As cinebiografias têm ocupado um espaço cada vez maior nos últimos anos e em 2023 não foi diferente. Após o sucesso e aclamação da crítica para Elvis (2022), o novo filme da diretora Sofia Coppola (O Estranho que Nós Amamos, de 2017) chega aos cinemas brasileiros para expandir um pouco mais o imaginário sobre a intimidade das relações e vida de uma das maiores estrelas da música mundial, Elvis Presley. Desta vez, no entanto, a cineasta traz Priscilla, a ex-mulher e mãe da filha do rei do rock, para o centro da narrativa.
O longa-metragem, que leva o nome da atriz e empresária Priscilla Presley, foi baseado no livro de memórias escrito por ela e Sandra Harmon, lançado em 1985. Priscilla narra o relacionamento da personagem-título com o cantor do momento que os dois se conheceram até sua separação. A adaptação foi escrita por Sofia Coppola que, como de costume, usou sua sensibilidade característica para tecer os acontecimentos reais da vida do casal.
A partir das vivências do conturbado relacionamento que durou cerca de 14 anos, a cineasta utiliza de planos fechados e silenciosos momentos de solidão para expressar a intensidade e as ausências da relação. Com uma direção precisa e um roteiro estrategicamente esquematizado, Priscilla é uma bela obra adaptativa que consegue expressar de forma incômoda os altos e baixos do relacionamento.
Ainda que essa sensibilidade de condução seja um ponto alto da produção, o maior acerto de Priscilla é a escolha de tirar essa figura do segundo plano e colocá-la sob os holofotes da atenção do público. É como se o público tivesse conhecido Elvis com Baz Luhrmann, mas o espectador só soube quem ele realmente era ao vislumbrar o livro da vida de Priscilla. O projeto de Sofia é um olhar na fechadura da intimidade, dos destemperos e das dores do astro do rock que, em diversos episódios, foram gerados por ele próprio.
A sensibilidade no olhar por trás da figura de quem foi Elvis é uma mostra do poder de Sofia Coppola ao brincar com os silêncios e o íntimo de seus personagens. O impacto aqui é, contudo, maior (ao menos em alguns momentos) por tratar de uma vida pública e exageradamente conturbada. Por vezes, a sutileza de Coppola faz essa intensidade se dissipar nas quase 2h de duração de Priscilla. No entanto, quando ela é sentida, o público se vê completamente imerso e entregue aos acontecimentos do cotidiano nada comum do casal.
Para materializar e dar corpo às configurações comentadas, foi preciso uma escalação potente para os papéis principais. Cailee Spaeny (Vice, de 2018) como Priscilla é de tirar o fôlego. Sua atuação minuciosa e delicada encanta e prende a atenção do espectador desde o primeiro minuto. E é a evolução da personagem e, consequentemente, de Cailee que aumenta ainda mais a beleza do resultado do trabalho da atriz em Priscilla. Suas indicações nos maiores prêmios do cinema é justificável, ainda que parece distante de uma vitória – não pela falta de potência de seu trabalho, mas pelo desempenho de suas concorrentes.
Seu parceiro, Jacob Elordi (trilogia A Barraca do Beijo), por outro lado, tem mais dificuldades. Ainda que seu desempenho seja interessante e louvável por mostrar um Elvis descontrolado e fetichista, é impossível não comparar com a atuação de Austin Butler. Além do ator ter sido fenomenal em sua interpretação como o rei do rock, o filme de Lurhmann foi aclamado nas premiações principalmente pelo desempenho de Butler. Por essa razão, e pelo tempo de tela de Elordi ser expressivamente menor que o de Austin, o ator de Priscilla perde um pouco de força para o público, apesar de acompanhar sua parceira de cena na intensidade e força em cena.
A narrativa de Coppola ganha, portanto, nesse novo olhar sobre a personagem-título e seu ex-companheiro. Essa mudança no enfoque torna Priscilla uma jornada interessante e íntima. Existe uma sinceridade na exposição daquelas vidas mostradas em tela que sensibiliza o público e o abraça. E é essa sensação que guia o público do início ao fim do filme, como prova de que uma ‘mesma história’ pode se tornar inúmeras, basta uma mudança de olhar.
Direção: Sofia Coppola
Elenco: Cailee Spaeny, Jacob Elordi, Dagmara Domińczyk
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