Lee

Crítica: Lee

2.5

Escolher o enquadramento de um filme pode ser complicado. Em uma vida tão plural e diversa como a de Lee Miller (Kate Winslet) esse desafio cresce e o resultado é Lee, novo longa-metragem de Ellen Kuras (The Betrayal – Nerakhoon). A produção tem um rico material em mãos: a vida de Miller, uma fotógrafa de guerra, célebre por tirar escondido um retrato na banheira de Hitler. Todavia, ela foi mais do que isso. Foi modelo, foi uma mulher livre, depois, foi mãe.

Como resumi-la? A tormenta se alastra na tela e o espectador recebe uma obra confusa. É difícil se aproximar da personagem e das suas vivências, porque as situações que convocadas não são exatamente exploradas. O público tem contato com um breve panorama de cada sensação e experiência de Miller. Ao mesmo tempo, há uma aparente vontade em emocionar e centralizar Winslet o tempo inteiro, mais como uma criação de efeito do que uma investigação concreta da personalidade, do caráter e das experiências intensas de Lee Miller.

Essa reiteração de um sobressalto, causado pela guerra, não atinge quem acompanha a jornada de Miller rumo à cobertura da Segunda Guerra Mundial, sendo uma mulher, que precisou combater também a misoginia e as limitações impostas por preconceitos de gênero. Não há espaço de conexão situacional. O que se estabelece é uma ligeira empatia pelo grupo alegre de amigos de Lee que, obviamente, são afetados pela destruição causada pelo nazismo.

Contudo, nem mesmo a afeição aos companheiros de Lee Miller é trabalhada na narrativa. O longa conta com coadjuvantes como Andrea Riseboroug, Alexander Skarsgård, Noémie Merlant, Marion Cotillard e Josh O’Connor, todos subaproveitados e planificados em suas construções. Sendo que o último retrata o filho de Lee, porém o intérprete é posto em uma conjectura terrível, como um mero repetidor das imagens que imprimem o passado de Miller. Connor e as suas passagens são aquelas detentoras do bastão do texto expositivo durante a projeção.

Então, eis que, ao tocar no nome de Connor, trazemos, além de tudo já abordado, a maior fragilidade do filme em voga: a montagem! Lee precisaria voltar para a sala de edição e ser reconfigurado! A interação entre Winslet e Connor não fomenta nada sobre a vida de Miller depois da guerra. Mais ainda, a narração de Kate Winslet quebra o ritmo da trama, retirando o envolvimento com as tensões do passado da protagonista.

Assim, apesar de Josh e Kate convocarem uma excelente contracena – mérito do talento de ambos –, o diálogo entre eles é descabido para o que soa como foco do enredo. Como melhorar este cenário então? Talvez assim: esta conversa imaginária entre mãe e filho é removida, todo o início da produção viria como flashback ou, ao menos, seria mais enxuto. Porque, na verdade, o que mais interessa e eleva a potencialidade da obra é acompanhar como uma mulher registrou, nos anos 1940, em plena guerra, tantas imagens impactantes.

Também seria apropriado mostrar as suas complexidades psíquicas e ter um tempo de tela maior para revelar mais seus processos criativos. Os seus relacionamentos interpessoais, principalmente com Roland Penrose (Alexander), não são postos de maneira orgânica e ficam soltos. Ainda assim, Winslet e Kuras engancham a atenção de quem assiste, justamente ao explorar os closes que marcam as expressões faciais de Kate no ecrã. É apelativo?

Sim, mas, ao mesmo tempo, observar o rosto de Lee, em um plano bastante fechado, como em uma investigação cuidadosa, faz a sessão valer a pena. Winslet é a rainha dos micromovimentos e ela emprega esta característica da sua composição de Lee toda em seu rosto. Pequenos gestos faciais indicam as mudanças de instalação de emoção da protagonista. Cada virada de chave pode ser vista no ressoar de um movimento, que transborda para a face de Kate. Ao mesmo tempo, tem-se a figura de Lee, que é demonstrada como cativante.

Essa construção vem tanto do roteiro quanto da encenação. Ela é colocada como agente demolidora do status quo, como uma mulher quase independente, à frente de seu tempo e de muitas barreiras impostas pela sociedade. Mas, não todas. As suas fragilidades diante da opressão da guerra e do machismo a aproxima do receptor do longa. É por esta razão que Lee é uma produção fraca em sua totalidade, por não saber organizar os fatos com fluidez e organicidade, nem aproveitar devidamente a potência que foi a personagem central da história.

Mesmo assim, a presença de Winslet e a escolha de enquadramentos, deixam a exibição fruível e um tanto agradável. 

Direção: Ellen Kuras

Elenco: Kate Winslet, Alexander Skarsgård, Marion Cotillard, Andy Samberg

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