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Crítica: Vice

Momentos históricos e figuras conhecidas são foco de narrativas desde o início do cinema. A partir da década de 1950, a quantidade de produções voltadas para a vida de personalidades ou acontecimentos marcantes só cresceu. Graças aos excepcionais produtos biográficos de 2018, as maiores premiações do cinema tiveram cinebiografias nas categorias de maior destaque. Cerca de oito longas-metragens comandaram essas cerimônias e, dentre eles, três estão concorrendo ao Oscar de “Melhor Filme”.

O diretor, produtor e roteirista Adam McKay, depois do sucesso de A Grande Aposta (2015), embarcou numa nova aventura no gênero dos filmes biográficos. Após explicar para o mundo, com toda a sua desenvoltura, simplicidade e sarcasmo, o problema da crise econômica de 2008, agora McKay traz a jornada do político americano Dick Cheney para as telonas. O longa-metragem intitulado Vice é um retrato sobre os principais momentos da vida e carreira dessa figura política tão controversa da história estadunidense.

Após decidir que daria um novo rumo em sua vida, o jovem Dick Cheney (Christian Bale) se afilia ao Partido Republicano ao perceber que o mundo da política poderia lhe proporcionar grandes oportunidades. O pontapé inicial para seu crescimento acontece assim que ele se torna assessor de Donald Rumsfeld (Steve Carell). Com o passar dos anos, independente das reviravoltas do cenário político dos Estados Unidos, Dick assegurou seu lugar como uma figura de destaque e influência. Mais de 30 anos após o início de sua carreira, Cheney estava trabalhando no setor privado até que George W. Bush (Sam Rockwell) – o qual planejava se lançar como candidato à presidência – o convida para ser o vice-presidente da chapa. Dick Cheney aceita a proposta com a condição de deter diversos poderes que estão além da real condição de um vice-presidente.

Antes de assistir Vice é importante que se entenda a perspectiva do filme. Não existe nenhum tipo de oportunidade para visualizar Dick Cheney. O longa é construído para que o público perceba o que há de pior nessa persona. É sob esse olhar que toda a história se desenvolve. Adam McKay dirigiu e roteirizou essa narrativa com um humor ácido fenomenal. As suas vivências anteriores escrevendo e dirigindo longas de comédia o ajudam desde A Grande Aposta e agora não seria diferente.

A crítica imbuída a cada cena e acontecimento cria um ritmo interessante para a película. McKay aposta mais uma vez em sua abordagem satírica e metalinguística de explicar o seu filme dentro do próprio filme. Ao contrário do seu último trabalho onde diversos artistas explicavam termos técnicos da economia, em Vice, o espectador se depara com um narrador-personagem, o qual serve como guia da história de Cheney. A partir dessa linha histórica criada por Kurt (o narrador), o público passa a presenciar alguns dos momentos mais tensos, escandalosos e conturbados da política americana.

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Por conta dessa abordagem estabelecida em 2015 com sua outra cinebiografia, Adam McKay desenvolveu uma construção narrativa peculiar – a qual sempre chamou a atenção do público e crítica. Além dos artifícios metalinguísticos e dos diálogos e cenas carregados de humor ácido criados nas duas últimas películas, Mckay ainda conta com uma montagem única. Hank Corwin se tornou o nome responsável pela interpretação e materialização das composições visuais nada ortodoxas de McKay. As edições de The Big Short e Vice (títulos originais) foram resultado do trabalho de Corwin e lhe renderam indicações em premiações – incluindo o Oscar.

Uma outra fonte de destaque dos trabalhos de McKay é o seu elenco. Sempre muito bem escolhido, o conjunto de atores personifica e traduz as ideias do diretor em cada uma das cenas. Especificamente nesse longa, o elenco teve o enorme desafio de não se tornar uma mera caricatura de figuras conhecidas do cenário político norte americano. A notabilidade do filme está atrelada, principalmente, a estrela da película. Christian Bale encarnou a “persona non grata” que era Dick Cheney e fez uma de suas melhores performances da carreira. Bale preenche as cenas com o sorriso maquiavélico e o olhar pomposo de Cheney e faz o público delirar com a sua endiabrada personalidade. Ele é um show à parte.

Ao seu lado de Bale, Amy Adams e Sam Rockwell também fizeram interpretações de destaque. Rockwell está extraordinário com o olhar perdido e infantil de George W. Bush e Adams está simplesmente genial como Lynne Cheney. Tyler Perry completa as figuras de importância da época como o general Colin Powell, enquanto o ator Jesse Plemons mostra o seu talento como o narrador da trama política. Um dos deslizes do longa, contudo, está na interpretação de Steve Carell. Ao viver o papel do Secretário de Defesa do governo Bush, Donald Rumsfeld, o ator não consegue se afastar muito da realidade e acaba se assemelhando mais a uma caricatura do Secretário do que a uma personificação da figura como fez Bale.

Até o momento, o longa-metragem de Adam McKay recebeu 92 indicações e foi vitorioso em 17 delas. A maior parte dessas vitórias está atrelada ao elenco (em especial, Bale). A força dessa produção nessa temporada de premiações reside verdadeiramente em seus atores que entregaram performances excepcionais. Apesar do BAFTA ainda estar por vir, a premiação mais aguardada é o Academy Awards, onde a película foi indicada em oito categorias. As apostas para o Oscar estão justamente nos seus dois pontos fortes: a atuação memorável de Christian Bale e a maquiagem incrível que ajudou a fazer o trabalho do elenco ainda mais realista. Vice é a quarta nomeação de Bale por uma atuação – com apenas uma vitória por O Vencedor (2011). O ator ganhou a maioria das principais premiações e segue como o favorito para o Oscar de “Melhor Ator”, resta esperar para saber se a Academia irá ou não anunciar o nome dele no dia 24 de fevereiro.

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