John Carpenter é sorrateiro quando o assunto é esconder os momentos de virada em seus filmes. É sempre surpreendente acompanhar quem será a primeira vítima, quais os destinos de suas personagens e até onde vai a força da figura ou situação sobrenatural. Para realizar tal intento, Carpenter joga com as dinâmicas rítmicas, estendendo e encurtando as situações narrativas.
Príncipe das Sombras é um exemplar desta característica do cineasta. Utilizando um prólogo extenso, coberto de introduções, pistas e uma música incidental insistente, o espectador pode ser perguntar quando virá à tona o pavor ou as tensões. Contudo, o diretor utiliza este momento para captar a atenção do público e deixar marcados os traços de personalidade das personagens, bem como o perigo iminente que está por vir.
A progressão aqui funciona de um jeito, talvez, específico. Ao invés de subir a suspensão, o susto e o pavor lentamente, aqui, existem blocos de viradas, que possuem um aumento do nível dos conflitos das situações. O tom, em cada plot twist, cresce, fomentando a atmosfera do filme. Há o momento de elaboração de universo ficcional, a chegada à antiga igreja, a descoberta do poder do cilindro encapetado etc.
Desta maneira, é por isso que o início da projeção se faz tão importante. Pois, não há retorno para investigar as relações, somente caos que se eleva até o seu clímax. Neste sentido, a decupagem contribui para fomentar o clima de medo e extrapolação do real, advindos do longa-metragem. Os planos tomam seu tempo e deixam que quem assiste observe as emoções das personagens, enquanto elas se deparam com fatos completamente assustadores. Acompanhar estas reações, mais do que os ataques, faz com que o que está por vir seja menos previsível. Neste sentido, também é importante apontar a coragem de Carpenter aqui em Príncipe das Sombras.
Não há uma palavra melhor do que “insana” para descrever a premissa da trama, bem como o seu desenvolvimento. O risco em colocar uma possessão que acontece por meio de um vômito de gosma, insetos que se espalham pelo espaço e zumbis endemoniados é alto. Mas, é através da repulsa que Carpenter direciona o seu terror aqui. Seja nas modificações de como essa rajada de líquido será disparada ou como os bichos vão se proliferando e se tornando maiores etc, os limites situacionais vão sendo ultrapassados, para que as personagens se vejam em momentos de horror e choque. Esta construção deixa a sessão cada vez mais provocativa e forte.
E a força das sensações transmitidas vem também da interpretação do elenco, principalmente do ator Jessie Lawrence Ferguson (Tudo em família). O seu trabalho de ator, que perpassa não apenas pelas intenções conscientes de texto, mas também de movimentação e tônus corporal, entregam as cenas mais horripilantes da obra. O que eleva esta potencialidade é a transformação de seu Calder, que vai de um homem pacífico e tranquilo, para um possuído ser, cheio de sarcasmo e poder de perseguição.
Príncipe das Sombras se faz, assim, como um perturbador título de seu gênero. Com coesão e uma tecnicidade em função de provocar sentimentos profundos no público, ele consegue impactar, mesmo depois de tanto tempo de seu lançamento (1987). Ainda que demore um pouco para engatar, quando o mesmo ocorre, é possível compreender porque segurar tanto para iniciar as sequências de medo.
Direção: John Carpenter
Elenco: Donald Pleasence, Lisa Blount, Jameson Parker
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