É irônico que um filme como essa comédia romântica argentina chegue no Brasil com o título Roteiro de Casamento. Irônico porque um dos elementos mais frágeis desse título é justamente… o seu roteiro. Reclamamos tanto que o nosso cinema anda produzindo compulsivamente esse tipo de comédia estandardizada e que em absolutamente nada acrescentam ao espectador, nem mesmo a esperada e louvável função do entretenimento, que esquecemos de olhar para as produções de países como a Argentina e a França, cujos títulos ganham instantaneamente uma fama de “cinema de qualidade” antes mesmo que o espectador os assista e que também possuem as suas “bombas” popularescas. Roteiro de Casamento é tão ruim ou pior do que muitos títulos populares que ganham o selo Globo Filmes em nosso país, algo que muitas vezes, injustamente, acaba sendo sinônimo de produções de gosto duvidoso no Brasil. Como a maioria dos filmes ruins, Roteiro de Casamento é falho não por vincular-se a um determinado gênero ou por procurar compulsivamente agradar um nicho mais amplo do público, mas porque é uma obra mal estruturada e que não está à serviço nem mesmo dos seus propósitos comerciais.
Conduzido por Juan Taratuto, que, curiosamente – e não por acaso – dirigiu anos atrás Um Namorado para minha Esposa com o mesmo casal de protagonistas desse título, Adrián Suar e Valeria Bartuccelli, Roteiro de Casamento inicia sua história com o retorno de um astro do cinema argentino ao seu país para protagonizar um novo filme ao lado de uma atriz pouco experiente. Logo esse ator se apaixona pela sua parceira de cena e eles se casam, dando início a um casamento acompanhado cotidianamente por paparazzis e noticiários nacionais de celebridades. Acontece que essa constante presença dos holofotes na vida privada do casal é alimentada por ele e sua esposa começa a se incomodar com a situação, percebendo a cada dia que se casou com um ególatra. A par da situação, ele resolve pedir a um amigo roteirista que crie um personagem para que consiga mostrar para a amada que no dia-a-dia não é tão narcisista assim.
A premissa de Roteiro de Casamento renderia até uma comédia interessante, nada inventiva, é verdade, mas com um terreno fértil para explorar situações atuais sobre esse universo da hiper-exposição das celebridades em circunstâncias nas quais a discrição deveria ser mais prudente, como a rotina de um casamento, por exemplo. Acontece que o longa não utiliza tal premissa para realizar uma obra com o mínimo de brilho ou que mantenha o interesse do espectador no seu desenlace, tampouco faz com que o mesmo se interesse pelos conflitos do casal central ao longo de toda narrativa. O que se vê é um amontoado de situações esdrúxulas e banais, emuladas de outros tantos filmes que talvez tenham explorado melhor a mesma temática, de cara, me lembro de Os Queridinhos da América com Billy Crystal, Julia Roberts, Catherine Zeta-Jones e John Cusack. O diretor Juan Taratuto não explora os potenciais de metalinguagem que o filme proporciona, ainda que demonstre aqui ou ali um certo interesse por tirar o longa do terreno da incipiência criativa que predomina no decorrer de toda a projeção, que dura longuíssimas (nesse caso, por incrível que pareça, podemos usar esse adjetivo) uma hora e quarenta minutos.
Para completar, há ainda Adrián Suar que, na pele do seu protagonista, mostra-se completamente canastrão e só consegue sustentar sua presença em cena graças aos esforços da sua parceira de tela Valeria Bartuccelli, que, inesperadamente, no terceiro ato, lida com uma estapafúrdia enfermidade que o roteiro do longa cria como gancho para o seu desfecho mas que revela-se absolutamente aleatória na história. O curioso é que, no filme, com toda a sua alardeada experiência internacional ao lado de figurões do cinema americano como Brad Pitt e Francis Ford Coppola e sua passagem pelo Actor’s Studio, o personagem de Adrián Suar representa a parte do casal com talento para a interpretação e sua esposa Florencia é que é a canastrona. Na “vida real”, o que ocorre é o contrário.
Banal, problemático em sua estrutura, na articulação dos ganchos de sua narrativa e na sua própria encenação, Roteiro de Casamento é a prova de que o público deveria parar de fazer determinadas associações lógicas, como, por exemplo, “O Brasil deveria fazer mais filmes nos moldes do cinema argentino”. Cinema ruim tem em toda e qualquer cinematografia, brasileira, francesa, argentina, americana etc. Basta displicência, um amontoado de decisões equivocadas e a ignorância da inteligência alheia. A fórmula é essa, com suas possíveis novas configurações em cada caso, e material humano disposto a patinar nesses equívocos existe aos montes e vem de tudo quanto é lugar.