Sempre que na temporada de premiações surge um candidato aos prêmios de atuação como Gary Oldman em O Destino de uma Nação, um ator cultuado como (e esnobado em premiações), interpretando um personagem real devidamente auxiliado por um trabalho aplicado de maquiagem, o favoritismo é instantâneo, assim como uma certa dose de torcidas de nariz de colegas da crítica ou da cinefilia (é sempre “chic” se mostrar opositor do Oscar em certas circunstâncias). Oldman vem de fato despontando como favorito a prêmios (junto com o novato Timothée Chalamet de Me Chame pelo seu Nome) e há méritos por parte do próprio ator, soberbo no papel do ex-primeiro ministro britânico Winston Churchill, da direção de Joe Wright e da equipe de maquiagem do longa, que auxilia o protagonista na composição física do seu personagem. Contudo, para além dos holofotes em Oldman, O Destino de uma Nação é um ótimo filme.
No longa acompanhamos os eventos que marcaram os primeiros dias de Churchill como primeiro ministro num momento crucial na história da ilha, quando os alemães avançavam e parte do parlamento estava inclinado a aceitar negociar um acordo de paz com Hitler nos primeiros anos da Segunda Guerra Mundial. Churchill cria um grupo composto por políticos de diversos partidos a fim de encontrar uma solução democrática para o cerco que se fechava contra a nação. No entanto, diferente de seus opositores, Churchill acreditava que a resistência à Alemanha seria o caminho mais recomendável.
Um dos feitos mais admiráveis de O Destino de uma Nação é seu posicionamento diante do protagonista que procura retratar, Winston Churchill. Em momento algum transformado num herói ufanista, ainda que seus realizadores, em especial o diretor Joe Wright, pareçam ter uma clara admiração pela sua personalidade política, o protagonista de O Destino de uma Nação é um homem que tem as suas falhas de personalidade, exitações e medos diante de situações que exigem dele um posicionamento enérgico. Churchill não é retratado como uma figura política carismática e de caráter irretocável (como Abraham Lincoln em Lincoln de Steven Spielberg, por exemplo), mas como um homem comum que assumiu o posto de primeiro ministro britânico num momento muito delicado e que exigia sangue frio e pulso firme. Eis um dos grandes acertos do filme de Joe Wright.
Wright consegue dimensionar o personagem em três frentes: sua personalidade pública, quando Churchill toma a voz em seus discursos políticos e mostra-se enérgico e cheio de retórica; na vida privada, os instantes em que o protagonista demonstra suas inseguranças e ansiedade ao elaborar decisões que põem em risco sua imagem pública já abalada por uma trágica decisão política tomada anos atrás; e nas artimanhas de bastidor, onde o personagem demonstra o feeling para fazer as articulações e buscar as melhores estratégias a fim de convencer seu público, como quando se apropria do olhar da população para a guerra num inesperado passeio de metrô.
A interpretação de Gary Oldman é fundamental para o filme já que o ator se dedica a uma composição física, desaparecendo no personagem com os quilos de maquiagem no seu rosto, mas também em todo o trabalho de postura corporal e entonação de voz que traz para sua performance, mas o veterano é sublime também na construção da personalidade dessa figura pública que foi Winston Churchill. Em pé de igualdade com o ator está Stephen Dillane, que vive Viscount Halifax, principal opositor de Churchill, estabelecendo sempre um interessante duelo de personalidade quando enfrenta Oldman em cena, assim como nas articulações políticas de bastidor que seu personagem promove para minar as chances de êxito do protagonista. Completam o elenco, Kristin Scott Thomas, Lily James e Ben Mendelsohn, todos muito bem, mas sem destaque acentuado.
Driblando as armadilhas das biografias de políticos e o próprio magnetismo da performance do seu protagonista, O Destino de uma Nação nos oferece uma versão daquilo que se desenrolou nas conversas de gabinete e influenciaram os eventos que vimos em Dunkirk de Christopher Nolan com o resgate dos soldados britânicos da baía de Dunquerque na França. No entanto, diferente do seu rival na temporada de premiações, O Destino de uma Nação sabe dimensionar o seu caráter humano, demonstrando que por trás dos atos históricos existem pessoas. Méritos do seu diretor, Joe Wright.
Joe Wright sabe como tornar o “disse me disse” dos bastidores do poder minimamente interessante para plateias que gostam do tema e para aquelas que são pouco familiarizadas com o mesmo, sabendo lidar com a frieza e pragmatismo desses ambientes burocráticos, mas também com as emoções exacerbadas e as tensões que surgem nos seus bastidores. Sem a poesia visual e o romantismo de alguns de seus melhores filmes, como Desejo e Reparação, Orgulho e Preconceito e Anna Karenina, o cineasta faz um trabalho menos carregado de tintas, coerente com as ações discretas dos seus personagens.
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