O Mauritano

Festival do Rio no Telecine: O Mauritano

3.5

Baseado na trajetória de Mohamedou Ould Slahi (Tahar Rahim, Maria Madalena), O Mauritano contém um ganho bastante importante quando se pensa na história do cinema mundial. Além de servir com uma recordação eterna dos erros cometidos pelos estadunidenses, ao lidar com os muçulmanos, principalmente depois do 11 de setembro, o filme chega como uma inversão da costumeira lógica de que são os Estados Unidos que irão salvar o dia. Aqui, eles são os vilões. Não à toa, este é um enredo que se pauta na realidade.

Através da decupagem, é possível enxergar o olhar do protagonista para os seus algozes. Ainda que ele não esteja em cena, por meio de planos detalhes e movimentações de câmera – como o travelling in, que passa da fresta da grade até o mar ou na cena do restaurante, com o quadro fechado nos pratos –, os militares e os políticos dos EUA conferem perigo e são demonstrados em toda sua sordidez. De um lado, se vê a pequenez, a insegurança e o abuso do poder de uma nação que se enxerga como dona do mundo, do outro, um cidadão que não pôde, por muito tempo, contar com um julgamento, que sofreu tortura e passou quatorze anos preso.

Entre idas e vindas do sofrimento de Mohamedou, as tentativas das advogadas humanistas Nancy Hollander (Jodie Foster, Hotel Artemis) e sua parceira de trabalho Teri Duncan (Shailene Woodley, A Última Carta de Amor), que desejam comprovar a ausência de seu envolvimento na queda das Torres Gêmeas, o roteiro, ainda que traga consigo informações relevantes, falha ao não trazer uma narrativa fluída e de ritmo contínuo. A força da trama está majoritariamente em seu início. Ao chegar à sua metade, O Mauritano passa a se tornar repetitivo, com situações semelhantes. Após o estabelecimento da atmosfera e a compreensão dos fatos, talvez o ideal fosse avançar, progressivamente, nos acontecimentos mostrados.

O Mauritano

No entanto, o que ocorre é o oposto. Dando voltas para chegar ao ponto central, o julgamento de Mohamedou, no momento no qual o público se depara com o tão esperado momento, tudo precisa ser corrido para que o desfecho chegue. É por esta razão que alguns detalhes necessitam ser amarrados em uma cartela em seu encerramento. Esta é uma solução comum no cinema, porém, ainda que restassem detalhes futuros para complementar o enredo, o esgarçamento temporal anterior, juntamente com a corrida para alcançar sua conclusão, dão uma ideia de que falta uma mão mais certeira para uma seleção mais apropriada do que foi colocado na tela.

Ainda assim, é notável o desempenho da direção, que mescla sequências mais simples, com closes e plano e contraplano, e cenas com mais deslocamentos e inventividade. Além disso, Foster e Woodley apresentam construções contidas, mas efetivas. Seja em seus gestos ou olhares, há precisão e tônus em seus corpos. Ambas parecem ter feito uma pesquisa sobre Hollander e Duncan, respectivamente, porém não convocam uma representação delas, mas a própria interpretação de cada uma das duas figuras. Desta maneira, no geral, O Mauritano é um importante relato sobre os absurdos de um governo sem limites e apresenta qualidades técnicas e de discurso. Mas, ele carrega consigo algumas irregularidades, que enfraquecem um pouco de seu resultado.

Direção: Kevin Macdonald

Elenco: Tahar Rahim, Jodie Foster, Shailene Woodley, Benedict Cumberbatch

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