Com O Jovem Ahmed, a dupla de cineastas Jean-Pierre e Luc Dardenne (Dois Dias, Uma Noite) utilizam um cinema dos gestos cotidianos e do pouco destaque aos grandes eventos para explorar um estudo de personagem, mas, antes disso, uma análise minuciosa sobre o extremismo religioso. A partir da jornada de um garoto muçulmano de 13 anos influenciado pelas interpretações do seu primo para as palavras do Corão, Ahmed encontra como inimiga sua professora, uma mulher que insiste em ensinar o árabe para seus alunos bem longe das páginas do livro sagrado.
Há uma série de tensões sociais e históricas sobrepostas nessa relação entre Ahmed e sua professora: o gênero, a imigração, a religião. Todas elas serão determinantes na constituição do homem que esse menino se tornará no futuro. Todas elas entram em estado de ebulição na biografia de uma personalidade em formação, um adolescente cujos ambíguos traços de personalidade sugerem um mal sendo germinado, mas também uma potencialidade de redenção, ou seja, de libertação de toda essa corrupção moral.
Em menos de 90 minutos de duração, os irmãos Dardenne conseguem explorar todas as nuances e conflitos da psiquê desse adolescente dividido entre as interpretações radicais da sua religião, que versam sobre vingança e violência, e seus próprios desejos e afetos. Ao longo do filme, os Dardenne acompanham os gestos mais singelos de Ahmed, interpretado por Idir Ben Addi, com grande atenção. É bem claro desde o princípio que aquilo que de mais determinante existe na formação desse jovem protagonista está no mais banal dos seus movimentos.
Os Dardenne fazem um estudo detalhado sobre os meandros da semente do terrorismo e do conflito de imigrantes muçulmanos em países europeus, sem moralismos e sublinhando o lado soturno do ressentimento germinado na mente de muitos jovens. Nesse sentido, Ahmed é construído como um personagem complexo que sempre rivaliza e entra em conflito quando sua responsabilidade para com o revanchismo cultural colide com o remorso no tratamento que dá para sua professora ou na vivência do primeiro amor, quando começa a sentir algo por uma garota quando passa um tempo no reformatório.
Até o último segundo de O Jovem Ahmed, os Dardenne coloca o seu jovem protagonista no liame entre uma patologia mental em estado de amadurecimento e a inocência e abertura afetiva típica da idade do garoto, nos fazendo perceber o mal como algo que deforma e desvirtua um sujeito. Nessa narrativa, os cineastas são atentos mais às ações rotineiras do que a dinâmicas grandiloquentes e grandes diálogos. É um cinema extremamente eficiente que os diretores já realizaram em títulos como Dois Dias, Uma Noite e que aqui confirma sua eficiência em prol da discussão sobre uma sociedade atravessada por ressentimentos culturais.
Direção: Jean-Pierre e Luc Dardenne
Elenco: Idir Ben Addi, Olivier Bonnaud, Myriem Akheddiou, Victoria Bluck, Claire Bodson, Othmane Moumen
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