Foto: Wanderley Teixeira (Coisa de Cinéfilo)
Assumindo pela primeira vez a função de diretor e roteirista em um longa-metragem de ficção, o experiente produtor Marcus Logocki Jr. aposta suas fichas na comédia romântica Uma Loucura de Mulher. No filme que estreia neste final de semana em todo o país, Ligocki dirige Mariana Ximenes, que interpreta uma ex-bailarina que abandona o marido, um candidato a governador, para ir em busca da sua realização pessoal. Em visita a Salvador para o lançamento do filme, o diretor nos contou um pouco sobre a sua primeira experiência na direção e sobre os bastidores da realização do longa-metragem. Confira na íntegra a conversa que o Coisa de Cinéfilo teve com o realizador:
Coisa de Cinéfilo: Você já tem uma carreira como produtor em filmes como O Último Cine Drive-In e Rock Brasília. O que te fez escolher Uma Loucura de Mulher como seu primeiro longa-metragem?Marcus Ligocki Jr.: Fazer um longa-metragem como diretor era talvez a coisa mais importante para mim. Quando eu comecei a fazer cinema há vinte e poucos anos, me aproximar disso e querer entrar nesse mercado, meu objetivo era dirigir e levei esse tempo inteiro me especializando e aprendendo para ter a oportunidade de fazer um filme como esse. Eu estava completando 43 e assumindo um risco porque quando você dirige você se expõe completamente. Então para mim era muito importante contar uma história que eu acreditasse, que fosse um tema relevante, caro para todas as pessoas, que pudesse fazer as pessoas se divertirem e refletirem.
CdC: Quais foram as principais inspirações para o roteiro?
MLJ: O tema do empoderamento feminino sempre esteve muito próximo de mim. Minha mãe foi uma feminista atuante, ela foi fundadora e trabalhou por dez anos em uma ONG voltada para a questão e a gente discutia muito o posicionamento da mulher, o impacto disso na sociedade. Eu sempre me preocupava com a individuação, um processo mítico de todos nós. Como é que a gente se exerce? Como a gente realiza o que é importante para nós, de acordo com as nossas características… Como aproveitamos essa oportunidade que estamos vivos para nos manifestar, dar voz ao nosso olhar sobre as coisas. A gente é sempre convidado a cumprir um olhar de uma outra instituição, de uma outra pessoa. As vezes a gente passa muitos anos sem conseguir se manifestar. Eu adoro quando vejo as pessoas descobrindo o seu espaço e achando a sua voz. Acho que não tem nada mais importante nesse mundo. Então esse filme fala sobre essas coisas.
CdC: Através da protagonista?
MLJ: Eu acho que essa representação na mulher é ainda mais forte. A gente vem de uma cultura machista. Este espaço é recente para elas. Então a percepção dessa distância entre a possibilidade de se manifestar e a situação real é mais evidente nesse caso. Foi muito interessante construir essa personagem.
CdC: E como foi essa colaboração com a Mariana no set? Ela é sua protagonista e uma atriz muito jovem, mas com muita experiência em diversas áreas, ao mesmo tempo era produtora do filme também.
MLJ: Poxa, foi especial. Imagina eu na minha primeira direção contar com uma atriz como a Mariana. Com o talento, a experiência dela… Foi genial. Ela é absolutamente generosa e eu me expus a isso de corpo e alma. Tive inteiro nesse processo e nosso trabalho em conjunto gerou muitos frutos. Não foi um processo de chegar com um roteiro 100% fechado com uma personagem absolutamente construída e querer que a Mariana realizasse aquilo. Foi um processo de colaboração no qual o texto se aproximou dela e ela se aproximou do texto. Isso, na verdade, aconteceu também com todos os atores. Tanto no elenco quanto na equipe busquei pessoas muito experientes e talentosas.
CdC: Sobre o restante do elenco, ele é bastante heterogêneo. Como vocês chegaram a um denominador comum a respeito de cada ator que interpretaria os personagens do filme?
MLJ: A escolha do elenco foi curiosa porque tudo foi a partir da Mariana. Para mim era importante o olhar para as relações. Se eu tinha a Mariana como a Lúcia, o Gero (Bruno Garcia), marido dela, precisava ter determinados tipos de características que iam potencializar essa relação. Desde o entrosamento até as características físicas. Por exemplo, as características físicas do Gero tinham que ser diferentes das características físicas do Raposo (Sérgio Guizé), o primeiro namorado dela. Não só nas formas, uma forma de rosto mais quadrado e mais redondo, a pele mais branca ou mais morena, desde esses detalhes como também o ritmo daquele ator, o jeito de se posicionar, o tom de voz… Foram elementos observados para compormos esse quadro. Eu olhava para esse conjunto de personagens com as relações que eu pretendia estimular entre eles e, junto com a Lara Guaranys (co-produtora do filme), fizemos essas escolhas para que de alguma maneira essas relações pretendidas fluíssem, não fossem forçadas… A gente precisava que elas já estivessem plantadas nas características primárias de cada um dos atores.
CdC: A gente percebe que no filme o apartamento do pai da Lúcia é um elemento muito importante da história. Como ele foi pensado como cenário? E também como as cenas dentro dele foram pensadas?
MLJ: Quando eu comecei a pensar nesse filme, logo de cara, eu tinha uma cena que queria muito realizar que teria inspirações no vaudeville (gênero de entretenimento marcado por cenas que se sucedem no mesmo cenário). Está a Lúcia com o Raposo dentro do apartamento, daí chega o Gero de maneira inesperada, o Raposo tem que se esconder, ela precisa despistar o Gero, tirar o Raposo de dentro do apartamento… Então eu peguei um conjunto de filmes que tinham executado bem esse tipo de cena e comecei a estudar para entender o que é que fazia aquilo dar resultado. Como estava posicionada a câmera, como é que eram os movimentos, quando se enquadrava o que é que a gente via, quais eram os posicionamentos das portas… Então tudo isso regeu essa estrutura básica.
CdC: E sobre a construção ou idealização desse cenário?
MLJ: A gente começou a procurar locação e vimos que era muito difícil encontrar um apartamento que se adequasse a essa necessidade de linguagem mesmo. Então a gente resolveu construir um cenário que tivesse essa disposição de portas. Depois, o Tiago Marques (diretor de arte) e a equipe dele fizeram um trabalho muito minucioso de pesquisa em relação ao universo do pai dela, daquele bairro onde eles viviam, quanto tempo aquele apartamento estava lá. A partir disso, os móveis foram surgindo, os instrumentos musicais já que o pai dela era um boêmio, um cara do samba que gostava muito da noite e ai o cenário foi nascendo. Para contar uma comédia com credibilidade eu queria trazer realidade e que as pessoas se identificassem com esses personagens. Então a gente trouxe essa característica envelhecida do apartamento, que tem algumas cores mais fechadas nas paredes e nos móveis, mas nos figurinos e às vezes em objetos que estão em cima de uma mesa ou uma estante, você vai perceber que a gente tem sempre cores contrastadas.
CdC: Vivemos uma ótima fase para as comédias populares no país já que elas têm uma grande aceitação por parte de uma parcela do público, mas ao mesmo tempo é um nicho de produção que sofre uma certa resistência de um outro grupo de espectadores. O que você diria sobre Uma Loucura de Mulher para os dois estratos do público?
MLJ: Uma Loucura de Mulher foi um filme construído com muito cuidado nos detalhes, cada personagem tem uma razão para ser de um dado jeito, ter um certo figurino, estar naquele ambiente… É uma história que considero muito relevante para os nossos dias atuais. O que eu peço é que as pessoas deem uma oportunidade para o filme, mesmo porque ele é uma comédia romântica que, na minha percepção, vem com uma cara muito própria. É difícil comparar ele com qualquer outro filme feito por aqui ou feito fora. Ele tem elementos dessa linguagem e desse gênero, mas tem uma personalidade muito própria que eu vejo tanto as crianças quanto as pessoas mais velhas e os jovens se relacionarem muito bem. O público vive uma experiência não muito comum. Então, eu convido a todos que experimentem, acho que vai ser uma ótima experiência.
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