Vermelho Monet

Crítica: Vermelho Monet

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Depois de uma trajetória bem-sucedida em comédias como Cine Holliúdy e O Shaolin do Sertão, o cineasta cearense Halder Gomes aposta no drama sobre o universo das artes Vermelho Monet, uma aposta ambiciosa que, na tela, apresenta alguns problemas de desenvolvimento. Gomes narra a história de um falsificador de quadros em crise depois de anos desencantado com a própria arte. O caminho do personagem cruza com o de uma marchand e uma atriz cujos cabelos ruivos o remetem ao passado, quando trabalhava ao lado da sua companheira, sua grande musa inspiradora.

Vermelho Monet tem como cenário a Europa, por onde a personagem de Maria Fernanda Cândido transita, articulando as negociações da sua arte. O filme de Gomes lança um olhar cínico para esse universo, ajustando-se à perspectiva frankfurtiana sobre os problemas de uma indústria cultural que coopta a prática criativa, transformando-a em mercadoria, integrante de uma lógica de realização próxima da industrial pela reprodução. Enfim, ideias que seguem em discussão, mas que não ficaram “estacionadas” na primeira metade do século passado, auge da Escola de Frankfurt. Há revisões sobre esse pensamento porque, enfim, estamos em 2024, mas o filme de Gomes parece preso às bases fundamentais desses conceitos, andando em círculos com a crítica e com um certo saudosismo sobre a “verdadeira arte”. Os apontamentos do filme são válidos, mas seria preciso um aprofundamento maior sobre essas questões. O que a obra faz é, na verdade, reproduzir essas ideias, já exploradas de tantas outras formas na literatura e no próprio cinema.

O grande problema de Vermelho Monet é o anacronismo do filme. Não só no âmbito do desenvolvimento da sua crítica sobre as artes, mas em outros elementos da sua história. Encantado com o cenário europeu e com a “atmosfera artística” que aquele lugar evoca, Gomes insere em seu drama todo tipo de referência: o fado (bem, estamos em Portugal), Vermeer, Frida Kahlo… Tudo é bem-vindo. O longa parece um exemplar da entressafra da Retomada, um cinema nacional que ainda buscava sua identidade no novo século. O que se vê é uma obra com menos personalidade que os títulos anteriores do cineasta, insegura sobre suas próprias pretensões e que parece buscar a aprovação do público sobre o valor dos seus intentos o tempo todo.

Vermelho Monet

Um dos sustentáculos da trama de Vermelho Monet é a já tão explorada relação entre o artista e sua musa, algo que acaba recaindo na dinâmica entre um homem mais velho e os seus desejos ambíguos por uma jovem. Parte do longa explora esse momento em que a realização artística extrapola ou se confunde com a sexualidade das suas personagens.

Vermelho Monet reitera tudo que contempla essa perseguição de um homem pela sua grande musae ainda faz da personagem de Samantha Müller uma espécie de fantoche dos caprichos dos personagens de Maria Fernanda Cândido e Chico Diaz. No fundo, a jovem atriz interpretada por Müller segue a tradição objetificadora desse tipo de personagem, sem nenhum outro atributo ou característica que possa construir em torno dela qualquer tipo de complexidade. Eventualmente, descobrimos que há um grande laboratório para um trabalho da personagem por trás da relação que ela estabelece com os demais, mas esse plot só serve para piorar ainda mais a situação do roteiro, que se perde em mais um desenvolvimento que não consegue sustentar.

Revelando-se como uma amálgama de “chavões” sobre a arte, Vermelho Monet não consegue se aprofundar em nenhuma das ideias “ventiladas” e parece inebriado por uma própria ideia de “filme de arte” que já nem mais condiz com o estágio atual da nossa produção. Sem a cobrança de fazer algo mais grandioso, sério e intelectualmente robusto, Halder Gomes foi muito mais bem-sucedido em seu cinema. Aqui, o diretor parece fora de prumo, disperso no meio de um “oceano” de ideias das quais se apropria e não sabe muito bem o que quer dizer com todas elas para além do óbvio.

Direção: Halder Gomes

Elenco: Maria Fernanda Cândido, Chico Diaz, Samantha Heck Müller

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