Um bom prólogo pode ser ameaçador para o destino de uma obra. As expectativas que são inseridas ali talvez levem a decepção, trazendo o fracasso como consequência. Este é o caso de The Ordinaries. Apesar de conter uma abertura criativa, que imerge no universo da narrativa e da diretora e roteirista Sophie Linnenbaum – que escreveu a produção ao lado de Michael Fetter Nathansky – parecer bem consciente do universo ficcional que está criando, o filme não mantem a qualidade até o final. Isto por conta principalmente de seu desfecho, que se rende aos caminhos fáceis.
Ainda assim, Linnebaum e Nathansky conseguem segurar a audiência justamente pelo laço que é estabelecido no início da projeção. E é através de um mundo distópico, no qual o sonho de toda a população é ser uma personagem principal, que o longa-metragem convoca a metalinguagem para se aprofundar em discussões políticas e sociais, bem como conduzir a transformação da protagonista Paula (Fine Sendel). A garota sonha em seguir os passos do pai e ser uma personagem principal. Contudo – e obviamente –, ela vai descobrindo que suas raízes não são exatamente as que ela imaginava, o que muda completamente o seu presente.
Neste contexto, o que mais chama a atenção na obra são os recursos estéticos. Além de eles estarem presentes na produção para o desenvolvimento da trama, a linguagem visual é bem realizada. Seja na utilização das figuras em preto e branco ou no par romântico de Paula, Simo (Noah Tinwa ), que sofre com uma pane na qual ele está sempre pulando falas e ações, por exemplo, durante toda a sessão estes artifícios estão interligados e são usados para mover a história e amarrá-la. Desta maneira, os efeitos visuais, a cenografia e o figurino apresentam coesão e contribuem para a sensação de imersão no longa-metragem.
As tentativas de explorar gêneros cinematográficos, arquétipos e clichês do audiovisual também são válidos, porém é aí que a obra começa a se perder. Enquanto a busca em falar sobre os oprimidos em uma sociedade de aparências e injustiças é um ganho, as repetições e insistência em fazer piada enfraquecem o resultado geral. Os propósitos de Paula, juntamente com as regras do mundo em que ela vive, começam a se afrouxar. Referências ao cinema ou artifícios reincidentes desgastam a força do que está sendo contado e como se está fazendo isto.
Um exemplo é o conflito da melhor amiga de Paula, que é acaba virando uma gag vazia, porque não existe tempo dentro do longa para entender as motivações desta personagem ou suas complexidades. Na verdade, somente Paula tem camadas, o restante parece estar ali a serviço da sua jornada como heroína. De certo, a única quebra com este padrão é no desfecho do conflito, com o ato da mãe de Paula, que demonstra que a mesma possui outras tonalidades. No entanto, para o restante das personagens falta transformação e locomoção de estado.
Por esta razão, a sessão vai se tornando cansativa, mesmo que as piadas repetidas causem risadas aqui e ali ou que a criatividade da direção e do roteiro retornem em algumas cenas – como na fuga de Paula da polícia, quando ocorre a utilização do rewind. Por isso, o resultado geral, The Ordinaries fica em uma espécie de média e deixa sentimentos duplos. De um lado, existe a criatividade em falar sobre minorias sociais e injustiças, pondo um mundo distópico sofisticado e irônico. Do outro lado, a produção não consegue sustentar a riqueza de sua própria criação de atmosfera e mundo, simplificando discursos e se encaminhando para soluções óbvias ou fáceis.
O desfecho do longa é o resumo completo desta impressão sobre o filme no geral. Ao mesmo tempo em que ele é catártico, também é bobo e reduz o seu próprio potencial. As respostas para os problemas de Paula surgem do nada no enredo, resolvendo questões supostamente impossíveis em pouquíssimos minutos. Assim, The Ordinaries é uma exibição que não mantém seu nível qualitativo do começo até seu encerramento, porém é agradável e revela o potencial de Sophie Linnenbaum em seu primeiro longa-metragem de ficção.
Direção: Sophie Linnenbaum
Elenco: Fine Sendel, Jule Böwe, Henning Peker
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