Estranho Caminho

Crítica: Estranho Caminho

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A relação entre os homens e seus filhos tem uma tradição complexa na sociedade. Entre práticas pautadas na masculinidade tóxica, abandono parental e tantas outras estruturas advindas do patriarcado – como aquela do pai que foi comprar o cigarro e nunca mais voltou -, Estranho Caminho convida o espectador para olhar o que pode mais lhe doer. Talvez exista uma camada do longa-metragem que apenas aquelas pessoas que possuem conflitos com a figura paterna, tenha passado pela perda de um pai ou ambos, vão alcançar. Ainda assim, a produção é feliz, acima de tudo, na investigação das relações, de tudo aquilo que não é dito.

São nos olhares trocados pelo protagonista, David (Lucas Limeira), com seu pai, Geraldo (Carlos Francisco), que a construção ampla de sentido é estabelecida. Há muito subtexto elaborado pelo não verbbal e completado com algumas frases sutis, que ambientam o público sobre o passado e o presente daquelas personagens. O fato da trama se passar no período do início da pandemia da Covid-19, convoca este entre encontro entre David e Geraldo e também amplia a clausura e as chances de embate.

O roteiro de Guto Parente (Inferninho) – que também é diretor do longa – não tem pressa em explorar cada peripécia vivida por David, revelando as camadas do que está, de fato, ocorrendo na trama com paciência. Este é um filme que olha, sobretudo, para os relacionamentos, em tudo que eles podem trazer de perdas, ganhos, distâncias e aproximações e a calma para explorar mais este fator do que qualquer outro aumenta a intensidade da verdade que está por trás do aparente plot principal.

Estranho Caminho

Um outro elemento que chama a atenção em Estranho Caminho é  iminência da morte, que ronda toda a história, imprime um tom suave de suspense. Além disso, esta característica põe as personagens acuadas, fazendo com que elas precisem encarar a realidade, principalmente David. A potência do que é construído se fortalece no trabalho da arte, principalmente ao que referem aos objetos de cena e à cenografia no geral. Os lugares são apertados e cheios de elementos espalhados pelos espaços. O mesmo pode ser dito da direção, que tenta convocar quadros mais fechados, criando a impressão de sufocamento até mesmo em locais abertos.

A dinâmica da contracena entre Lucas e Carlos completam este cenário. Ainda que o primeiro seja mais verde que o segundo e peque em algumas intenções, o jogo cênico da dupla é essencial para a história. Os atores criam as conexões e os constragimentos entre os dois, através das respirações e pausas. Estes são diálogos do silêncio, que impactam quem assiste mais ainda à medida em que a projeção vai se aproximando do seu desfecho. Por este motivo, de uma maneira geral, Estranho Caminho possui um bom resultado. Ainda assim, a fotografia e a direlçao poderiam ter realizado uma concepção mais coesa.

Algumas sequências são mal iluminadas e decupadas em Estranho Caminho, fazendo com que a plateia perca as emoções das personagens. Apesar disso, por contar com um roteiro inteligente, que flerta com o absurdo e convoca o realismo fantástico, pelo talento e carisma do elenco e por inserir pautas sociais atravé de discussões sentimentais, o longa de Guto Parente é bem sucedido!

Direção: Guto Parente

Elenco: Lucas Limeira, Carlos Francisco, Rita Cabaço

Assista ao trailer!

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