A 90ª edição do Oscar pode ser definida como algo jamais visto. Ao assistir as atuações dos artistas indicados, o público percebe o quanto a disputa desse ano será acirrada. Mesmo existindo os favoritos e aclamados em outros prêmios, sempre há a possibilidade de alguma surpresa. Com papéis colossais e muito bem escritos (em sua maioria) os aqui indicados – sejam eles e elas principais ou coadjuvantes – fizeram algumas das melhores estreias, interpretações e despedidas já vistas na história do cinema.
Melhor Ator Coadjuvante:
Algo não muito comum aconteceu na categoria de “Melhor Ator Coadjuvante”. Dentre os cinco indicados, quatro filmes foram contemplados: Três Anúncios Para Um Crime, Todo o Dinheiro do Mundo, Projeto Flórida e A Forma da Água. O grande destaque da noite do dia 4 de março provavelmente será o quase invicto campeão das premiações de 2018, Sam Rockwell. Ele ganhou a graça dos críticos e público por conta da sua magnifica atuação no terceiro filme de Martin McDonagh. Ao seu lado, o seu companheiro de cena Woody Harrelson também ganhou uma indicação. Apesar do ótimo desempenho de seu colega, Rockwell segue sendo o centro das atenções por seu papel desafiador que deve ser o ganhador da categoria ao final da noite de domingo.
Quanto aos outros três concorrentes, o canadense Christopher Plummer está brilhante em seu papel como o bilionário cruel J. Paul Getty, fazendo dele o ator mais velho a ser indicado a um Oscar. Uma outra magnífica atuação veio de Richard Jenkins – mais conhecido por seu desempenho admirável na película O Visitante, de 2007 – cujo interpretou Giles, o vizinho da personagem de Sally Hawkins (outra indicação da Academia) em A Forma da Água. Willem Dafoe foi um caso à parte. Com uma carreira memorável e grandes papéis ao longo dela, a sua personagem no singelo e esteticamente perfeito Projeto Flórida, de Sean Baker, não tem uma relevância e nem possibilidade cênica, quando comparado com os outros indicados. Dafoe fez cada segundo seu em cena valerem a pena, porém outras interpretações mereciam muito mais uma indicação, como Armie Hammer e Michael Stuhlbarg, ambos por suas atuações em Me Chame Pelo Seu Nome.
Melhor Atriz Coadjuvante:
As indicadas dessa categoria formam um time invejável, onde todas as atuações foram destaques em seus respectivos trabalhos. Uma mulher negra pobre vivendo no sul dos EUA durante a II Guerra Mundial à espera do retorno de seu filho que foi defender o país; a rigorosa irmã mais velha de um gênio narcisista, cujo papel fundamental é fazer com que o irmão não estrague o seu império e nem a sua vida; a zeladora de uma base militar secreta que arrisca a vida para ajudar sua amiga muda a salvar seu amor; uma mãe batalhadora e dura que, apesar de fazer tudo para dar o melhor para sua família, é incompreendida por seus filhos, em especial a filha adolescente; e uma mãe cruel e nada amorosa que, do seu jeito tortuoso, faz com que a filha treine para ser a melhor do mundo. Essa variedade de narrativas e personagens tornam a escolha da Academia algo muito mais difícil.
Mary J. Blidge conseguiu fazer história em 2018 ao tornar-se a primeira mulher negra a ser indicada a duas categorias no Academy Awards. Com uma atuação comovente em Mudbound: Lágrimas sobre o Mississipi e uma música original lindíssima, Blidge firma seu talento como atriz. Já a britânica Lesley Manville volta a impressionar o mundo da sétima arte com sua presença e força como atriz – coisa que não acontecia desde a sua magistral performance em Mais Um Ano, de 2010. A terceira indicada é uma das atrizes mais adoradas pelo público. Octavia Spencer tem provado a cada personagem que seu lugar de destaque nos últimos anos é nada mais do que merecido e não poderia ter sido diferente com Zelda, sua personagem no longa de del Toro.
Por fim, sobraram as duas figuras maternas que tem uma presença colossal em cada uma de suas cenas. A primeira é interpretada por Laurie Metcalf (Lady Bird – A Hora de Voar) e segunda por Alisson Janney (Eu, Tonya). Muito conhecidas por seus papeis cômicos em filmes e seriados, Metcalf e Janney provaram que seu talento vai além disso. Contudo, a interpretação de Alisson foi tão extraordinária que não há dúvidas quanto a sua vitória nessa categoria. Com todo o respeito as demais indicadas, mas nada superará a graciosidade sádica de Janney ao viver a mãe da patinadora Tonya Harding.
Melhor Ator:
Como nas outras categorias, as performances aqui listadas foram excelentes, porém impossível pensar nos nomeados de 2018 sem visualizar imediatamente o rosto de Gary Oldman. Essa é a sua segunda indicação no Oscar e parece que a sua hora chegou. Oldman estava simplesmente esplêndido ao encarnar o turrão primeiro-ministro da Inglaterra, Winston Churchill. Não há dúvidas que ele enfim será agraciado com a estatueta da Academia, afinal esse foi o trabalho da vida dele. Nunca houve papel mais verdadeiro e perfeito para o velho Drácula – papel interpretado por Gary em 1992, no longa-metragem de Francis Ford Coppola.
Ao lado do intérprete de Churchill, temos um dos melhores atores do cinema atual, Daniel Day-Lewis com sua atuação em Trama Fantasma como o egocêntrico e narcisista Reynolds Woodcock – papel que encerra sua carreira como ator. Apesar dos problemas existentes na trama, Day-Lewis prova que não há furo em roteiro que o impeça de demonstrar o quão brilhante ele é. Outra presença ilustre entre os indicados é Denzel Washington. Seu filme (Roman J. Israel, Esq.) não permitiu que ele desse a melhor performance da carreira, mas segue sendo aquela dose inspiradora de atuação que só o Denzel sabe fazer.
Por fim, a presença dos jovens e estreantes no prêmio, Timothée Chalamet e Daniel Kaluuya, mexeu com a competição. Se alguma surpresa ocorrer e o Oscar de melhor ator não for para Gary Oldman, esses dois jovens são os próximos da linhagem. Timothée encanta e emociona o público em Me Chame Pelo Seu Nome ao viver o jovem Elio e o seu universo de descobertas e desejos. Entretanto, Kaluuya é o segundo favorito para ganhar a estatueta. Corra! foi o ambiente perfeito para que o inglês pudesse despontar como um ator promissor – concedendo a ele diversos prêmios.
Melhor Atriz:
A disputa aqui é algo paradoxal. Apesar das cinco performances terem sido extraordinárias e dignas de vitória para todas, o resultado é incontestável. Frances McDormand é a favorita da crítica e público porque não houve nada que se equiparasse à sua grandiosidade ao dar vida a Mildred Hayes. A apresentação de Mildred é provocante, inspiradora e forte. A mulher que não descansará até ver os monstros que mataram a sua filha atrás das grades, não está lá para ser amada, porém Frances faz com que o espectador se apaixone pela figura de representatividade absurda que é a senhora Hayes. Três Anúncios Para Um Crime é, assim como Fargo (vitória dela no Academy Awards), uma mostra do que Frances é capaz de fazer em cena.
Para compor o time que representou as diversas facetas femininas, temos a recordista de nomeações, Meryl Streep, a deslumbrante Sally Hawkins, a jovem Saoirse Ronan e a surpreendente Margot Robbie. O mais importante nessa lista de indicações é o quão atuais e reais foram as personagens de cada uma dessas mulheres. Meryl deu vida a editora-chefe Kay Graham e o seu poder como mulher que enfrentou o mundo para escancarar o segredo que consumia a nação estadunidense. Hawkins fez o todos se emocionarem sem dizer uma só palavra. Saiorse mostrou mais uma vez que sua idade é inversamente proporcional ao seu talento monstruoso. E Margot relembrou o mundo da história de vida de uma mulher que sofreu muito para alcançar o topo por causa de preconceitos e obstáculos. Somadas, todas essas 5 mulheres representam uma legião de pessoas que enfrentam um universo de preconceitos e julgamentos. Graças a essas atrizes memoráveis, a 90ª edição do prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas será lembrada como o momento no qual até a conservadora Academia se rendeu ao inevitável (mesmo que sem querer): a luta pela igualdade. Afinal, time is up!