Herege

Crítica: Herege

2.5

Depois que Hugh Grant juntou a sua preguiça de atuar com uma aura de misantropia suas personagens cresceram e ganharam uma qualidade de organicidade e profundidade. Este é o caso de seu novo papel, Mr. Reed. Brincando com o colorido do texto, indo de vozes aveludadas para o grave, entre amável e cruel, Grant é o triunfo de Herege. No entanto, mesmo com toda a sua presença e habilidade de atuação, o longa-metragem falha em estabelecer uma dinâmica rítmica favorável.

Com uma narrativa previsível, o estabelecimento de tensão se esvai por conta desta inabilidade em construir um enredo criativo. A premissa se baseia em mostrar quando duas meninas crentes vão evangelizar um psicopata (Grant). Quando elas entram na casa dele, ficam trancadas na residência para serem torturadas mental e fisicamente. No entanto, não há um estabelecimento de empatia para com as jovens.

Se o espectador não torce para que as personagens principais sobrevivam, já há um problema com essas obras. Apesar de tentarem complexificar a dupla, deixando com que a menina que parece mais boba ser mais esperta, a tentativa é ingênua. Além disso, o trecho prévio à entrada das garotas na casa perigosa de Grant não é usado para essa conexão da plateia com elas.

Os diálogos são rasos e cotidianos demais para quem está apresentando os papéis principais da trama. A conversa entre Sister Barnes (Sophie Thatcher), Sister Paxton (Chloe East) e Mr. Reed não avança muito. Há uma volta enorme no roteiro para tentar alavancar um mistério que não cola, que seria “quem é esse homem e por que ele está torturando estas meninas?”

A razão poderia ser a última coisa e o processo de instalação de atmosfera poderia ser feita através dos silêncios, dos movimentos do elenco em cena e da própria câmera. Desta maneira, roteiro e direção de Scott Beck e Bryan Woods — autores de Um Lugar Silencioso —  conseguiriam trabalhar o relacionamento do trio mais do que com este suposto teor místico de Reed, que é posto em dúvida durante boa parte da exibição.

Herege

Nem mesmo a música incidental ajuda na produção de efeitos de suspense e terror de Herege. Um tanto apagada, até a banda sonora soa genérica e óbvia, deixando uma sensação de que já fora ouvida antes em algum outro filme e quem assiste consegue antecipar os que virá em seguida, mais do que ficar tenso com a musicalidade. Na realidade, todos os recursos sonoros do longa se encaixam nessa lógica. 

O desenho de som de uma obra de terror precisa ser olhado com cuidado e atenção. Mas, há algo frouxo aqui, mas que fica em uma categoria de um quase alcança. Porque o filme não é exatamente ruim. Há uma tentativa de usar artifícios do gênero para segurar a atenção do público e conectá-lo com a história. Talvez, a grande questão seja que Scott e Bryan não acertem o quando convocar essas convenções para as cenas.

Um exemplo pode ser o jogo com a repulsa. Quando esta dinâmica é apresentada em quadro, a impressão é de esta chega tardia, pois as personagens já estão no auge do estresse e pânico. Algum elemento deveria ter sido inserido antes, neste sentido. Assim, é como se blocos discursivos e estilísticos fossem lançados no ecrã sem grandes coesões.

Contudo, Herege ainda pode ser considerada uma boa experiência justamente pelo trabalho de Hugh Grant. O seu vilão não é o mais bem escrito do cinema, mas carrega dignidade, não apenas pela atuação consciente — corporal e vocalmente — de Grant, mas pela própria escrita de suas falas. Reed é o único ponto interessante e instigante da produção, porém já o suficiente para render um boa sessão.

Direção: Scott Beck, Bryan Woods 

Elenco: Hugh Grant, Sophie Thatcher, Chloe East

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