Na carreira da recém indicada ao Oscar de melhor atriz Lily Gladstone, O Rito da Dança representa aquele pequeno drama indie lançado logo depois da temporada de premiações em um esforço de conseguir aproveitar o momentum na carreira da artista. No entanto, apesar de ser um projeto visivelmente mais modesto do que o drama monumental Assassinos da Lua das Flores, O Rito da Dança é um projeto completamente coerente com a trajetória de Gladstone, tento semelhante força política e dialogando com as raízes da atriz tanto quanto a super-produção dirigida por Martin Scorsese. Não é à toa que Lily Gladstone tentou encontrar um jeito de rodá-lo paralelamente às gravações de Assassinos da Lua das Flores e co-assina a sua produção executiva.
Em O Rito da Dança, Lily Gladstone interpreta Jax, uma jovem à procura da irmã desaparecida e que assume a responsabilidade de cuidar da sobrinha adolescente Roki. Até o momento, Jax vive de algumas contravenções e quando o seu drama familiar se intensifica ela passa a ser o centro de diversas pressões do seu pai distante e da polícia. Em meio a todo esse turbilhão, Roki está fazendo a delicada transição da adolescência para a vida adulta, tentando, junto com a tia, preservar as raízes da sua cultura, o que inclui os preparativos para o powwow, uma manifestação da sua etnia indígena vista com menosprezo por brancos.
O Rito da Dança é um filme que tem muita força política. Toda a trama do longa da diretora Erica Tremblay é dedicada a dimensionar para as plateias os inúmeros obstáculos sofridos por indígenas nos EUA, incluindo aqui uma observação certeira a respeito de uma estrutura institucional e social que marginaliza essas pessoas e tenta apagar os seus traços culturais. Há também uma preocupação do longa em frisar a experiência feminina nesses contextos, abordando a triste falta de perspectiva de ascensão social de muitas mulheres, que muitas vezes não encontram meios de sobrevivência distintos de uma marginalidade do comércio de drogas e do sexo.
É uma pena que o longa de Tremblay se perca no redundante plot da irmã desaparecida da personagem de Lily Gladstone, algo que traz para o filme uma ideia fixa improdutiva. Aqui, o roteiro faz a história do longa perder o fôlego e gera no espectador um gradual desinteresse pelo arco das suas personagens, o que é uma pena pois novamente Lily Gladstone está brilhante em cena. Como exibido em Assassinos da Lua das Flores, mas em uma “chave” de comunicação diferente, já que estamos falando de outro projeto e de outra personagem, a atriz tem uma precisão invejável na maneira como modula os sentimentos intensos de Jax ao longo da história: do seu desespero pela falta de respostas a respeito do desaparecimento da irmã à força com que se impõe diante de uma estrutura machista e racista extremamente opressora.
Em meio ao mistério sobre a personagem desaparecida, até mesmo um dos elementos mais interessantes de O Rito da Dança perde o fôlego. O uso dramático do powwow concomitantemente com a jornada de amadurecimento de jovem Roki e a ideia de ancestralidade representada na relação de sororidade entre tia e sobrinha também não é explorado com muita veemência pelo filme. É um longa que, de maneira geral, deixa boas oportunidades para trás na medida em que insiste naquele que vem a ser o elemento mais banal da sua sinopse: o mistério sobre o sumiço de um personagem.
Direção: Erica Tremblay
Elenco: Lily Gladstone, Isabel Deroy-Olson, Michael Rowe
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