As lendas urbanas são um alicerce poderoso para o universo do horror. As criaturas assombram gerações com mistérios que levantam eternamente uma dúvida quanto a veracidade dos fatos relacionados às suas histórias. O próprio cinema de terror foi forjado através de fábulas contadas há séculos, tendo Nosferatu (1922), dirigido por F. W. Murnau, como o clássico que apresentou para o mundo a primeira imagem visual concreta do que seria essa criatura mítica. Além do velho vampiro, a caminhada inicial do gênero se sucedeu com outras produções baseadas em contos assombrosos, a exemplo de A Múmia (1932) e O Lobisomem (1941).
Ao longo dessa trajetória muitas lendas urbanas foram centro de narrativas fílmicas, em especial nas décadas de 1980 e 1990, no auge do terror, através de películas como The Loch Ness Horror (1982), O Mistério de Candyman (1992), a franquia Lenda Urbana (1998 – 2005), A Bruxa de Blair (1999) e até mesmo uma das melhores versões (dentre as dezenas existentes) sobre o nosferatu com o longa-metragem de Francis Ford Coppola intitulado originalmente como Bram Stoker’s Dracula, de 1992.
Segundo o folclore, o Slender Man é um ser anormalmente alto, tem braços que se transformam em tentáculos, usa um terno preto e não tem rosto, apenas uma face branca sem nada. O ser sobrenatural foi criado pelo website Something Awful, em junho de 2009. A partir da montagem postada no site com essa figura fictícia, a sua imagem logo se tornou viral e, em seguida, começaram a surgir diversas histórias sobre ele.
Alguns anos depois da lenda urbana ter sido desenvolvida e compartilhada para o mundo, ocorreram incidentes violentos os quais geraram uma onda de pânico acerca do conto. Um desses acontecimentos marcou e chocou o mundo. Em maio de 2014, no estado de Wisconsin (EUA), duas meninas de 12 anos, Anissa Weier e Morgan Geyser, atraíram sua amiga Payton Leutner para a floresta como uma oferenda para o Slender Man.
Com o intuito de ganhar a atenção da criatura, as duas garotas esfaquearam Payton 19 vezes. A jovem conseguiu se arrastar até a beira da estrada onde foi encontrada e levada para o hospital. Anissa e Morgan foram julgadas inocentes por razões de insanidade e, em fevereiro de 2018, foram condenadas a passar um longo período em uma instituição de saúde mental.
Na semana passada, o público estadunidense foi o primeiro a ter acesso ao resultado da nova produção da Sony Pictures: Slender Man – Pesadelo Sem Rosto. Baseado na narrativa ficcional do humanoide, o longa tem como objetivo colocar essa alegoria da web de volta em pauta e, dessa forma, trazer toda a atmosfera de medo que envolve o seu conto. A resposta do público não foi tão positiva quanto o estúdio esperava. A sua estreia nos cinemas brasileiros acontece nesta quinta-feira (16).
Um grupo de quatro amigas está reunido na casa de uma delas. Mais cedo neste dia, elas descobriram um site sobre o mito sobrenatural do personagem Slender Man. Wren (Joey King) tenta convencer Hallie (Julia Goldani Telles), Chloe (Jaz Sinclair) e Katie (Annalise Basso) a assistirem o vídeo de invocação da criatura. O que elas não sabiam é que, a partir daquele momento, suas vidas se tornariam seus piores pesadelos.
Após dias de visões com o homem sem rosto, Katie desaparece em meio a uma excursão. Com a polícia sem pista alguma quanto ao paradeiro da jovem, as três amigas vão se ver obrigadas a confrontarem a terrível verdade: o Slender Man levou Katie e agora resta a elas tentarem salvar as suas vidas e a de sua amiga desaparecida.
A mitologia que ronda a figura do Slender Man seria, em teoria, o suficiente para dar vida a um filme de terror sem igual. Contudo, o trabalho entregue ao espectador não alcança as expectativas criadas desde o anúncio da produção do longa. O que pode ser visto é a tentativa excessiva de criar uma obra aterradora por meio de sombras, escuridão e imagens bizarras. Na verdade, a película é bem interessante na sua primeira meia hora e consegue criar o ambiente de tensão desejado e necessário. O desenrolar da próxima hora é que se torna um problema.
A direção de Sylvian White (Os Perdedores, de 2010) não se mostrou plenamente eficiente para guiar a história do meme sobrenatural que ganhou o mundo há nove anos. O argumento da adaptação é agradável e dá uma liberdade criativa para a obra. A problemática do roteiro de David Birke (Elle, de 2016) está no desenvolvimento final o qual poderia ser muito mais surpreendente – além dos fatos ao longo da narrativa que causam incômodo no espectador por serem coisas desconexas que geram buracos. Resumidamente, Slender Man se mostra como um filme que poderia muito mais do que conseguiu.
O medo e a tensão envolvidos na ficção sobrenatural que deu origem ao longa-metragem está presente na sessão. Já o horror que faz o espectador temer a própria sombra não foi alcançado. Faltou um pouco de desenvolvimento em alguns fatos da narrativa para causar esse efeito almejado. Inclusive, é interessante perceber que a Sony Pictures lançou dois trailers oficiais esse ano, onde o primeiro aparenta ter exatamente isso que faltou. Talvez o estúdio tenha demandado mudanças para a edição final da obra e foram elas que levaram para o resultado visto. O que pode ser observado com esse trabalho da Sony é a linha tênue que uma história de terror vive. Slender Man – Pesadelo Sem Rosto é a prova de que os detalhes são os responsáveis por criarem o que há de melhor e pior no universo do horror.
Assista ao trailer!