É muito comum vermos filmes que fazem um panorama de eventos históricos carregando bastante interesse do público. Por vezes, são títulos valorizados única e exclusivamente pela revisão ou apresentação dos fatos, mais até do que pela condução da narrativa ficcional que apresentam, como se o “baseado em fatos reais” bastasse para engrandecer a obra e a maneira como ela costura sua trama fosse acessório. Não que Nos Vemos no Paraíso seja marcado pela carência de um desenvolvimento narrativo, o problema aqui é que a trama do filme que inicia com elementos interessantes acaba ficando menor diante do que se apresenta como pano de fundo da sua história. Não que isso seja um empecilho para a apreciação do filme, que tem bons momentos, inclusive, mas é importante frisar que aqui há sim um desnivelamento no tratamento dessas duas frentes que poderiam perfeitamente andar em harmonia.
No longa, um abastado artista convocado para o serviço militar durante a Primeira Guerra Mundial acaba se ferindo gravemente no front, perdendo a mandíbula e sobrevivendo graças à dolorosa alimentação por uma espécie de sonda, sofrimento atenuado pela morfina da qual acaba dependente. Com sintomas severos de depressão, ele pede a um colega de combate que minta para sua família e os comunique da sua morte. Vivendo precariamente com o novo amigo, o rapaz inventa uma forma de sobreviver no pós-guerra, vender memoriais falsos no mercado de preservação da memória que acaba sendo criado na Europa daquela época.
De imediato, Nos Vemos no Paraíso chama a atenção pelo drama familiar envolvendo o jovem artista desfigurado interpretado por Nahuel Pérez Biscayart e o seu pai vivido pelo excepcional Niels Arestrup, ótimo numa cena chave ao final do longa. Acontece que o filme acaba chamando muito mais atenção pelos fatos que apresenta sobre o comércio ilegal e anárquico da venda de monumentos em homenagem aos combatentes da guerra, os imbróglios dos túmulos dos soldados e as relações atravessadas entre a população e o governo francês depois do conflito. Com isso, apesar de ser integrante de todo esse contexto, o drama familiar se dilui e alguns personagens fundamentais parecem vagar pela história sem muita utilidade no final das contas. Muitos desses personagens acabam servindo apenas de ponte para alguns acontecimentos, como é o caso do amigo do personagem de Biscayart vivido pelo também diretor e roteirista do filme Albert Dupontel.
Não que a trama seja marcada por um tratamento descuidado, tudo o que sucede com seus personagens é coerente, sem lacunas e linear, porém levemente superficial quando prometia maior desenvolvimento. Todo o interesse nas figuras que permeia esta história se apaga com o volume de informações históricas presentes na obra. Assim, como panorama histórico dos seus acontecimentos, Nos Vemos no Paraíso tem muitos ganhos, mas como drama familiar poderia ter ido um pouco a fundo nas emoções complexas que sugere em seus personagens.
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