Levante

52º Festival du Nouveau Cinéma de Montreal: Levante 

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Entre repetições discursivas, narrativas e imagéticas, a diretora Lillah Halla parece tentar imprimir sua marca autoral e fazer certos debates políticos avançarem. Há em seu intento sucessos e falhas. De um lado, o público se depara com uma história já muito conhecida em outros títulos voltados para jovens: a gravidez na adolescência. Este é um grande medo das mulheres (com toda razão) e que aparece aqui como em diversas outras obras. 

Para tratar do tema, o espectador também se depara com uma estratégia também já tão conhecida e repetida que é a de criar uma torcida para os “underdogs”. É como se Barrados no Baile (1990) encontrasse Nós Somos os Campeões (1992) e fosse adicionada a esta mistura uma pitada de 2023, com grupos minoritários em pauta e o voilá: Levante. Todavia, estes detalhes não são algo negativo, que vão exatamente comprometer o resultado total do longa a ponto de torná-lo ruim.

Apesar de possuir uma trama óbvia, na qual sequência após sequência é fácil saber o que irá acontecer em seguida, existem elementos que tornam a sessão prazerosa. A questão da representação e da representatividade é feita de uma forma poderosa, cuidadosa e respeitosa. A noção de mulheridade plural está viva e transborda na tela. Um dos pontos altos desta lógica é a relação das integrantes do time de vôlei, do qual a protagonista Sofia (Ayomi Domenica Dias) faz parte, com a treinadora.

Primeiramente, a coach Sol é ninguém mais ninguém menos que Grace Passô (República), considerada uma grande artista brasileira. A dinâmica criada pela intérprete com as outras atrizes faz com que esta lógica de underdogs se eleve e fique até esquecido o quão isto é clichê. A vontade de que o time vença vai crescendo durante a projeção e, juntamente com as injustiças que Sofia sofre, a sensação de empatia para com ela vai se elevando.

Através da aproximação com a personagem central, com seu sofrimento e sua história, é possível estabelecer uma conexão com a trama. São as fragilidades de Sofia e os absurdos que ela tem que viver, em tão pouca idade, que criam um nó na garganta, que podem grudar a plateia na cadeira. É revoltante demais pensar que a sociedade é, majoritariamente, conservadora, heterornornativa, de pensamento colonial branco, hipócrita, servo de um patriarcado cruel e despudorado.

Levante

Neste sentido, a farsa de manutenção da vida extrapola os limites do real e em Levante isto não é diferente. O que importa para essa gente, dita protetora da vida, é regular e se apoderar dos destinos das mulheres, sobretudo quando se tratam de mulheres com menos dinheiro, mulheres pretas, mulheres que usualmente são desrespeitadas e vilipendiadas no Brasil.

Este desespero sufocante de querer escapar desta condenação a uma maternidade indesejada é o foco central do filme e ele é feliz ao conseguir passar todo o debate que deseja, de forma enxuta e direta. O que incomoda na produção, na verdade, é um desajuste técnico, que poderia ser resolvido com algumas afinações. A retirada de algumas obviedades do roteiro, como nas questões do campeonato de vôlei (expulsão de Sofia do time e seu retorno para as quadras) ou na própria maneira de lidar com a imagem.

Apesar da diretora de fotografia, Wilssa Esser (Temporada), ser brilhante, aqui, ela comete uns deslizes que comprometem qualidade de seu trabalho. Wilssa e Lillah poderiam ter pensado melhor na composição decupagem x luz. Em momentos chaves do filme não é possível enxergar as emoções das personagens, seja por questões de enquadramentos ou de iluminação. É incômodo de acompanhar a estrutura do trabalho da dupla, porque é como se fosse quase negado acompanhar o aprofundamento dos sentimentos das figuras dramáticas.

As sombras não compõem, muito menos os escuros intensos. Apesar de tudo isso, Levante tem carisma e potencial. Ao abordar temas delicados, como gravidez na adolescência e aborto, há uma leveza ao retratar uma juventude liberta e consciente. No entanto, ao mesmo tempo, falta para a equipe uma maturidade maior para que a entrega geral fosse menos previsível e cansativa. Com atores esforçado, por exemplo, existe uma fé cênica que amacia o estado verde da parte jovem do elenco.

Assim, este é um filme que vale a pena acompanhar, mesmo com seus tropeços. Poderia existir aqui um trato melhor do enredo, da imagem, das composições individuais sendo pensadas no contexto amplo da história. Mas, no final do dia, Levante está correndo pelos festivais, ganhou o prêmio Fipresci em Cannes (Parallel Sections) e tudo isso é porque ele carrega consigo uma energia vibrante, um recado de resistência.

Direção: Lillah Halla

Elenco: Ayomi Domenica, Loro Bardot, Grace Passô

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