O marrom da terra cobre o ecrã, que mistura poeira, dor e ventania, em um curta-metragem, que mescla símbolos e silêncios para a construção de seus sentidos. Dirigido por Tambla Almeida (Sonho do Professor), Ulime, o filme do Cabo Verde, revela conflitos de um protagonista imerso em uma solidão e uma imobilidade profunda, impressa sob forma de imagem.
A junção do vento, que bate nas poucas vegetações que preenchem a tela, e os planos estáticos, fomentam essas emoções de Blimunde, esta figura boi-gente, que está preso tanto em círculos metafóricos quanto em um círculo literal. Dentro desta lógica narrativa, é possível notar certas inspirações de Tambla com o cinema de Glauber Rocha.
Seja pela movimentação de câmera ou pelos planos bem fechados, que extrapolam os limites da visão do rosto do protagonista, a única questão com a utilização destes recursos é que, de maneira geral, eles parecem ser usados mais por uma questão estética do que pela narrativa em si. De fato, o público se depara aqui com uma produção experimental.
Ainda assim, falta ao diretor e roteirista amarrarem mais profunda e racionalmente a criatividade ao que os mesmos desejam contar. Porque, por mais que as metáforas elaboradas na trama sejam efetivas para a compreensão dos sentimentos da personagem central, a vontade de criar imagens um tanto disruptivas deixam o enredo repetitivo e um tanto cansativo.
Talvez pela empolgação de ter criado algo visualmente estimulante, com esta figura boi-gente, cercado pela natureza e a amplitude da terra batida, tenha tirado o enfoque do principal: a investigação de Blimunde. Mais do que a sua ausência de fuga ou a quebra com este estado imóvel, há este ser e o mundo que o cerca, que precisa de respostas.
Mas, a análise ou a compreensão de Blimunde não precisava ser explícita, até porque retiraria toda a qualidade etérea e plural da interpretação da narrativa de Ulime. Contudo, a simples criação de progressão já poderia ajudar a fomentar a amarração do roteiro de Tambla. Ainda assim, o realizador consegue imprimir imagens criativas, que demonstram um apuro técnico em processo de maturação.
Por esta lógica de experimentar o visual e o sensorial, Ulime tem mais peso qualitativo positivo. Ainda que pudesse ter um entendimento maior sobre recursos narrativos, a plateia se sente magnetizada diante de Blimunde e seu universo terroso e sufocante, em uma contradição extremamente curiosa. O vento e o espaço amplamente aberto se tornam uma prisão.
O que pode deixar uma questão final, para possíveis reflexões de como o aprisionamento mental é mais forte do que a realidade e a solidão imobilizante jamais se finda até que os círculos serem quebrados. Só por estes pensamentos que ecoam por muito tempo após a sessão, Tambla Almeida já revela a possível força de seu cinema.
Direção: Tambla Almeida
Elenco: Herlandson Duarte