É entre o terror e o drama familiar que Nathaniel Martello-White transita em seu roteiro e direção, em Excluídos, novo filme do catálogo da Netflix. Talvez, estes sejam os gêneros ideias para tratar sobre temáticas que envolvem tensões entre parentes. Todavia, muito além de abordar sobre dinâmicas familiares que, por si só, já são complexas e podem conter diversas problemáticas, o foco de Nathaniel é a questão racial. Para falar sobre passabilidade, racismo e estruturas opressoras dos brancos, o artista também pauta o machismo e as expectativas da sociedade em relação à maternidade.
Todos estes assuntos estão nítidos na narrativa, eles transbordam e não chegam sutis. Mas, tudo aqui parece ser a intensão de Nathaniel, que deixa esta sensação de que ele quer ser o mais direto possível. Para realizar o intento de tratar sobre pautas raciais, em seu primeiro longa-metragem, o realizador convoca traços estilísticos que mesclam contenção e um tanto criatividade na sua direção. Há uma mescla de movimentação de câmera e plano parado, que eleva a potencialidade das angústias da protagonista Neve (Ashley Madekwe).
Além disso, há uma progressão da tensão no roteiro de Excluídos que, juntamente com a decupagem, mostram a tendência para uma explosão dos conflitos. Já o seu desfecho, ele é irônico, porém perfeitamente plausível. Isto porque há um ponto muito importante nesta obra de Martello-White, que é o de não julgar suas personagens ou tentar justificar suas atitudes sob aspectos tão racionais. O que existe aqui é a compressão nítida de que a branquitude oprime e depois cria sistemas para se sentirem superiores e bondosos.
Nesta lógica, a procura pela sobrevivência e a seleção entre quebrar com certos pactos ou utilizar-se deles para garantir privilégios é mostrada através de Neve. No entanto, essa escolha não é posta como algo garantido para todes e isto fica marcado dentro de uma oposição. De um lado há Neve, que tem passabilidade, por apresentar uma pele mais clara. Do outro uma dupla que seria, supostamente, formada por seus antagonistas. Os dois jovens são negros retintos e a obra deixa explícita a distinção das barreiras diferentes que existem dentro destas duas realidades.
É a partir deste caminho, que fica nítido na história que a protagonista foge da sua própria cor, da sua própria identidade e nisso todos os símbolos, diálogos e tensões são postos de maneira efetiva. Transformar em terror o fato da figura central da trama desejar “esconder” que é negra e ter este homem e esta mulher negros se aproximando da sua vida é o maior ganho do filme. No entanto, a partir do momento em que Marvin (Jorden Myrie) e Abigail (Bukky Bakray) são apresentados, de fato, e o espectador vai descobrindo quais são as reais intenções deles com Neve, a qualidade da produção começa a cair.
As personagens em Excluídos começam a se tornar cada vez mais planificadas, a partir de seu segundo ato. Um tom maniqueísta é instalado e o confronto de Neve com sua identidade vai sendo deixado de lado. Ainda que debater sobre masculinidade frágil seja relevante, a pequena suspensão convocada no início da projeção vai se dissolvendo, quando há uma insistência, por exemplo, em trazer cenas de Marvin com o filho de Neve. Há um desvio da premissa, que não fomenta a problemática principal do enredo. Por isso, o equilíbrio rítmico somente retorna nas sequências finais, porque ali há um confronto direto entre todas as figuras centrais do enredo.
Mas, por que “pequena suspensão”? Porque em nenhum momento Nathaniel consegue realmente instalar uma atmosfera de suspense. Este fator ocorre, pois é difícil torcer para Neve quando não existe uma ambientação e uma aproximação com ela no início da exibição. Além disso, o tom do longa já é muito intenso e acelerado em poucos minutos, fazendo com que falte espaço para que seja estabelecida a imersão do público. Desta maneira, algumas tentativas de Martello-White são bem sucedidas, como evocar todas as complexidades da vivência de uma mulher negra que é, ainda por cima, mãe. Nisto ele é brilhante.
Já em termos de direção de Excluídos, algumas sensações são produzidas pelo olhar de Martello-White, que cria imagens com mais sugestões do que cenas com violência gráfica, por exemplo, tornando um pouco mais fluido o roteiro. Mas, é na escrita que o autor se perde porque, neste desejo de dizer tanto, quem assiste fica “apenas” com o discurso, esvaziando as conexões com a história. A atuação de Ashley Madekwe salva um pouco desta proximidade com Neve, porque a intérprete mistura fragilidade, ironia e força em sua composição, deixando com contornos sejam criados, algo que não está presentes nas ações da trama.
Direção: Nathaniel Martello-White
Elenco: Ashley Madekwe, Bukky Bakray, Jorden Myrie
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