Concierto para Otras Manos

39º Festival Internacional de Cinema Guadalajara: Concierto para Otras Manos

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Visual e discursivamente, o público vai se adentrando no enredo de Concierto para Otras Manos gradativamente. Contando a vida de David González, filho do célebre pianista mexicano, José Luís González, o documentário joga com o estado de crença do espectador, podendo criar sentidos múltiplos narrativos, a partir da concepção de mundo de cada pessoa da plateia.

Assim, o que é escutado nos primeiros minutos de projeção é que David é um rapaz jovem, que gosta de comer besteiras e é um tanto nerd para a cultura pop. Imageticamente, é possível ver que ele também é uma pessoa com deficiência.

Isto porque a câmera acompanha o seu corpo, com planos que vão do detalhe ao geral, como se o diretor quisesse mostrar David em sua totalidade física. Estratégia entrega a interpretação para que assiste, deixando a construção de imaginário sobre a deficiência de David para a visão de mundo do público. Pelo menos, inicialmente.

Progressivamente, é revelado que os sonhos de David não foram impedidos por sua condição física. Ele seguiu a profissão que desejava. Ainda assim, não há uma romantização sobre a jornada de uma PCD. Pelo contrário, primeiramente, é salientado que a sua família duvidou, diversas vezes, que o menino iria ter uma vida leve e prazerosa.

Os seus parentes não tinham certeza nem ao menos que ele sobreviveria. Todavia, eles fugiram do padrão e arriscaram inserir David no mundo da música, procurando encontrar a forma dele tocar, a maneira dele e não a normativa. Por fim, o discurso de Concierto para Otras Manos não foge da responsabilidade de apontar privilégios.

O pai do protagonista é famoso no mundo musical, muitos dos parentes dele trabalham na área e ele possui recursos financeiros para tratamentos, viagens e recursos que lhe entregam todos os suportes possíveis para que ele se integre ao mundo — sem negar quem é ou criar uma ideia errônea do que é “normal”.

Com esta lógica de imersão, a trama avança e passa a analisar também a relação de David, José e o piano. Então, os enquadramentos são mais abertos, a diegese ganha cada vez mais sonoridades melódicas tocadas por eles (juntos ou separados) e as reflexões sobre a dinâmica da dupla é colocada em foco.

Contudo, essa mudança de rumo ocorre sem esquecer na decupagem e na luz a proposta inicial: David é o centro de tudo. David e de as suas mãos. Mãos “mágicas”, que encontraram uma maneira distinta de tocar o instrumento tão amado por ele.

Assim, tanto de observação individual de David, do relacionamento dele com o pai, com a família e com a música, quanto nas seleções de quadros e iluminação, Concierto para Otras Manos é bem sucedido. Um exemplo de luz é usar mais sombras nos instantes de intimidade e vice-versa.

Essas escolhas são bem sutis, o que deixa a impressão de que a equipe queria mesmo era dar destaque as suas personagens, porém com consciência. Afinal, a produção é um produto audiovisual. Neste sentido, as sequências finais da orquestra são cansativas e reduzem um tanto a qualidade geral da obra.

Faltou amarrar a jornada de David. Ainda que seja emocionante ver ele tocando ao lado de José, a sequência se prolonga demais e quem assiste não tem retorno sobre as últimas afirmações das personagens.

Direção: Ernesto González Díaz

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