Sempre em Frente

Crítica: Sempre em Frente

4.5

De Gladiador, Johnny e June, passando por O Mestre e mais recentemente Coringa, e ainda pela sua própria persona fora das telas, Joaquin Phoenix sempre foi um ator cuja assinatura é a exposição de personalidades complicada e dúbias. Quando pensamos no ator imediatamente o associamos a um perfil atormentado. Sempre em Frente me soa como uma quebra dessa recorrência como foi Ela, de Spike Jonze. Ainda que em ambos os personagens de Phoenix apresentem sua carga dramática, o ator consegue enfim um respiro e dá corpo a um sujeito que mobiliza sentimentos positivos na relação do público com aquela figura.

No longa de Mike Mills (dos ótimos Toda Forma de Amor e Mulheres do Século 20), Phoenix dá vida a Johnny, um jornalista de rádio que passa uns dias com o sobrinho enquanto grava um programa com crianças pelos EUA. O personagem se vê convocado para a função de cuidar do garoto enquanto sua irmã viaja para cuidar de alguns problemas de saúde envolvendo o ex-marido, o pai do menino.

Em Sempre em Frente, Mills faz o que realiza de melhor, apresenta para o espectador uma situação aparentemente banal, mas gradualmente envolve o público com relações críveis que transbordam sensibilidade sem soar apelativas. No longa, o diretor e cineasta fortalece gradualmente os laços de tio e sobrinho que tinham pouco contato até então. O cineasta utiliza este mote para falar sobre ritos de passagem e sobre encontros e situações que, insuspeitadamente, marcam nossas vidas e nos transformam.

Sempre em Frente

As opções estéticas de Mills atendem ao propósito intimista da sua obra. A fotografia P&B de Sempre em Frente coloca os cenários em segundo plano, o que interessa no filme e o que salta na tela são os sentimentos que tomam conta da experiência vivida por Johnny e seu sobrinho Jesse. O diretor intercala o filme com cenas do próprio Joaquin como Johnny entrevistando crianças e adolescentes reais, estabelecendo uma dinâmica emocionante entre ficção e documentário na medida em que as respostas nos indicam a estágios da relação do protagonista com o sobrinho e das principais inquietações do garoto. O filme coloca a vida na sua beleza como experiência sensorial e reflexiva nesse diálogo entre formatos.

Mills ainda consegue desempenhos carregados de sensibilidade do seu elenco. Joaquin Phoenix surge em cena como um sujeito adorável, que vai se reconstruindo a todo momento em cena, capaz de improvisos e superações sem perder o liame da sua personalidade, algo possível graças a sua interação com o espontâneo Woody Norman, o garoto que interpreta o seu sobrinho. Gaby Hoffmann tem uma participação como a irmã do personagem de Joaquin e também tem ótimos momentos.

Apresentando mais uma vez um filme leve, mas carregado de sentimentos e reflexões densas sobre a vida e as relações familiares, Mike Mills segue com seu minimalista e potente projeto cinematográfico em Sempre em Frente. Executando um trabalho que seria um divisor de águas na sua carreira, Johnny (Phoenix) aprende muito mais sobre os fluxos da vida e o olhar das crianças para o trauma e os mecanismos de sua superação com a convivência com seu sobrinho do que em campo com seu microfone. Melhor, a compreensão daquela vivência profissional só passa a ser possível de fato quando ele começa a ter um convívio íntimo com Jesse em dias que acabaram sendo definitivos para ambos. Como Toda Forma de Amor e Mulheres do Século 20, Sempre em Frente é uma pérola que merece ser mais conhecida e ter mais crédito do que de fato tem.

Direção: Mike Mills

Elenco: Joaquin Phoenix, Gaby Hoffmann, Woody Norman, Scoot McNairy, Molly Webster, Jaboukie Young-White, Deborah Strang, Sunni Patterson

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