La Passion de Dodin Bouffant

52º Festival du Nouveau Cinéma de Montreal: La Passion de Dodin Bouffant

3.5

Em La Passion de Dodin Bouffant é possível ver todo o trabalho de um cineasta esforçado em trazer sua estilística para a narrativa, sendo explosivo ao criar imagens que buscam ser sutis, porém apaixonadas. Todavia, entre o seu roteiro e a sua direção, Anh Hung Tran (Amor Eterno) revela uma espécie de abismo, de complexidade contraditória. De um lado, uma dramaturgia rebuscada, progressiva, que imerge o seu espectador com cuidado, trazendo as informações e as conexões entre as personagem gradativamente. Do outro, uma decupagem quase desesperada e sufocante.

É difícil criticar negativamente esta obra de Tran, porque é notável a razão de suas escolhas para cada sequência do seu novo longa-metragem. No entanto, ainda que sejam ousadas e criativas as suas estratégias, elas tornam a sessão um tanto exaustiva. A vontade de revelar a movimentação de Dodin e Eugénie dentro da cozinha, por exemplo, poderia ser resolvida pela mise-en-scène. Todavia, Tran insiste em convocar diversas pans, múltiplos giros de câmera, que podem criar mais distanciamento das ações do que aproximação.

É inegável que Tran é um artista que entende sobre a técnica cinematográfica. A grande questão aqui é a sua vontade de mostrar este fator, pois isso soa demasiadamente pretensioso e o afasta das suas próprias escolhas em relação ao enredo. É por isso que por mais que haja uma história de amor impactante e que Binoche (Quem Você Pensa que Sou) e Magimel (Amantes) tenham um jogo de cena potente e intenso, no qual os intérpretes jogam com os silêncios e os olhares, tudo se perde na movimentação eufórica da câmera. Talvez, a palavra euforia seja o melhor termo para descrever o longa, tanto para o mal quanto para o bem. Porque é esta emoção transbordante que circunda a projeção inteira.

La Passion de Dodin Bouffant

Em termos positivos, é observável a composição do desenho de som da produção. Todos os ruídos fomentam as sensações expostas na tela imageticamente. Há aqui um foco: a paixão pela gastronomia. Os sons criam esta energia de amor carnal, sexual (ou sensual), pelo ato de cozinhar e se alimentar, que elevam a compreensão deste sentimento vivido pelas personagens. Cada “barulho” da diegese cria um significado maior e mais profundo desta dinâmica que está sendo mostrada. Neste sentido, o trabalho da fotografia também é destacável em termos de iluminação. O uso da luz neste filme não pode ser descrita por nenhum outro adjetivo que não “impressionante”.

A forma como as tonalidades e luzes combinam com as temperaturas emocionais das personagens, do calor da cozinha e do afeto pela culinária torna um tanto mais prazerosa a fruição, suavizando, inclusive, o ímpeto de Tran em imprimir tanto deslocamento de câmera. Há ainda o fato de que esta tonalidade presente em quase toda a obra se esvai nos momentos de intimidade de Eugénie e Dodin, quando há um espalhamento de ciano pelo ecrã, algo quase melancólico e de despedida, que se firma e se concretiza em seu final.

É interessante, inclusive, notar o contraponto, tanto na luz quanto no som, nos momentos de tensão sexual direta, que possui silêncios longos, sombras, menor irradiação de luminosidade com aqueles criados pelos momentos de criação e degustação dos alimentos, que possuem a energia e a estética opostas. Desta maneira, La Passion de Dodin Bouffant é dual qualitativamente. Há uma elaboração técnica e um enamoramento transbordante – pela comida ou por Eugénie? Aí, fica para quem assiste refletir –, que encanta e cativa. Ao mesmo tempo, são tantos desejos visuais prontos para criar surpresa e deslumbramento no espectador, que 2h25 de duração ficam difíceis de aguentar. Para os mais tenazes, o ingresso vale pela experiência de acompanhar o trabalho de Binoche e Magimel e de analisar a técnica visceral (mesmo que exagerada) de Tran.

Direção: Anh Hung Tran

Elenco: Benoît Magimel, Juliette Binoche, Jean-Marc Roulot

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