Fratura

Crítica: Fratura

Queira ou não, a burocracia faz parte do mundo e está com suas raízes fincadas em todas as relações sociais institucionais. Filas, espera, formulários, trocas de atendente durante a chamada telefônica, mais espera. Se, por um lado, ela impede a anarquia e mantêm as coisas funcionando, por outro, sua ineficiência e lentidão são capazes de despertar o pior de dentro em cada cidadão. De certa forma, Fratura é um grande pesadelo burocrático. 

Bem, é claro que o novo filme de Brad Anderson (O Operário, Beirute) não é apenas sobre isso. Na narrativa de thriller psicológico, Ray (Sam Worthington, A Cabana) cruza a estrada com a esposa, Joanne (Lily Rabe, American Horror Story), e filha pequena, Peri (Lucy Capri). Após uma parada para abastecer, um cão vira-lata assusta a menina, que está na beira de um precipício, fazendo com que ela e pai (que pula para tentar salvá-la) caiam de uma considerável altura dentro da obra. Com diversas lesões, a família dirige urgentemente para o hospital mais próximo.

Certamente, por conta do seu traumatismo, Ray não é um narrador 100% confiável. Mas, assim que adentra no hospital, sua ambientação sufocante e claustrofóbica, juntamente com um comportamento suspeito dos funcionários, causa um enorme desconforto. Após esperar esposa e filha realizarem um exame, o protagonista cai no sono e, para sua surpresa, ao acordar, não há registro das duas naquele local. A partir daí, a paranoia conduz o fio narrativo, enquanto Ray esclarecer o que realmente aconteceu com sua família.

A constante tensão de Fratura é um fruto de toda a ambientação construída por Anderson. Assim como em O Operário, o diretor adota uma paleta fria que traz um clima pesado ao ambiente, indo desde o céu nublado na estrada até todos os elementos cénicos do hospital. Já a trilha sonora de Anton Sanko (Filadélfia) aumenta a tensão através de um clássico som de piano nos momentos de maior suspeição. Além disso, constantes close-ups nos rosto do protagonista realçam sua alienação e loucura.

Fratura

Nesse sentido, Sam Worthington executa perfeitamente seu papel. O ator de Avatar consegue fazer com que o público acredite, assim como ele, que está acontecendo uma grande conspiração no hospital. Sua forte atuação é marcada por uma fala agitada, micro explosões de temperamento, um olhar fixo para o além. De resto, todos os outros personagens alternam entre momentos de sobriedade com falas e olhares extremamente cínicas e dúbias, contribuindo para um mal-estar geral.    

No entanto, atuações e a magnética mise-en-scène de Brad Anderson apenas ajudam a mascarar o fraco roteiro de Fratura. Escrito por Alan McElroy (Tekken), o terceiro ato é marcado por um didatismo, através de flashbacks, estragando qualquer ambiguidade anteriormente criada pelo diretor. Quando o mistério é descoberto, revela-se uma resolução clichê vista melhor executada em diversos filmes — e a citação de quais filmes, entregaria o próprio mistério. 

Fratura é mais um projeto de Brad Anderson com a Netflix, que, mais uma vez, mostra ser um excelente manipulador de ritmo, tensão e atmosfera. Apesar do roteiro não ajudá-lo, a parceria do diretor e do ator Sam Worthington cria uma imersiva jornada de confusão mental dentro de um ambiente perturbado. Para alguns, hospitais podem ser lugar que representa a concepção da vida. Já na visão de Anderson, não há nada mais assustador do que estar diante de formulários para preencher antes de ser atendido, filas de espera que não se baseiam na importância de cada lesão, separação de familiares através de áreas restritas, falta de transparência dos profissionais na hora do atendimento, seguros que não cobrem. É o pesadelo da burocracia hospitalar.

Direção: Brad Anderson
Elenco: Sam Worthington, Lily Rabe, Stephen Tobolowsky, Adjoa Andoh, Lucy Capri

Assista ao trailer!

Confira o longa Fratura diretamente na Netflix!