Crítica: Animais Noturnos

Animais Noturnos é um longa estranho de se olhar. Dirigido por Tom Ford, conhecido estilista que estreou como cineasta no sensível Direito de Amar, protagonizado por Colin Firth e Julianne Moore, Animais Noturnos é baseado no romance de Austin Wright e traz como base para a construção da sua narrativa a já conhecida abordagem da história dentro de outra história. As camadas narrativas aqui são catalisadoras  da redenção dos seus principais personagens que se apropriam da ficção para isso.

Em linhas gerais, há dois filmes em Animais Noturnos aquele do “mundo real” e outro que é a ficção nas páginas do livro lido pela personagem de Amy Adams. No fundo, uma única história acaba interessando, a dessa mulher e seu relacionamento mal resolvido com o ex-marido, papel de Jake Gyllenhaal, que, por sinal, é o autor da obra que a protagonista lê e que também dá título ao filme que estamos vendo.

Assim, se Animais Noturnos for pensado como um drama sobre um relacionamento fracassado e as diferentes maneiras que seus protagonistas enxergam de expurgá-lo, ela através da reconciliação efetiva fora das páginas do livro e ele limando antigos “eus” e situações traumáticas na sua ficção da maneira mais drástica e violenta, o filme se resolve, sobretudo por uma cena final que sugere a continuidade da falta de comunicação entre os personagens centrais da história. Há ainda o acerto do filme no seu departamento plástico, centrado no olhar sofisticado da personagem de Adams, que como diretora de uma grande galeria de arte vive em ambientes dotados de uma estética particular, ao mesmo tempo, Animais Noturnos confere uma leitura asséptica ao conto sobre violência escrito pelo ex-parceiro da protagonista. Nada mais natural, afinal, é a visão dela sobre os acontecimentos do livro.

Todavia o filme cai em uma armadilha. Ao trazer uma segunda ficção para sua história e levá-la para além das folhas de papel – percebam como durante a leitura a personagem de Adams começa a ser atravessada por acontecimentos estranhos que sugerem perigo ou temor (o pássaro morto após bater no vidro da área externa da casa da protagonista ou o vídeo da babá da sua assistente aparecendo diante da câmera enquanto cuida da criança) -, Animais Noturnos cria para si a obrigação de ser igualmente eficiente e minimamente interessante nessa chave de comunicação com o espectador, o que não acontece. A trama policial do livro do personagem de Jake Gyllenhaal é oca e pouco envolvente, o que nos faz: a) duvidar do talento do mesmo para a coisa; b) achar que qualquer leitor com o mínimo de critério e bagagem literária consegue achar a trama aborrecida; e c) duvidar do “bom gosto” da personagem de Adams que passa cenas e cenas do filme entretida com a tal história (tá certo que em algum momento ela encontra conexões com sua vidas, mas…).

Há ainda outra armadilha em Animais Noturnos, mesmo trazendo ideias interessantes na costura da sua trama central (o relacionamento do casal de protagonistas), o filme ainda apresenta ranhuras. Por mais coerente que seja a leitura de Ford para os dois personagens e que o recurso da ficção como canal para exorcisar demônios pessoais funcione na história, se pararmos para pensar a fundo na composição dos personagens, seus conflitos e trajetórias, Animais Noturnos é um filme demasiadamente superficial. Tão superficial e frio quanto o universo de Susan Morrow (Adams). É uma pena porque todos esperavam bem mais da segunda incursão de Ford no cinema, ainda mais com um elenco desse calibre (juntam-se a Adams e Jake, Michael Shannon, Aaron Taylor-Johnson, Laura Linney, Michael Sheen, Andrea Riseborough, Isla Fisher e Armie Hammer). Fica para a próxima.

Assista ao trailer do filme: 

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