Crítica: Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)

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Birdman é uma das apostas mais fortes do Oscar deste ano, concorrendo a nada menos que 9 estatuetas em categorias principais como Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original. O longa, no entanto, ganhou pouco espaço nas salas de cinema brasileiras, já que tivemos uma avalanche de estreias nas últimas semanas. Uma pena é verdade, já que existe uma grande chance de que ele seja colocado de lado por muitos espectadores mais desavisados.

O filme narra a história de Riggan Thomson, um ator que fez muito sucesso no passado ao atuar em um filme de super-herói, como o personagem Birdman. Desde então, ele não consegue se desvencilhar do ícone e resolve recusar participação no quarto longa da série. A partir daí, sua carreira começa a cair, fazendo com que Riggan retorne para os palcos da Broadway, se esforçando como diretor, ator e produtor para fazer sucesso com uma peça.

O estilo de gravação escolhido pelo diretor Alejandro González Iñárritu é um dos primeiros pontos que chama a atenção do espectador. Com aproximações de câmera, closes nas reações dos personagens e a utilização da ferramenta como olhar do protagonista, a técnica faz com que o espectador se sinta muito mais inserido na narrativa e perceba de perto o sentimento dos atores. Além disso, o plano sequência, onde o cineasta opta por poucos cortes durante as cenas, traz mais veracidade à composição. Aliás, Iñárritu mostra toda sua capacidade profissional neste filme, quando sai de dramas como Babel e Biutiful, para fazer uma comédia dramática no melhor estilo, trazendo pontos importantes de discussão, como a fama e o declínio dela.

Bom, esse é o lado irônico e sarcástico do diretor. Ele mostra um ator que teve fama e sucesso, mas que ficou estigmatizado por um personagem de quadrinhos e agora tem dificuldade de desvincular a imagem e fazer outros papéis de relevância. O fato é extremamente comum na indústria cinematográfica americana, o que serve de alfinetada para ela e para os próprios críticos que rotulam um ator por conta de papéis específicos que ele realiza, às vezes em momentos iniciais de sua carreira. A escolha do ator principal foi propositalmente pensada (ou não). Mas o fato é de Michael Keaton foi (e ainda é) por muito tempo lembrado por seu papel em Batman, perdendo algumas oportunidades e deixando de ser escalado em tantos outros papéis relevantes.

Michael-Keaton-and-Edward-Norton-in-Birdman

Outro aspecto que merece muito destaque é a trilha sonora do filme. Todas as cenas são acompanhadas de batidas fortes e contundentes, como uma representação da angústia e ansiedade dos personagens. Além disso, em muitos momentos bandas são inseridas nas cenas, como plano de fundo para a narrativa, destacando ainda mais o detalhamento da trilha sonora. Não é à toa que o filme foi indicado em duas categorias por conta disso (Melhor Edição de Som e Melhor Mixagem de Som).

No entanto, embora tecnicamente o filme seja muito bom, as atuações é que são as cerejas do bolo. A começar por Emma Stone. Ela interpreta a filha do protagonista que acabou de sair de uma clínica de reabilitação por conta do abuso de bebidas alcóolicas e drogas. Ainda revoltada com tudo que aconteceu e distante do pai pelas ausências dele na infância, ela é a personificação da garota problemática. Assim como a maioria dos personagens principais, Emma tem um solo de interpretação fantástico, onde mostra toda sua revolta contra o pai. Simplesmente excelente, o que vale sua indicação como Melhor Atriz Coadjuvante ao Oscar.

Os atores que mais contracenam são Michael Keaton e Edward Norton. Devo dizer, inclusive, que quando estão juntos, o espectador tem dificuldade em dissociar quem é o principal e quem é o coadjuvante. Como protagonista, Keaton consegue levar o espectador do amor ao ódio em poucos minutos na busca incessante de Riggan pela fama perdida, em uma mistura constante de ilusão e realidade. Um aspecto que compõe o background do personagem é o fato dele ter “poderes mágicos”. Uma relação precisa e acertada com o fato dele tentar superar um super-herói, mas ao mesmo tempo aproveitando de sua principal característica. Já Norton atrai a atenção de qualquer pessoa com uma interpretação impecável. Seguindo um padrão desnorteado, de um cara que é excelente profissional e péssimo como pessoa, ele varia o humor conforme toca a música (referência não por acaso à trilha sonora). Quando a dupla se une, o resultado é apenas espetacular.

Com um trabalho meticuloso e detalhista, onde cada peça se encaixa com perfeição e a construção de cenas e personagens vai muito além do que seu resultado, o diretor Iñárritu nos oferece um filme repleto de aspectos detalhados, com um elenco integrado e equilibrado, e discussões importantes sobre a relação da sociedade com as questões emocionais de analogia com a fama, a percepção do seu redor e a tomada de decisões. Com um ritmo frenético e envolvente, Birdman se apresenta como uma excelente opção e forte concorrente ao Oscar, mostrando que a comédia também é capaz de sair do comum e trazer excelência digna de indicação pela Academia.