Mais um derivado da franquia Star Wars chega aos cinemas. Depois de Rogue One, é a vez de Han Solo: Uma História Star Wars, que narra justamente os eventos que ocorreram com o personagem interpretado por Harrison Ford nos filmes centrais da saga, incluindo o começo de sua amizade com outros ícones da série cinematográfica como Chewbacca e Lando Calrissian. Quem assume o personagem na juventude nesse filme solo é o ator Alden Ehrenreich, de Ave, César! dos irmãos Coen e também do indie Tetro de Francis Ford Coppola. Ehrenreich, por sinal, consegue dar conta do recado na medida do possível, já que suprir a carência de uma presença tão marcante nas telas quanto Ford interpretando Han Solo é uma tarefa ingrata para qualquer ator. No entanto, Han Solo não se sustenta como narrativa nem tem suas falhas nevrálgicas depositadas na interpretação de um ator específico específica. As glórias e os percalços do filme merecem ser creditadas a outros departamentos.
Dirigido por Ron Howard, de obras tão díspares, mas reconhecíveis pelas marcas melodramáticas das suas narrativas e pela estética no tratamento da imagem, como Uma Mente Brilhante e Rush: No Limite da Emoção, Han Solo seria comandado por Phil Lord e Christopher Miller, da animação Uma Aventura Lego. Com a contratação da dupla a Disney queria conferir um tom mais despojado ao filme. Acontece que por divergências criativas Miller e Lord abandonaram o comando com alguns dias de filmagens já iniciado, assumiram apenas a produção do filme e Howard foi chamado às pressas para substituí-los.
O que Ron Howard faz aqui é um trabalho extremamente burocrático, adaptando a direção do seu filme a orientações do estúdio que certamente visavam uma padronização do produto ao blockbuster americano corrente e aos filmes da saga Star Wars também. Isso é perceptível pelo tom do filme, que destoa da polêmica atmosfera de seriedade que dominou o derivado anterior da franquia, Rogue One, e que, por sinal, foi criticado negativamente por fãs e alguns críticos. Nesse sentido, o trabalho de Howard em Han Solo é tão protocolar que faz um diretor com uma assinatura tão sensível ao público quanto ele praticamente desaparecer na tela para dar lugar a um típico exemplar da franquia Star Wars com pouquíssima intervenção criativa, uma condução descompromissada e interessada em ofertar um longa moldado clássicas matinês. E isso não é demérito de Han Solo em momento algum. Por se adaptar ao “esquemão” de um grande estúdio com tanta organicidade, os méritos do trabalho de Howard precisam ser reconhecidos.
Quem estranhou o tom grave e sombrio de Rogue One certamente ficará satisfeito com o resultado de Han Solo, já que ele está mais próximo do espírito que permeou os filmes Star Wars dos anos de 1970 e 1980 do que o derivado anterior da saga inaugurada por George Lucas. Também há em Han Solo uma apropriação interessante de recursos do gênero western, ainda que isso não represente nenhuma originalidade, mas certamente será um deleite para os cinéfilos. O uso do western em planos como o encontro de grupos rivais e o tiroteio em um lugar fechado são pertinentes por Han Solo trafegar em um universo protagonizado por foras da lei e pela constante sensação de desconfiança e perigo que pairam as relações por mais que elas sejam construídas em bases muito sólidas. Além disso, o longa possui um ritmo que não deixa sua aventura cair na exaustão, ainda que aqui e ali o espectador tenha a sensação de estar diante de um plot extremamente superficial e que a existência do longa se justifique apenas para servir como um grande fan service para a fan base da franquia.
Han Solo derrapa mesmo na indiferença que por vezes permeia a relação do espectador com seus personagens. O romance entre o protagonista e a “mocinha” de Emilia Clarke (a Daenerys da série Game of Thrones) é completamente desinteressante para o público, tendo em vista que esse tem tão viva a memória dos acontecimentos entre Han Solo e Leia, um shipper canônico na cultura pop. Além disso, no terceiro ato do longa o roteiro acaba se entregando a algumas reviravoltas óbvias para qualquer espectador mais atento e que se perdem na própria plausibilidade das suas ocorrências, ainda que elas eventualmente se justifiquem pela inclinação do longa ao western.
Como saldo, Han Solo não deixa de ser um título absolutamente supérfluo e que o seu público, fã ou não fã de Star Wars sobreviveria tranquilamente sem a sua existência, haja vista que nos quatro filmes anteriores em que o personagem aparece na encarnação de Harrison Ford seus realizadores conseguiram dar conta muito bem da tarefa de construí-lo e fortalecer os vínculos afetivos dele com o espectador. Como ele está entre nós, Han Solo é uma aventura descompromissada que carrega o espírito ingênuo que sempre permeou as histórias Star Wars desde o lançamento do filme de George Lucas em 1977. Como passatempo, certamente rende bons momentos, mas pensando “friamente” tem alguns “calcanhares de Aquiles” típicos da lógica de realização do blockbuster atual.
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