Crítica: Acima das Nuvens

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Retiro: Atriz interpretada por Juliette Binoche isola-se com sua assistente, vivida por Kristen Stewart, antes de encarnar a sua nova personagem.

 

Acima das Nuvens, novo filme de Olivier Assayas, é um longa que possui no seu elenco Juliette Binoche, atriz francesa que circula pelas cinematografias de diversos países, alternando entre o drama autoral de um diretor iraniano (Cópia Fiel) ao romance épico vencedor do Oscar de melhor filme (O Paciente Inglês), e Kristen Stewart, jovem estrela de Hollywood que alcançou o ponto mais alto da sua carreira na saga Crepúsculo, mas que também viveu o ônus dessa confusão que comumente é feita entre o mundo das artes e da espetacularização da vida alheia ao ter sua vida devassada pelos tablóides. De uma certa, a trajetória das protagonistas fora das telas dialoga com a de suas personagens no filme de Assayas, que, por sua vez, possuem conexões com as personagens que eventualmente interpretam na peça fictícia “Maloja Snake”. Dessa forma, Acima das Nuvens parece aquelas matrioshkas (bonecas russas que quando abertas escondem réplicas ainda menores de si mesmas), revelando ao espectador o intercâmbio de papeis que se instaura sempre que diferentes gerações se relacionam.

No filme, Juliette Binoche vive Maria Enders, uma atriz francesa prestigiada internacionalmente  surpreendida com a morte do escritor responsável pelo seu grande sucesso no teatro e, posteriormente, no cinema, o texto “Maloja Snake”, um drama sobre a conturbada relação entre uma atriz de meia idade e sua jovem e bela assistente. Ainda abalada com a notícia, Enders aceita protagonizar uma nova montagem teatral do texto, só que dessa vez interpretando Helena, a atriz veterana. Durante a preparação para a peça, Maria isola-se com sua assistente Valentine, personagem de Kristen Stewart, na casa do escritor de “Maloja Snake” e, entre um ensaio e outro, a atriz começa a refletir sobre a passagem do tempo.

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A passagem do tempo: Longa trata da maneira como vemos as mesmas coisas em diferentes momentos das nossas vidas.

 

Em linhas gerais, Acima das Nuvens trata do fascínio e da repulsa que temos a tudo o que é novo ou a tudo o que é velho e como podemos assumir diferentes perspectivas sobre um mesmo assunto quando estamos na maturidade. Dividindo a história em três atos, Assayas dirige de maneira elegante o seu filme e consegue lidar com as múltiplas camadas e interconexões que ele inevitavelmente acaba proporcionando, afinal, além da relação com a própria trajetória das atrizes em questão fora das telas, as personagens de Binoche e Stewart representam na ficção as mesmas funções de Helena e Sigrid, protagonistas da peça em questão. Há quedas de ritmo consideráveis na transição do segundo para o terceiro ato, contudo, o diretor consegue manter sua narrativa desafiadora aos olhos e mentes do espectador, o que é sempre um ponto positivo.

Juliette Binoche e Kristen Stewart se complementam em cena, ponto fundamental para a execução acertada das intenções do roteiro. Binoche consegue construir, como de praxe, todos os conflitos da sua personagem, tudo muito delicado e sem as habituais afetações hollywoodianas que algumas atrizes de sua geração (e mais novas) costumam cair. Já Kristen Stewart surpreende os mais céticos ao rivalizar sem maiores problemas e impor o seu ritmo e as argumentações da sua personagem a uma atriz do porte de Binoche. Também participa do filme Chloe Grace Moretz, que interpreta a jovem atriz contratada para viver Sigrid na nova montagem. Moretz também tem seus momentos na pele da típica jovem estrela de cinema “subversiva”, algumas cenas bem divertidas, por sinal.

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Garota-problema: Chloe Grace Moretz vive conturbada estrela teen às voltas com o lado ruim da fama.

 

Lidando sem cortes muito abruptos com esse diálogo entre o que é da própria trama e o que é externo a ela, Olivier Assayas consegue fazer de Acima das Nuvens um filme que, se não é o mais memorável da sua carreira, ao menos mantém o padrão das suas melhores produções. Contudo, é inegável que o filme é um curioso canal para uma parceria improvável e muito bem sucedida, a de Juliette Binoche e Kristen Stewart.