O Processo – Praga 1952

Festival É Tudo Verdade: O Processo – Praga 1952

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Após a Segunda Guerra Mundial, um outro momento de tensão e medo marcou a antiga Checoslováquia. No auge do período stalinista e do país sob um regime comunista, aconteceu um julgamento, no ano de 1952. Com 14 homens indiciados injustamente e torturados para que confessassem que eram contra o governo, uma espécie de circo foi criado.

Nele, Rudolf Slansky e mais 13 companheiros de crime forjado foram treinados para mentir, por conta ameaças, obviamente. Este é o foco de O Processo – Praga 1952, que reconstitui todo este ocorrido através de imagens encontradas em 2018, por operários. Juntamente com este material, há também relatos dos filhos e netos de Artur London, Slansky e Rudolf Margolius. Os três fazem parte da lista dos 14 comunistas injustiçados em Praga.

Assim, é formado o horizonte e o enfoque do documentário que, em seu clima, carrega uma atmosfera de tensão, angústia e pavor que rondava a região naquele período. O motivo principal para que seja instalada esta ambientação sufocante e de suspensão são estas filmagens feitas na época do julgamento, como um tipo de material de propaganda para Stálin. O ganho da equipe é saber utilizar estas sequências.

A seleção de qual trecho será exibido e em que duração ele será colocado é uma das maiores estratégias para transmitir progressão e as possíveis emoções das personagens centrais. O tempo de tela garante que o público enxergue as emoções dos acusados e possa ver e sentir no tom de suas falas toda aflição que passavam. É bem nítido, aos olhos de espectadores distanciados, que aquela ação ali registrada é encenada.

O Processo – Praga 1952

Em um dado momento, esta obviedade é questionada pelos filhos e netos de London, Slansky, Margolius. No entanto, o doc traz uma reflexão relevante para contemporaneidade coberta pelo mundo das notícias falsas e/ou manipuladas. Em cada década ou século as mentiras e/ou encaminhamentos políticos são engendrados para que certa parte da população tenda a se enveredar para crer em inverdades – como em um Brasil, de 2018, no qual “mamadeiras de piroca” são postas como reais.

Bom, mas, regressando para a Praga de 1952, o que é mais impressionante neste projeto são os lugares de reflexão e tensão que ele consegue levar, através de sua técnica e construção de discurso. Os relatos dos familiares das vítimas são fortes, bem como os trechos de cartas deles ou das gravações encontradas do julgamento fomentam a argumentação deste crime disfarçado de ato em favor da pátria. Todavia, o tom do média não sobe ou se desequilibra.

Há uma sobriedade em revelar o passado aqui, o que abre espaço para que a intensidade dos próprios fatos ganhem força durante a projeção. Seja nas inserções sonoras, na montagem ou direção, os recursos técnicos são usados de maneira pontual. Assim, quando a cena de um presidiário falando demora mais ou quando há o sob som em alguma sequência, o impacto é maior.

Desta maneira, com esta consciência do equilíbrio na ambientação e da mescla da seleção da entrada e saída de imagens e entrevistas, O Processo – Praga 1952 consegue deixar sua marca em quem o assiste. Ele é o retrato de um momento histórico, mas também um possível espelho para o presente, não apenas no que se refere à discussão do que é crível ou não e daquilo que é apresentado para a sociedade, porém também no que tange a mais a nova guerra em terras europeias.

Direção: Ruth Zylberman

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