Antes de tratarmos de Baywatch é preciso que deixemos alguns parâmetros de nossa avaliação bem claros. Ninguém aqui está cobrando que Baywatch traga reflexões profundas sobre a existência humana ou sobre os atuais conflitos políticos e sociais do mundo, tampouco que seu diretor Seth Gordon (do irregular Quero Matar Meu Chefe) demonstre sinais em seu filme de que seu cinema possui paralelos com os de um Jean-Luc Godard ou Stanley Kubrick da vida. Olhamos para Baywatch a partir das demandas que o próprio filme acaba chamando para si.
A expectativa que tivemos desde os primeiros trailers era a de que Baywatch fizesse justiça aos predicados do tipo de cinema ao qual si vinculou, um tipo de comédia que, tal qual a série homônima dos anos de 1990, não tinha compromisso algum com a seriedade, oferecendo ao espectador um autêntico besteirol americano. Não que o diretor Seth Gordon, os roteiristas e seu elenco não nos consiga oferecer esse tipo de entretenimento, em partes localizadas da projeção eles conseguem, mas, por uma estranha razão, essa transposição “tardia” do seriado para as telonas em outros tantos momentos parece esquecer do seu pacto inicial com o espectador e assume contornos mais sisudos, transformando-se ocasionalmente em um filme de ação/ espionagem e não em uma comédia de ação, como seria mais apropriado.
Em Baywatch, Dwayne Johnson dá vida a Mitch um salva-vidas que se dedica ao seu trabalho em funções que vão além da sua obrigação. Além de ficar vigilante com as atividades dos banhistas, Mitch se preocupa em manter sua zona de atuação o mais afastada possível de atividades ilícitas. Em suas missões, o salva-vidas conta com uma equipe bem treinada e que se articula em diversas frentes para manter a ordem na baía (sério, não deveríamos encarar com seriedade uma premissa dessas). A rotina do grupo é abalada com a chegada de um novo salva-vidas, o ex-atleta olímpico Matt Brody, interpretado por Zac Efron. Mesmo com dificuldade para se adaptar à rotina do grupo, Brody acaba se tornando parceiro de Mitch na investigação de um esquema de tráfico de drogas que tem se proliferado na região.
A estranha execução de Gordon em Baywatch parece situá-lo num lugar de vacilação. A impressão que o filme por vezes nos dá é a de que o diretor não deixou o seu humor adolescente conduzir a história, tratando o besteirol com uma timidez. Oras, se Baywatch apela para a escatologia e muitas vezes para a autorreferência, fazendo piada das marcas esdrúxulas do seriado (da icônica câmera lenta para a C.J. de Pamela Anderson ao estranhamento causado pelo fato de uma equipe de salva-vidas se envolver em tramas policiais) não dá para entender as razões que fizeram Gordon deixar de investir de maneira mais extrema nesse caminho, reservando um espaço desnecessário ao desenrolar de uma trama investigativa que não acrescenta em nada à experiência do espectador. Gordon desperdiça uma potencial química entre Dwayne Johnson e Zac Efron, que é perceptível e que em diversos momentos sustenta o filme, para desenvolver arcos narrativos de redenção para o segundo e neutralizar a veia cômica involuntária do primeiro.
Assim, o que fica de Baywatch é a sensação de oportunidade desperdiçada. Todas as peças parecem estar no lugar para fazer uma engrenagem interessante funcionar, mas seu realizador tem receios e recua demais não percebendo a demanda real do projeto. Por não ter ido ao extremo na premissa que o próprio filme propõe, a de não ter compromisso algum com filtros e normas de “boa conduta” e rir dos seus próprios absurdos, Baywatch fica num meio termo que não lhe favorece. O filme é divertido e tem bons insights na sua adaptação, sobretudo quando investe no diálogo com as referências do seriado, mas insiste em uma timidez no tratamento desse tom que faz o espectador ficar completamente indiferente ao seu resultado final.
Assista ao trailer do filme: