Se fosse necessário resumir Barba, Cabelo e Bigode em poucas palavras, talvez elas fossem as seguintes: uma grande bagunça divertida, mas necessária. Mas, por qual motivo o longa-metragem de estreia do diretor Rodrigo França é de certa forma relevante? A resposta aqui tem a ver com uma questão de representatividade. Sim, cinema não se faz apenas de discurso e é necessário equilibrá-lo com a técnica do audiovisual. Todavia, esta que vos escreve acredita que todes têm o direito de ter todos os tipos produções para para chamar de suas, inclusive as farofas.
E é neste contexto que o filme se faz e prende a atenção do espectador, seja pelo tom bastante brasileiro das piadas e da construção das relações ou por apresentar uma ambientação leve do cotidiano de uma favela carioca. Obviamente que a arte precisa tensionar problemáticas estruturais da política e da sociedade como um todo, porém também é fundamental colocar alguns corpos e imagens, que sempre estão em lugares não violentos e/ou trágicos, em outros locais.
Toda esta introdução é para dizer que apesar de diversas falhas de roteiro, atuação e montagem, o longa cumpre uma das funções básicas da comédia: fazer rir. O maior mérito para tal conquista é o carisma de Lucas Penteado (Malhação), que mesmo com irregularidades em sua interpretação, deixando o seu corpo e o tom da sua fala artificiais, consegue despertar empatia e fazer com que o público torça pelo o sucesso de seu Richardsson. Mas, quem eleva a qualidade da obra de fato é Solange Couto.
A atriz dissolve a escrita trucada e caricata de seu texto, deixando diálogos bobos orgânicos, como na sequência na qual ela troca nudes com um paquera ou quando a sua personagem narra o seu passado. Ambas as cenas possuem frases não tão naturais, mas com pausas e respiração Solange imprime fluidez para a sua Cristina. No entanto, existe uma demora para que a imersão na história aconteça justamente pelas derrapadas técnicas. Os recursos da narração e da quebra da quarta parede são constantes demais.
Assim, ao invés disto aproximar o público da trama, retira a conexão com as situações que estão sendo mostradas ou subestima quem assiste, pois traz explicações desnecessárias. Um exemplo são os encontros de Richardsson com sua crush. Penteado sempre olha para a câmera e faz um comentário quando a garota vai embora. Esta estratégia não funciona aqui e não é engraçada, porque a dinâmica começa a acontecer já no início da projeção, quando ainda não foi estabelecida a aproximação do público com o enredo. Desta forma, é possível perceber neste exemplo como que o roteiro não foi estruturado para apresentar coesão ou um sentido interligado.
Na verdade, a sensação que a produção passa é a de que elus queriam colocar elementos, situações, textos e momentos específicos, por isso juntaram todos eles em um só filme. Mas, na verdade, para um projeto artístico funcionar primeiro você precisa entender o que ele é e depois escolher os caminhos, os efeitos e seleções que irá utilizar. Neste sentido, outros pontos que entram nesta lógica são montagem, edição e mixagem de som.
Os cortes picotam a narrativa e as inserções sonoras são abruptas. Não há um problema em si em nenhuma tentativa de fugir do padrão técnico cinematográfico, mas para isso é necessário que haja intencionalidade e que isto seja feito de tal modo que não comprometa a qualidade da obra. Aqui, o que ocorre é um estranhamento, principalmente com as subidas e descidas das músicas, nas passagens de cena. Por este motivo, Barba, cabelo e bigode é um material desconexo e que toma um tempo longo para fisgar sua audiência. Mas, ainda assim, ele vale a pena por conseguir criar situações cômicas, por entregar um cenário tranquilo e cotidiano para pessoas negras e por conquistar o espectador, mesmo que seja apenas pelo caminho da empatia tardia pelo protagonista e sua família.
Direção: Rodrigo França
Elenco: Solange Couto, Lucas Penteado, Juliana Alves
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