Ainda Somos os Mesmos

Festival Cinepe 2023: Ainda Somos os Mesmos

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Procurando contar uma história tensa, de um período difícil para o Brasil e toda a América Latina, Ainda Somos os Mesmos parece ser bem intencionado, mas falha ao não conseguir entregar a obra que a própria trama original merecia. Baseando-se nos 42 dias que João Carlos Bona Garcia passou na embaixada da Argentina no Chile, durante a ditadura de Pinochet, é possível perceber que há uma tentativa forte de emocionar e atingir a mente plateia com um discurso político potente.

A vontade de impactar o público, para lembrar a todes que a democracia não é algo dado como eterno e invencível, mas algo que pode ser perdido a qualquer momento, existe uma criação sombria e melancólica criada dentro da narrativa. No entanto, a técnica falha ao não saber como criar, verdadeiramente, tensão em uma obra.

A começar pela ideia de ritmo. Esta que vos escreve é insistente em explicar em críticas diversas a falsa ideia que perambula a mente da sociedade de que ritmo é velocidade acelerada. Ora, ritmo nada mais é do que equilíbrio, não apenas de velocidade, como de tom da cena — recomendo a leitura do livro Ritmo e dinâmica no espetáculo teatral, de Jacyan Castilho.

Assim, o longa-metragem, de Paulo Nascimento, tem em seu maior pecado a ausência de respiros e de dosagem desta tonalidade. Se o tempo inteiro alguém grifa uma emoção, esta emoção se esvai porque é como se a mesma não estivesse grifada. Neste sentido, a música é um dos elementos que mais contribui para esta ausência de ritmo.

A mesma sonoridade é repetida desde o início da projeção e está sempre presente, em qualquer ação das personagens, diluindo o impacto do que é colocado na tela. Além disso, a equipe de arte, juntamente com o diretor de fotografia, falhou na criação da unidade visual. Ainda que seja possível perceber que há um desejo em mostrar este Chile abalado e esta embaixada soturna, existem dissonâncias no que eles mesmos criaram.

Um exemplo é uma sequência que o ator Edson Celulari está em um quarto com uma paleta de verde que foge completamente dos outros tons que aparecem na exibição inteira. Para piorar a situação da equipe, é perceptível a troca de luz na mudança ou transição de alguns planos. Existem três possibilidades aqui: erro de continuidade na hora da captação da imagem, problema na sala de edição quando foram fazer a correção de cor ou ambos.

E não é apenas a temperatura que muda de quando em quando na mesma cena que incomoda. A montagem é também um dos pontos mais frágeis do filme. O raccord é totalmente ignorado e esquecido no churrasco e não é nem propositalmente. Falta fluidez na condução da passagem de cena. Mesmo que exista elipse temporal, é preciso lembrar que os cortes descontínuos podem contar com uma estrutura amarrada.

Por fim, dentro das questões negativas, há o fato de que as atuações não são das melhores. Há um exagero na construção dos papéis, que não são estudados e tridimensionais, mas representações que habitam o imaginário do senso comum. Todavia, o elenco não está ruim, em um sentido geral. Alguns momentos, como na cena de um parto que o protagonista faz, os intérpretes demonstram talento e entrega.

A grande questão de Ainda Somos os Mesmos é que falta algo para uma boa condução técnica. Nascimento é um cineasta experiente, porém seu novo projeto é verde, ingênuo e fraco. No entanto, é necessário salientar dois pontos. Apesar de seus defeitos operacionais, esta é uma obra que dialoga com um consumidor geral, por possuir momentos que podem emocionar e enganchar a atenção da plateia.

O que nos leva ao segundo ponto! Ao observar a história do mundo, mas principalmente no Brasil, que é de onde este longa sai, a certeza da permanência da democracia nunca existiu e deixar registrado no cinema um momento difícil e criminoso que foi a Ditadura militar no Brasil, mas também no Chile, faz com que seja relevante assistir a sessão. Não é um bom filme, porém o acontecimento em si que é ali narrado é absurdamente importante de ser visto.

Direção: Paulo Nascimento

Elenco: Lucas Zaffari, Edson Celulari, Carol Castro

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