Crítica: Histórias Assustadoras para Contar no Escuro

A sétima arte frequentemente bebe da literatura para criar imagens inspiradas ou baseadas em grandes obras. Dessa vez, o autor prestigiado foi Alvin Schwartz e seu conhecido livro de contos de terror que marcou os leitores dos anos 1980. A primeira série de histórias assustadoras foi publicada em 1981 e agora, 38 anos após a inauguração desse universo criado por Schwartz, a Lionsgate entrega ao público um longa-metragem baseado nos contos do livro Histórias Assustadoras para Contar no Escuro. O filme, produzido pelo mestre da ficção gótica Guillermo del Toro (O Labirinto do Fauno, de 2006, e A Forma da Água, de 2017), chega aos cinemas brasileiros nessa quinta-feira (8).

Uma das características mais marcantes da produção é a sua atmosfera. Por mais que a trama seja morna em sustos e tenha um tom mais infanto-juvenil, a narrativa não perde em nenhum momento o seu clima de horror. A experiência leva o público a se sentir constantemente envolto numa névoa de apreensão e repulsa. Ao longo do filme, o espectador é apresentado ao cotidiano de jovens e seus maiores temores. As lendas urbanas, que tanto movem a literatura e cultural locais de todos os países, entram em cena como personagem principal da película. Tudo isso aliado ao seu estilo – o qual remete imediatamente a outras produções como as histórias em quadrinhos Goosebumps e Contos da Cripta – torna Histórias Assustadoras para Contar no Escuro uma obra de terror bem elaborada, a qual aflora e instiga as pessoas através de uma perspectiva que foge do comum.

Numa cidade do interior tomada por eventos macabros e lendas urbanas, um grupo de jovens acaba por despertar o mal que estava adormecido num livro de histórias de terror. Desde então, os adolescentes viram suas vidas em jogo graças aos contos que começaram a se tornar realidade, onde cada um deles seria caçado por seus maiores temores. O único jeito de resolver o dilema do livro e salvar as suas vidas é entendendo a verdade por trás da maior lenda da cidade: Sarah Bellows.

Apesar do roteiro ter sido escrito por muitas mãos, o resultado final é satisfatório. O clima das cenas, os toques de tensão, a costura dos contos e, principalmente, as histórias escolhidas foram fundamentais para gerar um produto final de qualidade. Os irmãos Dan e Kevin Hageman foram capazes de entregar uma experiência de terror diferente e criativa. A cada conto que se concretizava, a narrativa crescia e, consequentemente, as personagens principais chegavam mais parte do seu limite. Um outro fator de destaque para a produção é a maneira como o longa é um produto tão familiar ao produtor e, também, um dos idealizadores da história que gerou a adaptação do filme. A chancela de qualidade de del Toro aparece no estilo do projeto como um todo – em especial na visualidade dos monstros.

Talvez o fator mais apelativo e instigante de toda a produção sejam suas criaturas. Não por faltar algo nos outros setores da produção, mas porque os monstros falam muito sobre a obra. A idealização e caracterização de cada um dos terrores do livro de Sarah Bellows é extremamente criativa e bem executada nos mínimos detalhes. E esses “medos ambulantes” falam por si só. A carga que cada um deles trás às cenas ou a forma como eles complementam a história das personagens salva qualquer tipo de crítica ao desenvolvimento clichê do problema central da narrativa. As criaturas conseguem te causar calafrios só por estarem imóveis em sua frente, elas são uma perfeita expressão dos pesadelos mais reais (e estranhamente terríveis) de qualquer pessoa.

O diretor André Øvredal cumpri seu papel com a proposta de Scary Stories to Tell in the Dark (título original). A produção se mostra um trabalho mais acessível a um público mais jovem – diferente de outros filmes do diretor – e, ainda assim, ele mostra a sua identidade de trabalho. Assim como em A Autópsia (2016), Øvredal prova a sua singularidade ao pensar e comandar uma obra de horror. A sua condução e escolhas de filmagem é muito cuidadosa. O olhar dele sob cada uma das partes e a melhor forma de executá-las é um expressivo quando se assiste ao filme. As mudanças e os nuances de cada ponto de vista das personagens ou até o encaixe entre a descrição das histórias e o ângulo de filmagem conversam bem.

O elenco contribui para a expressividade de todo esse conjunto. A escolha dos atores foi muito acertada. Em especial nos confrontos entre a personagem e seu monstro, cada dinâmica de cena funciona como uma provação do protagonista daquele momento – e todos os executam bem. A carga emocional e de tensão desses encontros é o que faz Histórias Assustadoras valer a pena.

O longa, dessa forma, cumpre seus papéis como obra de terror e adaptação sem nenhuma queixa. Talvez o público ache que falta algo, onde possivelmente essa impressão se refira a potência do medo – ou, para a maior parte das pessoas, susto. Contudo, a escolha da produção em ser um filme mais infantil torna isso apenas uma dosagem do potencial claro que a narrativa tem. Se existir uma possibilidade de a produção continuar com os outros contos e, o estúdio quiser intensificar as possibilidades e potencialidades da sua obra, eles o farão sem problema nenhum. Existe margem e talento para tal feito, afinal Scary Stories é um ótimo conjunto de contos de horror.

Direção: André Øvredal
Elenco: Zoe Margaret Colletti, Michael Garza, Gabriel Rush, Gil Bellows, Dean Norris, Lorraine Toussaint

Assista ao trailer!