Desde 1962, quando teve a sua primeira aparição nos quadrinhos, o Homem-Aranha trouxe um novo caminho para as ficções heroicas. O surgimento de uma figura tão próxima da realidade dos leitores encantou gerações e promoveu uma narrativa cheia de arcos e ramificações que se desdobram até hoje, quase seis décadas após sua criação. Os fãs do Aranha já vivenciaram diversas fases da personagem e estavam curiosos com a continuidade que a Sony Pictures, em parceria com a Marvel Studios, daria para a jornada de Peter Parker.
Após os eventos de Vingadores: Ultimato que foram determinantes para a reaparição do Spider-Man, a jornada de Homem-Aranha: Longe de Casa começa com um Peter tentando se adaptar as mudanças que ocorreram no planeta, em especial a perda do seu mentor e amigo. A responsabilidade de ser um dos poucos heróis vivos, a frustração e o vazio pela ausência de Tony e os dilemas juvenis embalam a narrativa desse novo arco do Aranha. A jornada que começou em 2016 com a aparição do jovem herói em Capitão América: Guerra Civil, toma forma e se complexifica durante seu segundo filme solo.
Apesar do sucesso e da visibilidade cada vez maior por sua participação nos Vingadores, o jovem herói já é um velho conhecido da cultura geek. De 1962 até os dias de hoje, o Aranha já teve centenas de hqs publicadas, foi tema de 11 séries televisivas – sendo duas live-action e nove animadas –, foi protagonista de três diferentes arcos fílmicos e gerou dois spin-offs. Com sua chegada no cinema, contudo, esse fascínio e essa comoção só se amplificaram.
Dentre os filmes solo do Homem-Aranha, a trilogia dirigida por Sam Raimi (A Morte do Demônio, 1981) foi um capítulo de extrema importância na jornada do herói. Além de iniciar a fase cinematográfica do Aranha, o diretor deu vida a uma narrativa que padronizou o imaginário popular de quem seria essa figura tão famosa desde a década de 1960. A interpretação de Tobey Maguire (Regras da Vida, 1999) inaugurou uma das possibilidades do herói. Nos três filmes da parceria Raimi-Maguire, o espectador pôde ver um jovem maduro, com preocupações adultas e dilemas profundos – tanto que o fator da perda do tio Ben é um acontecimento de extrema importância para a construção do super-herói. Maguire, portanto, estreou essa personagem nos cinemas com uma vivência que trazia maturidade e dificuldades de uma vida mais adulta.
Em seu segundo arco, a Sony Pictures decidiu adaptar a hq mais antiga do herói. O Espetacular Homem-Aranha traz uma roupagem completamente diferente para o Peter. Dessa vez, o público se depara com um Parker fisicamente mais jovem, com atitudes e vivências mais infantis e até com uma personalidade um pouco oposta do Peter de Maguire. Andrew Garfield (Até o Último Homem, 2016) dá vida a esse novo tipo heroico do Parker que rendeu dois longas. Apesar das duas produções, The Amazing Spider-Man (título original) cometeu muitos deslizes durante esses dois momentos. Os longas não conseguiram executar a narrativa com a maestria de Raimi e os roteiros se mostraram frágeis em suas tentativas de inovação. Atrelado a isso, a interpretação de Garfield não foi exatamente bem vista pelo público. Existe um claro estranhamento ao assistir o Andrew como o Aranha e, quando comparado com Tobey, esse incômodo só aumenta.
Após ficar dois anos longe das telas, o herói da vizinhança retorna aos cinemas fazendo uma participação especial no último filme solo do Capitão América. Assim, em 2016, os fãs da Marvel puderam ter um primeiro olhar – mesmo que rápido – de como seria essa nova versão do Aranha. Desde esse primeiro momento, o Spider-Man de Tom Holland mostrou que seguiria um caminho mais próximo ao de Maguire. Um ano depois, com a estreia de seu longa, Holland trouxe ao público uma versão mais jovem do que foi a personagem de Maguire e Garfield.
O Homem-Aranha de Tom é um nerd desengonçado que enfrenta os dilemas normais de todo adolescente. Apesar de não conter a profundidade das motivações de Maguire, Holland, ainda assim, consegue se aproximar do estereótipo do herói aracnídeo. A despretensão de assumir essa vida de super-herói, as vivências ainda colegiais e o jeito atrapalhado são características próximas que podem ser traçadas entre o primeiro e o atual Aranha.
O destaque dessa nova jornada, contudo, está na participação do Homem-Aranha nos Vingadores. A adesão do garoto nova-iorquino aos maiores defensores do universo foi uma estratégia narrativa desde o início. A primeira aparição do Aranha mostra que os caminhos se alinhavam para que ele crescesse como herói e assumisse um papel fundamental na proteção do planeta com o passar dos anos. Todo esse processo se intensifica com a perda de seu mentor – temática a qual gerou o enredo do último lançamento da Marvel Studios.
Com Far From Home (título original), a jornada de Peter Parker chega a um momento crucial. O garoto precisa aceitar o seu papel de protetor de mais do que sua cidade e deve abraçar o legado que Tony Stark deixou para ele. Pela frente, suas preocupações juvenis e sua maturidade ainda em processo precisarão se moldar aos dilemas da vida real de um super-herói. Com isso, o perigo, sofrimento e a perda podem se tornar questões frequentes em sua vida. Acontecimentos que podem, ao decorrer dos próximos filmes, aproximar ainda mais os Aranhas de Maguire e Holland.
Para além desses arcos principais, a saga do Spider-Man foi capaz de ir além da figura central das hqs – ou pelo menos de sua personagem original. Em 2018, a Sony lançou dois spin-offs das histórias do Homem-Aranha. A primeira produção lançada foi o longa-metragem estrelado por Tom Hardy (Mad Max: Estrada da Fúria, 2015) intitulado Venom. O filme narra a história de um jornalista controverso que acaba se tornando hospedeiro do simbionte que dá nome ao filme. Apesar das suas falhas de roteiro, direção e tom, a película teve um sucesso de bilheteria, o que garantiu sua continuação – a qual está prevista para 2020 – e ainda outras produções voltadas para vilões do universo Aranha, como Morbius que estreia, também, em 2020.
Alguns meses após o lançamento de Venom, a Sony lança o maior sucesso do fim de ano, Homem-Aranha no Aranhaverso. A animação foi o ponto alto do estúdio e gerou um reboliço no universo cinematográfico. A crítica e o público abraçaram o longa de imediato e a animação levou para casa dezenas de prêmios, incluindo o Oscar de “Melhor Animação”.
O fenômeno causado pela figura do herói aracnídeo tem, portanto, uma história densa e cheia de nuances. Seja pelas representações em diferentes mídias, pelos arcos distintos do cinema ou pela expansão de seu universo. Seja como for, o Homem-Aranha se mantém como um ícone juvenil que está na memória das gerações passadas e presentes. Independentemente das falhas de O Espetacular Homem-Aranha ou da demora para Longe de Casa engatar de forma verdadeiramente interessante, o amor por essa figura fala mais alto e tem garantido sempre um retorno aos estúdios. Os fãs do Aranha agora podem apenas teorizar e aguardar ansiosos pelo desenvolver da história do querido herói tanto em meio aos Vingadores como através dos spin-offs que estão por vir.