Crítica: Anos 90

O ator Jonah Hill estreia como diretor no longa Anos 90, que, segundo ele, traz muito da suas experiências na infância e pré-adolescência. Ele também é responsável pelo roteiro do longa, que fala sobre a descoberta de um novo mundo para um jovem na década de 1990.

Sunny Suljic (O Sacrifício do Cervo Sagrado) é Stevie, um jovem de 13 anos que se divide entre os problemas familiares e as aventuras e descobertas que vive ao lado de um grupo de skatistas durante um verão em Los Angeles.

O mote principal da história é a descoberta de si próprio do protagonista, que passeia por diversos sentimentos e emoções para ser aceito por aqueles que admira e se sentir minimamente pertencente àquele mundo. É muito fácil se identificar com Stevie, mesmo que ele tenha uma realidade não tão comum para todos. Fruto de uma família sem lastro emocional, uma mãe jovem que não dá suporte para o garoto e um irmão agressivo, ele busca na rua tudo aquilo que não tem em casa.

As experiências que ele vai vivenciando a partir do envolvimento com o grupo de skatista molda toda sua personalidade, ainda volúvel. Os garotos são um pouco mais velhos que ele, em torno de 16 e 17 anos, mas isso é um diferença imensa nesta idade. Eles já sabem de coisas que Stevie nem imagina e não têm a inocência do protagonista.

O grupo é diverso, marcado pelo privilegiado que se “revolta” contra a sua própria condição e decide transgredir as regras; o deslocado que está lá apenas para ter com quem sair; o garoto que também quer se sentir pertencente à algum lugar, já que tem uma mãe drogada e violenta em casa; o líder admirado, que é fruto de uma realidade mais hostil e tem a consciência de que precisa buscar um futuro melhor para si.

Todos querem ter o seu nível de importância no grupo, que vai se dando a partir de nomes e apelidos. Além disso, o próprio skate representa uma ascensão social, passando também pela forma como se vestem. Enquanto lida com a carência afetiva do lar, Stevie encontra no grupo a espécie de família possível e improvável. Começa a experimentar frutos proibidos, como drogas, álcool e sexo. Tudo isso enquanto mantém seu tom infantil e sorriso ingênuo.

Jonah vem de um crescimento justo na carreira. Além de se firmar cada vez mais como ator, a exemplo de Django Livre e O Lobo de Wall Street, ele já assinou ótimos roteiros, como é o caso de Anjos da Lei e Festa da Salsicha. Chegando pela primeira vez na direção de um longa, ele não fez feio. Mostrou que o mesmo apreço que tem pela comédia, atuação e roteiro, ele pode ter pelo cargo de diretor. Cuidadoso, meticuloso e sensível, conseguiu nos apresentar um trabalho aparado e maduro, digno de alguém com mais experiência na área.

Ele faz uso de câmeras e técnicas que fazem com o que o filme não seja apenas sobre os anos 90, como pareça que pertence a ele. Técnicas de envelhecimento do material, evitando o uso de tecnologia atual e tornando a experiência muito mais de imersão para o espectador. Ainda assim, tudo isso acontece de maneira natural e orgânica, sem parecer que há um esforço por parte do roteiro de causar certa nostalgia no público.

A escolha de elenco foi acertada, especialmente quando falamos de Ray, interpretado pelo novato Na-kel Smith. Ele segue a ideia de líder paternal e nos apresenta cenas importantes com ótimos diálogos. Uma excelente estreia nas telonas. Temos ainda Lucas Hedges (O Retorno de Ben) e Katherine Waterston (Animais Fantásticos e Onde Habitam), no papel de irmão mais velho e mãe do protagonista. Embora tenham pouco espaço na trama (o objetivo é esse), eles representam um contra-ponto importante às inconsequentes descobertas do grupo de garotos.

Anos 90 é um filme que representa a transformação de uma criança em jovem, a descoberta de sua sexualidade, através de experiências vividas com um grupo de amigos inconsequentes, mas que acabam se tornando sua família e “lar seguro” (emocionalmente). Jonah Hill nos apresenta um trabalho cuidadoso e audacioso, com excelente resultado em tela. Vale a pena conferir!

Direção: Jonah Hill
Elenco: Sunny Suljic, Katherine Waterston, Lucas Hedges, Na-Kel Smith, Olan Prenatt, Gio Galicia

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