Acesso é um filme simples, mas que consegue cumprir o que ele, aparentemente, se propõe. Através de recursos como a mistura de imagens retiradas da plataforma Google Maps, trechos de conversas por vídeos chamadas e fotos antigas, relatos de pessoas LGBTQIAP+, moradores da cidade de São Paulo, são contados. A memória e os afetos são pontos centrais aqui. Há um tom despretensioso, que evoca uma espécie de sinceridade.
Este elemento presente na obra aproxima o público daquelas histórias. Ainda que, em um dado momento, a sessão fique um tanto cansativa, pois os recursos selecionados pela diretora e roteirista Júlia Leite se tornam um tanto repetitivos, a força da obra não se perde por completo. A tranquilidade das vozes que se entregam para o público amortecem o impacto desta estilística que pouco se renova durante a exibição.
O interesse acaba sendo mantido pelo tom das personagens e pela complexidade das temáticas que elas convocam. Enquanto assuntos como a morte de um melhor amigo ou a descoberta de não estar sozinho sendo uma pessoa queer no mundo são trazidos, a experiência se torna mais palpável quando quem assiste se depara com as imagens dos locais no mapa.
Ao se deparar com os espaços é quase como se fosse possível criar uma narrativa paralela, na qual os cenários estáticos ganham vida e são preenchidos de transeuntes em movimento. Isto que torna Acesso um tanto quanto especial. Em sua possibilidade restrita, provavelmente por ter sido gravado durante a pandemia, Leite encontra esta maneira singela de trazer enredos complexos.
O público se torna um confidente e é justamente por esta razão que a imersão acaba por ser intensa. No entanto, talvez, alguns pontos pudessem elevar a qualidade da produção. Um fator um tanto incômodo é a demora de ser colocado o primeiro rosto de personagem na tela. Nos quatro primeiros minutos de projeção, há apenas a visualização do maps.
Isto pode acabar provocando certa confusão em compreender que serão múltiplas narrações. Há de se tomar um tempo para notar a modificação da voz 01 para a 02, o que enfraquece essa conexão, que acaba por ganhar forma já na metade do curta-metragem. Ainda assim, no geral, o documentário apresenta um resultado equilibrado e contem estratégias criativas.
Na imensidão de São Paulo, nos encontros, medos, alegrias, semelhanças e diferenças da população LGBTQIAP+, um caminho coeso é traçado em Acesso. Além disso, a pluralidade da comunidade é mostrada, através de diferentes integrantes da sigla, mas, ao mesmo tempo, os sentimentos ali impressos possuem uma unidade. A forma como Júlia Leite mescla as duas coisas, faz com que o alcance do curta seja maior e mais rico.
Direção: Júlia Leite