Na vida, ou você já sofreu bullying, ou você já foi o bully. A adolescência é uma fase marcada por inseguranças, principalmente por um sentimento de inadequação quando não se cumpre um certo padrão. Dentro dessa lógica, Jodi (Ava Michelle, estreante) está inserida dentro do primeiro grupo. Sendo a garota mais alta de sua escola, ela sempre se sentiu deslocada e vivia a desilusão de que nunca encontraria um Crush à Altura (literalmente). Entretanto, tudo mudaria após o sueco Stig (Luke Eisner, estreante) ir fazer intercâmbio em seu colégio.
Desde a primeira sequência de Crush à Altura (Tall Girl, no original), sua temática fica clara. Sentada, lendo o livro Uma Confraria de Tolos, Jodi é interrompida por um menino que tenta flertar com ela, perguntando sobre a leitura. Assim, a menina responde que é uma história sobre isolamento social, na qual o protagonista tenta ser aceito em um mundo que não quer nada com ele. Ela ainda afirma que esse isolamento é a fonte de sua força, mas também de seus problemas. Em seguida, após Jodi levantar da cadeira, o menino se assusta e vai embora. Já que o roteiro de Sam Wolfson resumiu todo o conceito do filme em seus primeiros dois minutos, poupe-se de ver o resto. Brincadeira. Ou não.
A autoconsciência metalinguística do roteiro já prenuncia que Crush à Altura trata-se de um conto adolescente sobre amadurecimento, com todos os clichês do gênero. Além disso, a lógica deste universo, criada pela diretora Nzingha Stewart (With this Ring), deixa claro que ela quer criar um mundo no qual o espectador se sinta no lugar de Jodi. Afinal, por mais que a protagonista tenha uma vida própria, dentro de sua cabeça, tudo gira em torno de sua característica física.
Por isso, perde-se a verossimilhança e ganha-se no exagero, exemplificado principalmente pelas repetitivas piadas que são feitas (“Como vai o tempo aí em cima?”). Até mesmo nos diálogos com sua família fica a impressão de que a estatura é o único assunto existente, com os pais convocando uma reunião de um grupo de pessoas altas para que a filha se sinta mais confortável, causando o efeito inverso.
Ainda que os acontecimentos da narrativa indiquem esta cosmologia de um conto de princesa com um sentimento de deslocamento, Stewart perde boas oportunidades de brincar visualmente com o tema. Tímida, a diretora usa frequentemente enquadramentos em primeiro plano (do ombro à cabeça) que contrastam a altura de Jodi com os outros personagens. Na única sequência mais inventiva, ela subverte expectativas ao colocar Dunkers (Griffin Gluck, Vândalo Americano), que é bem menor que Jodi e Stig, mais próximo da câmera do que os dois. Tal artifício gera a impressão que ele é o gigante da cena, o que faz sentido dentro daquele contexto.
Dunkers é apaixonado por Jodi, que nunca o considerou como um candidato viável, pois na visão dela estar com o rapaz ressaltaria ainda mais seu tamanho. Essa pré-concepção da protagonista traz uma perspectiva interessante, mostrando que até as vítimas de bullying, em uma certa situação, podem ser praticantes do mesmo. Afinal, a jovem está perpetuando um tipo de preconceito ao não querer se relacionar com alguém menor do que ela. Por outro lado, é preocupante a forma como o roteiro naturaliza e recompensa as atitudes tóxicas e abusivas deste rapaz. Após sua rejeição e a aproximação de Jodi com Stig, ele faz de tudo para sabotar o romance entre os dois.
Com seus brilhantes olhos azuis, Ava Michelle consegue exteriorizar visualmente o amadurecimento da protagonista. Inicialmente curvada, tímida e apática, ela vai ganhando confiança e imponência ao longo do filme. De mesmo modo, seu figurino indica essa evolução. Aos poucos, o azul escuro e o preto de suas roupas vão sendo substituídos pelo branco e, no seu auge, por um brilhante azul.
Nome chave do elenco, Sabrina Carpenter (Garota Conhece O Mundo) faz Harper, irmã de Jodi. Sua personagem é uma modelo fútil que auxilia a caçula em sua transformação física, mostrando os caminhos da vaidade, e constantemente serve de alívio cômico. Já Angela Kinsey, famosa por The Office, interpreta a mãe das duas, mas praticamente não possui espaço.
Assim como em Amor em Obras, a Netflix traz mais uma história de amor que joga em uma zona de conforto, sem inovar. O diferencial de Crush à Altura é que sua principal camada fala sobre amadurecimento e autoaceitação, sendo contada através de um universo exagerado e repleto de clichês. Apesar das boas intenções, estamos apenas diante de um filme genérico cuja mensagem já vimos ser contada de forma melhor pelo menos mil vezes.
Direção: Nzingha Stewart
Elenco: Ava Michelle, Sabrina Carpenter, Griffin Gluck, Luke Eisner, Angela Kinsey
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