Operação Cerveja

Crítica: Operação Cerveja

2.5

Depois de vencer um Oscar controverso de melhor filme com Green Book em 2018, um longa que rendeu inúmeras discussões sobre a ideia do white savior (o herói branco), Peter Farrelly poderia ter a chance de se redimir com o público em Operação Cerveja, seu filme seguinte que está disponível no Apple TV +. O longa tem muitas qualidades, mas não consegue enxergar as potencialidades da sua narrativa e, sobretudo, do seu protagonista, o ator Zac Efron (Baywatch), em momento inspirado. No saldo, esse novo longa do diretor apresenta até mais prós do que contras em comparação com seu filme anterior, mas nem por isso deixa menos evidente os tropeços da condução do realizador com suas histórias, sobretudo quando ele se leva a sério demais.

Operação Cerveja conta a história de Chickie Donohue (Zac Efron), um jovem estadunidense que viaja para o Vietnã em plena guerra no final da década de 1960, com um projeto bem-intencionado, mas obviamente estúpido: oferecer cervejas aos soldados do seu país, a maioria amigos de vizinhança de Chickie, como forma de agradecimento e apoio à sua bravura. Quando chega na zona de guerra, o rapaz percebe que a realidade do conflito não é como ele imaginava e que os governantes do seu país, que ele tanto defendia e em quem tanto acreditava, estão mentindo para a população sobre a situação no Vietnã.

No âmago, Operação Cerveja apresenta Chickie Donohue como um sujeito fora da realidade, alienado, do tipo que acredita piamente no seu presidente sem contestar, excluindo a realidade que o cerca como parâmetro para avaliar as falas e ações do governo do seu país. Em dada discussão com o jornalista de guerra interpretado por Russell Crowe (Thor: Amor e Trovão), o personagem chega a dizer que a imprensa não deveria propagar notícias ruins sobre o conflito pois estas deixam o povo estadunidense desesperançoso, ou seja, lobotomizado pela retórica do seu presidente, Chickie acredita piamente que esconder a realidade engendra algum tipo de força motora no bem-estar da população. Acredito que até aqui o leitor já tenha identificado esse perfil de figura na atual realidade do nosso país, fazendo com que algumas ideias de Operação Cerveja sobre a sociedade da desinformação, a pós-verdade das fake news de whatsapp, sejam atemporais na condução de governos autoritários e manipuladores.

Operação Cerveja

Zac Efron interpreta muito bem o protagonista de Operação Cerveja, o típico estadunidense médio. Efron sabe lidar com o comportamento absurdo desse sujeito bitolado por ideias nacionalistas que acredita nas teorias da conspiração mais sem fundamento possíveis, ao mesmo tempo que compreende que o humor aqui surge como efeito colateral e não como força-motora desse personagem. Com isso, Efron consegue tornar Chickie Donohue uma figura muito crível e não uma caricatura, uma armadilha fácil na composição desse tipo de sujeito. Mesmo dando humanidade a esse sujeito, o ator não afasta essa composição de uma crítica social e política que flerta com a ironia na representação do extrato social que ele representa. Há decisões muito inteligentes no trabalho de Efron em Operação Cerveja.

O problema do longa é que Peter Farrelly parece colocar o filme o tempo todo em conflito. O diretor e roteirista não sabe se olha com simpatia para esse protagonista, que muda de percepção sobre a guerra na medida em que vivencia a violência do conflito, ou se ironiza aquele sujeito. O filme parece se colocar no fogo cruzado entre a crítica e a necessidade de construir uma jornada de redenção cheia de momentos piegas e inorgânicos para seu protagonista.

Nos minutos finais de Operação Cerveja, a inconsequência de Chickie Donohue assume ares heroicos com sua regeneração. Farrelly prefere fincar as raízes do seu filme no drama fácil do que no teor irônico que sua história parece sugerir pontualmente e que a transformaria em uma obra bem mais interessante do que é. O longa até peca na forma ingênua como constrói a jornada de regeneração de Chickie com direito até a discursos inflamados do mesmo quando ele retorna aos EUA.

Esta já é a segunda empreitada de Farrelly em temáticas mais sérias. Egresso de comédias como Quem vai ficar com Mary?, Debi e Lóide, Eu, Eu Mesmo e Irene e O Amor é Cego, talvez fizesse melhor ao diretor pensar no seu retorno à comédia. Dado o resultado de Green Book e agora em Operação Cerveja, filmes que soam como um apelo de um diretor para ser levado à sério, se moldando a fórmulas dramaturgicamente anacrônicas, é o momento de Farrelly dar vazão ao seu lado mais ácido e assumidamente cômico. Os momentos em que Operação Cerveja brilha são quando o diretor explora a falta de noção latente em Chickie Donohue através do desempenho certeiro de Efron. O resto do filme parece ruído e resultado da necessidade de um diretor que parece ainda buscar aprovação da crítica e dos prêmios.

Direção: Peter Farrelly

Elenco: Zac Efron, Russell Crowe, Bill Murray, Kyle Allen

Assista ao trailer!