Imagine uma mistura entre Nasce Uma Estrela, Projeto Flórida e Brooklin. Aí está As Loucuras de Rose (Wild Rose, no original). Na narrativa, uma jovem mãe solteira, Rose (a talentosa Jessie Buckley, Chernobyl), acaba de sair da cadeia e precisa conciliar o sonho de ser uma cantora de música country juntamente com as responsabilidades maternas. Além disso, outros obstáculos que deve enfrentar são a desaprovação de sua mãe, Marion (a marcante Julie Walters, O Retorno de Marry Poppins), e o fato de viver na cinzenta Glasgow, na Escócia, já que a terra fértil do gênero musical é do outro lado do oceano, em Nashville, nos Estados Unidos.
Logo de início, a personalidade de Rose rapidamente se estabelece. Um mapa de Nashville, uma blusa vermelha vibrante destoando da prisão branca e muitos risos. Posteriormente, veste bota e jaqueta de caubói, senta na janela do ônibus com seus olhos de sonhadora perdidos nos sonhos e uma trilha sonora que diz: “garota do campo, tem que continuar seguindo em frente”.
Tudo isso se dá graças ao diretor Tom Harper (Peaky Blinders) e um inteligente uso dos elementos da mise-en-scène, fugindo da exposição verborrágica. Em seu primeiro ato fora da prisão, a protagonista visita um antigo namorado para ter relações sexuais e Harper, brilhantemente, começa a cena com um plano geral da cidade nublada, até que uma panorâmica move a câmera para um plano aéreo de Rose fazendo sexo no campo verde. Assim, em três minutos de filme, já sabemos tudo sobre a personagem, de natureza selvagem e, principalmente, alguém que nasceu para ser livre.
Neste sentido, o tom vermelho está presente por todo As Loucuras de Rose, seja em suas bandanas e camisas quadriculadas, ou na iluminação de suas apresentações. É a cor da vibração, da paixão, da intensidade, da revolução, fazendo um interessante contraste com o cenário em tons mais neutros a sua volta. Ainda sobre iluminação e mise-en-scène, Harper traz sensibilidade e uma áurea angelical na primeira vez Rose canta, com uma luz dourada vindo da janela e atingindo-lhe por trás em close-up.
Aliás, todas as sequências musicais possuem esse caráter mais escapista, com planos fechados em Buckley, permitindo que ela não só cante, como também liberte sua voz para o mundo. Já a trilha sonora — também cantada por ela — é um dos pontos mais fortes do filme e as letras vão sempre de encontro aos sentimentos da protagonista.
Além de sua poderosa voz, Jessie Buckley também atinge um enorme melancolia que o roteiro pede a sua personagem. Afinal, sua trajetória é de muito sofrimento e sacrifícios, precisando deixar os filhos de lado várias vezes em detrimento à oportunidades que surgem. Assim, ela traz uma brilhante atuação que se mistura entre sorrisos nos momentos pequenos, olhos lacrimejantes e muitos planos para o futuro.
Outro grande acerto de As Loucuras de Rose reside no roteiro, da estreante Nicole Taylor, que não aponta dedos para sua protagonista falha e humana. Mais do que isso, ele entende todas as dificuldades que ela passou ao longo da vida, sendo uma mãe solteira que cometeu escolhas erradas, além da falta do pai dos filhos para auxiliá-la.
É claro que o espectador pode julgá-la por deixar as crianças com vizinhos para fazer apresentações, mas o filme a vê como uma vítima e sofre junto com ela. Apesar de clichê, o final da narrativa é muito bem executado por conta de seu forte impacto emocional. As Loucuras de Rose é um filme sobre liberdade e amadurecimento, usando como pano de fundo a leveza da música country para falar sobre o difícil tema da maternidade.
Direção: Tom Harper
Elenco: Jessie Buckley, Julie Walters, Sophie Okonedo
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