A chegada da quarta fase do Universo Cinematográfico Marvel (MCU*) trouxe consigo uma expectativa sobre as novas produções anunciadas. Com a estreia de seus seriados, exibidos pela plataforma Disney Plus – como Wandavision e Falcão e o Soldado Invernal –, este frisson ficou ainda maior para Viúva Negra. Isto porque nas séries do MCU, o público encontrou uma mescla de ação, com aprofundamento das personagens, desenvolvimento narrativo e os momentos corretos de evocar a comicidade.
Ainda que possua longas que fogem desta lógica – por exemplo, os ótimos Pantera Negra e Vingadores: Guerra Infinita –, o mais comum das obras do MCU é uma falta de ajuste em um ou mais de um destes elementos, contribuindo para a construção de uma qualidade mediana, na maioria de seus resultados trazidos para o cinema. Tudo isto é preciso ser pensado ao se analisar a nova estreia deste Universo Cinematográfico: Viúva Negra. Após 13 anos como coadjuvante, após a sua morte em Vingadores: Ultimato, Nastasha Romanoff (Scarlett Johansson, História de Um Casamento) ganha, finalmente, uma sequência solo, na qual o espectador se depara com uma história que se passa antes mesmo de Guerra Infinita, logo após Guerra Civil. Ou seja, obviamente, ela ainda estava viva.
Dois parecem ser os objetivos aqui. O primeiro é contar sobre a vida pregressa de Natasha, em 1995, quando ela fazia parte de um disfarce para dois agentes russos, Alexei (David Harbour, Stranger Things) e Melina (Rachel Weisz, A Favorita), para procurar registrar certo aprofundamento em sua trajetória. O segundo é apresentar Yelena Belova (Florence Pugh, Midsommar – O Mal Não Espera a Noite ), que também fazia parte desta missão, mas que era muito mais nova que Natasha, na década de 1990, e não compreendia que aquela não era sua família verdadeira.
Entre tentar humanizar Romanoff e passar o bastão para Belova, através de uma jornada cheia de explosões e embates, Viúva Negra apresenta os incômodos costumeiros do MCU. Apesar de contar com uma interação carismática do quarteto – e isto se dá muito mais pela qualidade dos trabalhos dos quatro atores do que do roteiro – há um desequilíbrio aqui. A começar pelo tom de humor que quebra instantes de investigação das relações. Vindo, principalmente, da figura de Alexei, as gags ainda interferem com a instalação de atmosfera de ação.
As piadas em si não são exatamente a questão, mas os momentos selecionados para suas aparições é que acabam por romper com a continuidade da progressão da suspensão, que as cenas de ação quase conseguem construir e com os diálogos sobre os sentimentos das personagens. Este fator, na verdade, possui complicações bastante imbricadas, porque cada rumo narrativo que se inicia, vem seguido de uma virada de instalação climática. O maior exemplo, talvez, seja quando Alexei, Melina, Natasha e Yelena se reencontram.
Ali é quando o enredo mantém menos uma linha contínua, seja quando eles abordam o grande caso que pauta a aventura do filme, quando Melina e Nathasha dialogam a sós ou quando Alexei e Yelena têm um momento pai e filha. São essas idas e vindas que rompem com o estabelecimento lógico progressivo da trama. Além disto, o próprio mistério investigado é mal trabalhado. O ponto central é justamente que os conflitos são apresentados como difíceis de serem resolvidos, mas o desenlace é repleto de plot twists que facilitam as soluções demasiadamente, deixando uma sensação de que milagres irão saltar na tela e os quatro salvarão o dia de qualquer maneira.
No geral, é um longa ingênuo, pautado em obviedades do gênero, porém mais do que isso, que tem escolhas de roteiro tão fáceis – como quando Belova surge, repentinamente, e explode o helicóptero do vilão Dreykov (Ray Winstone, Cats) – que torna a sessão um tanto entediante. O que vale mesmo é ver a dinâmica da família que, mesmo trazendo as rupturas de fluidez, possuem um jogo de cena que empolga. Os olhares e movimentações dos atores podem deixar o público ansioso para ver como será que cada um dirá o próximo texto ou utilizará o corpo para realizar um caminhada ou uma luta. Dentro do que parece ser a concepção de Viúva Negra, Johansson, Pugh, Weisz e Habour convocam criatividade e presença cênica quando estão todos juntos ou em duplas, tornando a projeção cansativa em assistível.
Direção: Cate Shortland
Elenco: Scarlett Johansson, Florence Pugh, Rachel Weisz, David Harbour, Ray Winstone, Ever Anderson, Violet McGraw, O. T. Fagbenle, Olga Kurylenko, William Hurt
*MCU = Marvel Cinematic Universe.
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