Logo quando saíram as primeiras imagens, teasers e trailers do reboot de Quarteto Fantástico, a primeira impressão que tivemos sobre o trabalho do diretor Josh Trank (de Poder sem Limites) era a de que ele estava levando a popular família de super-heróis da Marvel para um terreno mais sombrio e sério, ou seja, algo bem diferente do tom bem-humorado dado por Tim Story em Quarteto Fantástico (2005) e Quarteto Fantástico e o Surfista Prateado (2007), que, apesar das duras críticas, dizem alguns (não conheço bem as HQs), estava mais próximo do espírito dos personagens. O que a gente não esperava era que esta releitura (prefiro chamar assim) da abordagem de Quarteto Fantástico fosse o menor dos problemas já que o primeiro ato até funciona e promete entregar um filme, no mínimo, promissor. Os problemas do longa surgem quando o elemento “fantástico” entra em ação e Trank e seus co-roteiristas (entre eles Simon Kinberg, de X-Men – Dias de um Futuro Esquecido) não conseguem lidar com o “arroz e feijão” das histórias de super-heróis, transformando-o em uma sobreposição de clichês constrangedoramente cafonas.
A trama de Quarteto Fantástico traz a já conhecida origem dos heróis, aqui, quatro jovens enviados em uma missão fora da Terra. A expedição dá errado e eles retornam com alterações no próprio corpo: Reed Richards (Miles Teller, de Whiplash) ganha elasticidade, Sue Storm (Kate Mara, de Transcendence) pode tornar-se invisível e criar campos de força, o irmão dela, Johnny Storm (Michael B. Jordan, de Fruitvale Station), passa a ter o corpo coberto por chamas, e Ben Grimm (Jamie Bell, o eterno Billy Elliot), amigo de infância de Reed, transforma-se em um gigante rochoso apelidado de Coisa. Suas novas características, inicialmente encaradas como deformidades a serem curadas com a ajuda do próprio Reed Richards, passam a lhes ser úteis no enfrentamento de um grande vilão, o Doutor Destino (Toby Kebbel, de O Conselheiro do Crime), um companheiro de expedição que não retornou da viagem e tinha sido considerado morto por todos.
Funcionando como um recomeço da franquia nos cinemas, Quarteto Fantástico tenta alterar tudo aquilo que havia sido criticado na série de filmes anterior e que, curiosamente, a tornava singular em meio a um universo de super-heróis cada vez mais sisudos (uma conclusão que só cheguei com o tempo e a maturidade). O novo Quarteto Fantástico é mais sombrio e sério sim, mas evoca uma complexidade e densidade dramática que fica apenas no discurso e no seu visual. O roteiro de Josh Trank, Simon Kinberg e Jeremy Slater nunca conseguem ir além nos temas que sugerem no primeiro ato e que até parecem promissores, como a forte amizade entre Richards e Grimm, a relação amorosa de Richards e Sue Storm e os conflitos de Johnny Storm com o seu pai, o Dr. Franklin Storm.
Quando os personagens ganham poderes, então, o filme se revela um verdadeiro projeto mal sucedido, para não dizer o pior. Trank e seus roteiristas simplificam as emoções dos seus personagens e suas dinâmicas são recheadas por clichês do sub-gênero “filmes de super-heróis” materializados no pior personagem de todo o longa, o Dr. Destino, péssimo não apenas na sua caracterização como incômodo em seus propósitos e motivações simplistas. Destino é reduzido ao lugar-comum de um vilão interessado em destruir o mundo, algo que lhe é motivado pela vontade de se isolar de todos e expresso por frases que parecem soltas de um seriado animado de super-heróis genérico. Do aparecimento ou ressurgimento do vilão em diante, os protagonistas do longa são consumidos pelo mesmo tom canastrão presente em toda participação de Destino, até mesmo a morte de um personagem importante, e que poderia ser o cume dramático do longa, é tratada com o tom de uma novela mexicana e a frivolidade de um filme antiquado de ação.
A impressão que fica é que existiu o toque impertinente e equivocado de um estúdio sempre interessado em simplificar tudo através de uma subestimação da inteligência e do gosto do seu público, mas isto é só especulação de quem já assistiu esta novela se repetir em tantos outros longas promissores e que mudam de tom da água para o vinho no meio do caminho. O que quer que tenha acontecido no processo de concepção do novo Quarteto Fantástico, o que fica é uma promessa abandonada precocemente para abraçar um amontoado de cafonices que já foram superadas, não cabem mais nos exemplares da temporada de blockbusters e que só mancham a credibilidade tradicionalmente questionada deste tipo de produção.