Ao assistir a Druk – Mais Uma Rodada, o espectador pode pensar como o tédio do homem branco cis europeu pode levar ao caos e aos atos inconsequentes. A vida comum e cotidiana talvez incomode tanto estes homens que eles perdem a noção da realidade e pulam em direção de qualquer aventura, buscando sentir qualquer coisa diferente. Mas, por que falar de Druk nesta crítica? Porque é esta apatia e angústia que leva o protagonista de Speak no Evil a destruir a sua família.
Este é o ponto de partida para que Bjørn (Morten Burian) convença a sua esposa, Louise (Sidsel Siem Koch), a aceitar o convite de estranhos que eles apenas conheceram em suas férias na Itália. Aqui, há uma grande sacada em misturar elementos do ordinário aos toques de sobrenatural. O roteiro de Christian (Pais) e Mads Tafdrup (Yes No Maybe) joga o tempo inteiro com o que há de assustador nas relações humanas, com o pânico real da violência direta, que ultrapassa o nervosismo fruto do contato com pessoas diferentes.
A pergunta que paira a exibição inteira é: esta visita para um final de semana com holandeses terá um final trágico ou tudo é uma questão de choque de cultura e ideias? Ainda que em alguns momentos o desfecho pareça óbvio, as idas e vindas do pânico do casal central constrói uma atmosfera de tensão, que se alastra durante toda a sessão. Sejam com movimentos de câmera, variações de intensidade sonoras – com música ou ruídos – ou situações que mesclam constrangimento e medo, a suspensão habita a obra de forma profunda e constante.
Esta estratégia poderia resultar em um cansaço da plateia ou em um desgaste da força dos acontecimentos da trama.
No entanto, a escolha do roteiro dos Tafdrup – que tem a direção de Christian – é acertada. A demora em mostrar algo gráfico e o caminho da dúvida em relação ao casal da Holanda faz com que o clímax do longa-metragem ganhe ainda mais potência, conseguindo amarrar a maioria das perguntas e mistérios sobre os antagonistas. Nesta gangorra de emoções, que brincam com as crenças do público, talvez o ápice qualitativo seja no ponto de virada dentro do enredo.
Com closes individuais dos rostos do quarteto, esta é a marca que informa a quem assiste que o destino de todes está selado a partir daquele momento. O trabalho de Christian Tafdrup em Speak no Evil fica nítido em sequências como essa, pois mostra a sua habilidade em revelar as emoções das personagens e seus caminhos, através de escolhas pontuais na decupagem, como o tamanho do quadro. No caso deste exemplo, este encaminhamento é sentido amplamente porque a maioria dos planos do longa são mais abertos.
A proximidade instantânea que acontece nesta cena marca esta mudança que acontecerá nos minutos seguintes. Quase tudo dentro da produção causa os efeitos necessários e tem seu planejamento bem executado. Todavia, é preciso ressaltar que um elemento permanece solto: a figura da babá. Os atos dos holandeses Patrick (Fedja van Huêt) e Karin (Karina Smulders) são de psicopatas e esta poderia ser a justificativa para tudo que eles fizeram. Mas, por qual motivo Muhajid (Hichem Yacoubi) se alia a dupla?
A sua figura parece mais uma alternativa fácil para solucionar lacunas do enredo. Por exemplo, como os casais sairiam para jantar à noite sem os filhos? A solução foi inserir Muhajid, porém ele não apresenta nenhum background ou tem motivações palpáveis. Ainda assim, este fator ou as pequenas obviedades da história não comprometem a totalidade de Speak no Evil. Este é um filme que prende a atenção em toda sua duração, que é apegado à maioria dos detalhes e que consegue construir um horror apavorante, sugerindo mais do que entregando imagens ou diálogos explícitos.
Juntamente a isto, ainda há a reflexão derradeira de como a melancolia sobre a vida banal pode ser substituída pelo trágico. É um pensamento de uma sociedade específica, mas também um recado moral, algo típico do gênero, que é executado com maestria pelos Tafdrup.
Direção: Christian Tafdrup
Elenco: Morten Burian, Sidsel Siem Koch, Fedja van Huêt
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