Problema de Nascer traz um mundo no qual robôs performam comportamentos humanos, a partir de uma programação que os fazem agir da maneira como os donos desejam. Além disto, eles possuem a aparência também previamente selecionada e que também pode ser modificada. Aqui, há uma construção de roteiro, de Sandra Wollner (Viktor) e Roderick Warich (2557), com progressão, onde o espectador é lentamente introduzido a este universo um tanto complexo e cheio de camadas, onde as necessidades mais sombrias das pessoas podem ser atendidas por este android multifacetado e de sistema rebuscado.

Este é o ponto chave desta produção. Existe nela um acesso a um tema extremamente delicado e recursos formais sofisticados para abordá-lo. Talvez, os aspectos técnicos como direção, fotografia e montagem saltem aos olhos do espectador e a fruição da obra seja um tanto menos sofrível. No entanto, há a possibilidade do conteúdo causar um incômodo tão intenso, que seja difícil terminar a projeção sem um sentimento de revolta e/ou assombro. Mas, começando pelos elementos de linguagem fílmica em si, é possível dizer que o longa tem um olhar cuidadoso para sua decupagem.

Os enquadramentos trabalham a favor da história que está sendo contada, principalmente na utilização de planos detalhes que revelam sentimentos internos das personagens e pequenas ações que contribuem para as viradas da narrativa. A fotografia também evoca sensações plurais dentro daquela realidade. A mistura de temperaturas na direção de arte e no figurino, juntamente com os tons mais escuros, contam muito sobre os segredos bizarros e os passados e presentes cobertos de erros.

O Problema de Nascer

A criação deste ambiente de tensão em O Problema de Nascer, onde ruídos e silêncios se unem, aparentemente, para causar um clima de suspensão, não se sustentam durante toda projeção. Após a fuga de Elli (Lena Watson), a trama se perde um pouco e procura se encontrar através de traços deixados na configuração de Elli e como isso afeta seu contato com a nova dona. Apesar desta busca, o que acontece nesta escolha é uma repetição de informações que o público já havia entendido, deixando uma sensação de tempo dilatado, sem que alguma quebra ou velocidade sejam postas para equilibrar este ritmo.

Ainda pode-se dizer neste texto como todo o apuro estético e o desejo de Wollner de discutir uma temática tão complexa como a pedofilia acaba se encaminhando por um caminho que  soa um tanto antiético. Elli é um robô comprado para fingir ser uma verdadeira garota que desapareceu faz algum tempo. Quem adquire o item é o pai da menina, um homem que abusava de sua filha. A questão mais perturbadora é ver Watson imprimir comportamentos adultos, emitir gemidos como se estivesse no ato sexual, criar contato físico com um homem adulto. Uma intérprete criança exposta na tela sempre seminua, com expressões faciais que tentam emular a de mulheres e em sequências não apropriadas para a sua aparente faixa etária.

Para finalizar, esta suposta problematização de Wollner não chega em algum lugar palpável, deixando apenas o abuso como um “ponto de partida”. Não há uma reação de Ellie ou de alguma outra personagem na tela que não seja o pai. É importante ressaltar que O Problema de Nascer vem sendo discutido pela crítica internacional, dividindo opiniões. A maior gravidade para alguns seria o fato deste ser um material rico para pedófilos fantasiarem com esta criança posta por Wollner. Com uma ampla opção no catálogo da Mostra de São Paulo, pular esta exibição pode ser uma melhor opção!

Direção: Sandra Wollner

Elenco: Lena Watson, Dominik Warta, Ingrid Burkhard

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