Certas Pessoas

Crítica: Certas Pessoas (Netflix)

3.5

Entre falhas e acertos, a nova comédia romântica da Netflix consegue entregar como resultado um filme, majoritariamente, divertido e que conta com um ship central com muita química. A maior questão de Certas Pessoas é que, dentro do grande desafio de, a partir de todas tensões presentes em seu tema central permanecer sendo uma comédia, a atmosfera pesa. Além disso, a resolução soa como repentina demais. É neste universo que o longa-metragem traz Ezra e Amira, um casal que se apaixona tão profundamente que decide se casar.

Todavia, Amira é negra e Ezra é branco e os conflitos por conta disso acabam surgindo para ambos. Aqui, vale ressaltar que por mais que a obra tente colocar a balança no meio, por trazer a figura de Akbar, pai de Amira (Eddie Murphy, Meu Nome é Dolemite), como desconfiado e Shelley, mãe de Ezra (Julia Louis-Dreyfuss, Dois Irmãos: Uma Jornada Fantástica), como sem noção, a temática do filme não é qualquer querela trivial típica de romcoms. O ponto tocado aqui é grave e profundo. Não tem como equilibrar estas duas figuras.

Ainda assim, mesmo que tropeçando neste quesito, a produção leva o fato de que a dupla principal está em um namoro interracial a sério. Inclusive, a partir do terceiro ato o tom da seriedade se eleva tanto que, mesmo sendo à toa, é neste ponto que a obra se perde e se apressa. Se Ezra e Amira iriam ou não terminar juntos não era o que realmente importava, no final das contas. O como a narrativa traria essa escolha dentro da sua conclusão era a chave de tudo.

Dentro deste contexto, o que acontece com Certas Pessoas é o que acaba aparecendo em muitos filmes do gênero: conclusão repentina com solução simples.  De repente, todos os problemas se dissolvem. Shelley ganha um letramento social instantâneo e Akbar vê que, na verdade, apesar de Ezra ter diversos comportamentos que o incomodam, ele é um homem bom para a sua filha. Assim, em três cenas, o que foi construído de tensão, progressivamente, com estabelecimento de uma incompatibilidade tão intensa que o rompimento dos protagonistas é determinado, desaba para dar espaço ao casamento alegre dos dois.

Certas Pessoas

É um tanto desagradável acompanhar esse encerramento? É. Todavia, também vale ressaltar que boa parte da sessão diverte e conta com diálogos engraçados. Uma grande qualidade do longa vem do trabalho do elenco. Os dois núcleos contam com interpretações que convocam organicidade para um texto que poderia cair em algo artificial e morno. O maior exemplo disso é na sequência do jantar, no qual as mães e os pais de Amira e Ezra discutem sobre um assunto delicadíssimo.

Ainda que seja óbvia a resposta para o dilema posto à mesa, os atores conseguem, dentro de todo constrangimento que as ações e falas podem causar no espectador, imprimir comicidade. A movimentação corporal é mínima ali, mas ela também entra para fomentar a lógica cômica. Esta contenção, na verdade, preenche toda a sessão, mas de uma forma positiva. Isto porque os instantes fortes para a trama ganham mais força e geram risos maiores, quando há uma seleção maior do que ganhará destaque na narrativa.

Esse mérito vem também do roteiro de Kenya Barris – que também é o diretor – com Jonah Hill (Não Olhe Para Cima), porque a montagem e as inserções gráficas quebram um pouco do ritmo e do estabelecimento da própria conexão do público com as personagens. Em alguns momentos, certas emoções são perdidas, pelas quebras da edição, que são seguidas desta espécie de vinheta, que ronda o longa inteiro. Apesar de tudo, isso não é algo que compromete tanto quanto a finalização da narrativa, mas que poderiam ser elementos melhor executados.

Assim, Certas Pessoas vale por entreter ali em suas quase duas horas. Poderia ser melhor? Sim, porém na maior parte de sua duração ele é efetivo.

Direção: Kenya Barris

Elenco: Jonah Hill, Lauren London, Eddie Murphy, Julia Louis-Dreyfus, Nia Long, David Duchovny, Sam JayMolly Gordon

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